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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

30.05.21

Vacinas e militares

(Ou uma pequena explicação da Ética Castrense)


Luís Alves de Fraga

 

Tem causado excelente impressão na opinião pública e publicada a forma como o almirante Gouveia e Melo conduz o processo de vacinação de toda a população, sem sobressaltos, mas com objectivos que, em cada dia, se vão cumprindo.

Vê-se e ouve-se que a mão militar soube colocar ordem onde começava a impor-se a desordem, os favoritismos, as influências e as “cunhas” usuais na nossa cultura cívica.

 

Para mim, que desde os treze anos de idade, fiquei sujeito ‒ porque fui voluntário ‒ às regras da disciplina castrense e toda a cultura militar se me foi entranhando por baixo da pele, estranho seria que um graduado das Forças Armadas empossado num cargo dirigente falhasse logo aos primeiros passos. Mas não o culparia de imediato. Iria procurar as envolventes que o levaram a falhar, as armadilhas que lhe colocaram no caminho, os vespeiros de interesses sórdidos onde ele teria posto a mão. Era essa a minha atitude e, se não encontrasse nada do que descrevi, então, iria tentar perceber se o militar tinha, realmente, perfil de líder e se era, na verdade, um “militar a sério”… É que na instituição castrense também há nódoas!

 

Mas há que perceber a razão para os êxitos das lideranças marciais.

Antes de tudo o mais, são raríssimos os militares que têm uma “agenda pessoal” ou seja, um objectivo individual a realizar para conseguir alcançar prémios e regalias por vias ínvias. Ao graduado militar é incutida a ideia de serviço comunitário nacional sem esperança em grandes agradecimentos, sem grandes louvores ou notória visibilidade pública; quem lhe pode reconhecer feitos é a estrutura hierárquica, que o valoriza, por regra, empurrando-o para um cargo de maior responsabilidade e mais exigente (o velho provérbio castrense faz todo o sentido: “Na tropa, nem bom cavalo nem bom cavaleiro”!).

‒ E o graduado militar é assim, em consequência de quê?

Muito simples. É assim, porque, desde o primeiro momento, em todas as circunstâncias, os meios de que dispõe para o cumprimento da missão ‒ seja ela qual for ‒ são sempre escassos, pois o nível de perfeccionismo exigido é sempre superior ao espectável. Nunca nada está bem, se puder estar melhor! Então, tem de se avançar rumo à optimização. Então, só construindo uma excelente organização e gestão de meios se pode estar apto a tentar alcançar o óptimo, que estará sempre longe de ser alcançado.

‒ E qual a razão desta necessidade de óptimo?

Simples! Às Forças Armadas é dada a missão mais difícil de todas: a defesa da Nação a todo o custo, mesmo a custo da própria vida! Mas, de preferência, a defesa da Nação à custa da vida de quem a ataca. Heróis mortos não valem nada para nós… Têm valor para o inimigo, porque os matámos pela defesa da nossa boa causa. Então, a nossa excelente optimização leva-nos a preservar meios, rentabilizando-os ‒ e um soldado é, no campo de batalha, um “meio” de imenso valor ‒ desde os homens, às munições, às rações alimentares, passando pela água, pelo armamento, pelo combustível, por tudo o que pode fazer muita falta no momento seguinte.

 

Só percebendo esta “mecânica” é que se consegue perceber que as Forças Armadas sejam, em cada dia que passa, sujeitas a reduções drásticas em meios humanos, materiais e apoios, e aceitem tudo isto, quase pacificamente, sempre dispostas a dar o seu melhor, mesmo quando já nada tiverem para dar além do corpo e da vida.

Esta é a Deontologia Militar, é a Ética de quem nasce para liderar e gerir a máxima capacidade de violência legal dentro de um Estado, seja ele qual for e abrace a ideologia política que abraçar.

É por isso que todos os militares profissionais, de todos os Estados, são “irmãos”! São-no, porque os princípios comportamentais e morais têm de ser os mesmos para alcançar a vitória. Os militares não gostam da guerra, porque nela têm de esquecer família, bens materiais, comodidades, saúde e vida, para se confrontarem com um inimigo que pensa e age exactamente da mesma maneira e está disposto a atingir os mesmos limites, paradoxalmente, ilimitados.

 

Percebe-se agora, a razão de a vacinação estar a correr tão bem em Portugal?

Mas, senhor almirante Gouveia e Melo, cuidado, pois mesmo anunciando que vai ser o último cidadão a ser vacinado ‒ o que, para um civil, pode parecer uma idiotice, mas para nós, militares, faz todo o sentido ‒ podem, antes disso, colocar-lhe a armadilha no caminho só para não usufruir do prestígio que já ganhou junto de todos nós.

Cuidado!

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