Salazar e os "outros tempos"
Por vezes oiço gente nova – mulheres ou homens que mal haviam nascido por altura do 25 de Abril de 1974 ou nem sequer eram nascidos – afirmar que está fazendo falta um “outro” Salazar cá no “burgo”! Os meus Amigos, por certo, também já ouviram isso ou coisas parecidas, que vêm a dar no mesmo.
O que esta gente não sabe é a verdade sobre o que foi a ditadura. Aquela verdade “pequenina” que afectava todos durante todos os dias. Não me refiro à polícia política, nem aos “crimes” políticos! Refiro-me ao dia-a-dia, que vou tentar mencionar na sua crueza mediana.
Olhem, meus Caros, essa coisa de um casalinho de “pombinhos” andar na rua todo enlaçado e aos beijinhos, era proibida! Beijinhos “cinéfilos” só em casa ou no vão da escada, quando se levava a “miúda” até à porta de casa dos pais.
Os homossexuais eram reprimidos, porque “doentes”! Então, em relação aos gays era socialmente aceitável que fossem sovados ou espancados em público, quando arriscavam “um avanço” com o tipo “errado”… Que não se fossem queixar à polícia, porque aí a surra era maior!
Bebedeiras de estudantes em colectivo era coisa que não existia! Até porque não podia haver “colectivos” nas ruas, pois três indivíduos – notem bem, três – em conversa na via pública já era motivo para os cívicos mandarem “circular”.
Cenas cinematográficas com nus masculinos ou femininos não se viam em cinemas! A censura tinha ordens expressas para cortar esses bocados de “fita pecaminosa”.
Filmes ou revistas com cenas de sexo explicito ou tendencialmente explícito eram considerados “materiais pornográficos”, dando direito a prisão por parte da polícia política e julgamento no mesmo tribunal onde eram sentenciados os “comunistas e outros reviralhistas”.
Fatos de banho femininos mais ousados – entenda-se por ousado permitir um vislumbre dos seios ou deixar à mostra um pouco mais das nádegas – eram proibidos e multadas aquelas que os exibissem!
As crianças não podiam pisar a relva nos jardins públicos! Os cães e gatos abandonados eram “caçados” pela chamada “carroça dos cães” e levados para locais onde os abatiam – impressionava como os cães conheciam os seus “caçadores!
Não vou aumentar aqui o role de proibições menores, que Salazar consentia e incentivava.
Estou a prever a reacção de alguns meus leitores, que admitem, em tese, uma solução ditatorial:
- Olhe lá, isso foi no passado. Agora não seria assim, pois os tempos evoluíram!
Que engano, meus Caros Amigos! Quem quiser apanhar com uma ditadura, tem de “ficar com todo o pacote”, visto que estas proibições são aquelas que “domesticam” as massas populares, permitindo outras mais pesadas e gravosas! A “domesticação” tem de começar por coisas simples, pois é a abdicação perante as “insignificâncias” que permite levar à “aceitação” das grandes proibições.
Cuidado com o que desejam! Cudado com as abstenções cívicas, nomeadamente nas eleições! É por essas “brechas” que penetra o “bichinho” ditatorial.