“Roupa velha” ou pormenores que se não sabem
Ontem deixei em comentários à minha exposição alguma informação que, julgo, merece aparecer mais destacada e mais legível por quem esteja interessado em perceber pormenores que fazem toda a diferença num tempo de eleições.
Aqui ficam esses retalhos com alguns acrescentos para lhes dar maior possibilidade de compreensão.
(NOTA: Este texto foi inicialmente escrito para o meu mural no Facebook. Assim se justifica esta introdução).
A Caixa Geral de Aposentações (CGA) nada tem a ver com a Segurança Social, porque esta se destina a prover pagamento de pensões e subsídios aos trabalhadores de empresas privadas e aquela tem como finalidade pagar pensões aos servidores do Estado, isto é, à função pública, ou seja, a quem tem como “patrão” o Estado.
O modelo estrutural da Segurança Social pode manter-se, e é conveniente que se mantenha, bastando para tal que se reforme o modo de financiamento desse organismo.
Note-se que para a Segurança Social a ENTIDADE EMPREGADORA CONTRIBUI COM FINANCIAMENTO e, ao contrário, para a CGA o Estado não se obriga a igual contribuição. Qual a lógica deste facto?
É simples! Desde sempre, os funcionários do Estado, tendo como fonte de rendimento exclusivamente o seu vencimento, não estavam, como é racional, sujeitos ao pagamento de imposto sobre o seu salário!
Para se compreender este facto imagine-se a situação caricata de qualquer um de nós ser empregador e ter o seguinte diálogo com um empregado:
— Eu pago-lhe mil euros por mês, mas, porque lhe dou assistência médica para si e para a sua família, o senhor vai-me pagar esse benefício entregando-me duzentos euros.
Naturalmente o empregado, porque não é parvo, faz outra proposta:
— Não me pague mil euros, mas somente oitocentos, pois, na verdade, será esse o meu salário mais a assistência médica para mim e para a minha família!
Mas, como sou um empregador “espertalhão”, não aceito a proposta do empregado, porque sempre que as despesas de assistência médica aumentarem eu aumentarei o valor da entrega que ele me terá de fazer para ter o direito que lhe proporciono. Ou seja, de cada vez que as despesas de assistência médica aumentarem eu, na verdade, reduzo o salário do meu empregado, obrigando-o a fazer o mesmo trabalho por menos dinheiro!
Não nos esqueçamos desta conversa e continuemos.
Com a adesão de Portugal à CEE, os funcionários públicos passaram a pagar IRS como se não fossem empregados do Estado, ou, melhor dito, como se o Estado SE MANTIVESSE IGUAL AO ESTADO ANTERIOR À ADESÃO À CEE.
Como se percebe, o Estado na CEE, ou na União Europeia, tem um estatuto diferente do Estado antes da CEE. E porquê? Porque ao obrigar os seus “empregados” a pagar imposto sobre rendimentos do seu trabalho se desdobrou em duas entidades distintas: o “Estado patrão” e o “Estado mecanismo de gestão pública, política e social”. É nesta última condição que o Estado obriga ao pagamento de impostos aos seus funcionários. E, nesta condição, o Estado português tornou-se VIGARISTA! Vigarista, porque não exigiu a si mesmo a condição de “Estado patrão”, isto é, não passou a contribuir para a CGA da mesma forma que as entidades patronais privadas contribuem para a Segurança Social. Em conclusão, o Estado antes da adesão à CEE era claramente honesto deixando de o ser depois!
Assim, já se pode perceber por que é que qualquer imposto sobre o rendimento de um pensionista da CGA ou sobre um trabalhador do Estado não é, na verdade, um imposto, mas sim uma redução de salário! É isto que não se discute onde e quando deve ser discutido. Mas há mais! Em 2005 o Estado fez sair legislação que conduz, a longo prazo, ao desaparecimento da CGA, pois que concentrou os descontos para a reforma dos seus funcionários na Segurança Social equiparando-se, assim, a qualquer empregador privado, mas eximindo-se às obrigações que estabelece para este último. Ou seja, se já não era honesto antes de 2005, passou à total desonestidade a partir dessa data. Contudo, a proposta de reforma de financiamento apresentada pelo PS no programa de actuação, se formar Governo, sendo substancialmente diferente da do PPD, tenta de alguma forma corrigir essa situação, como veremos de seguida (convém ler o que escrevi antes sobre plafonamento).
O modelo estrutural da Segurança Social pode manter-se, o que não se pode manter é a forma de o financiar. E isso é diferente.
É nisso que o PS apresenta uma proposta distinta porque baseia o financiamento da Segurança Social na cobrança de impostos. Ou seja, em vez de serem só as entidades empregadoras a contribuir para a Segurança Social e mais os trabalhadores, passamos todos a contribuir para a dita Segurança Social, o que é justo, pois quem trabalha não o faz só para a empresa, mas para toda a sociedade, porque as empresas é que sustentam a economia nacional. Deste modo, a pensão na velhice deixa de ser o resultado dos descontos individuais e empresariais, para passar a ser uma obrigação social, porque em qualquer emprego se trabalha, em último caso e em boa verdade, para o bem-estar da sociedade. Então tem de ser a sociedade a contribuir para a sobrevivência dos que já trabalharam e não o podem fazer por terem atingido uma idade que os incapacita socialmente.
Esta é uma visão socialista do trabalho, da economia, das empresas, dos trabalhadores e dos velhos e incapacitados para darem rendimento à sociedade.