Quarenta anos
Festejou-se o primeiro Governo constitucional, festejando Mário Soares. Foi bom e foi mau. A História não se altera, explica-se de modo a percebê-la.
Mário Soares formou um Governo minoritário e conseguiu governar. O sonho dele era, já então, apontar Portugal à Europa. Uma mudança estratégica, porque de estratégia se tratava, pois discutia-se a sobrevivência de Portugal. Era uma outra Europa e não esta e Portugal estava a atravessar um período de larguíssimas dificuldades no plano económico interno e externo. Não havia combustível para fazer funcionar o país. Os empréstimos eram galopantes no estrangeiro. Queria-se pôr de pé um qualquer sistema de ampla segurança social. Debatia-se, ainda, o "papão" da viragem para o comunismo. Havia medos e esperanças. Havia, sobretudo, fantasmas. Fantasmas com fundamento e fantasmas criados para fazer passar uma democracia sem prática. Não se procedeu à necessária "dessalarização" dos Portugueses. Ainda se pensava seguindo paradigmas definidos no tempo do fascismo, que foram usados como arma no jogo político. A mentalidade era a da "libertação fascista" sem saber nem conhecer a democracia e os seus limites e obrigações. Os direitos imperavam sobre tudo. Portugal tinha de andar para a frente com quem tinha cá dentro. Sem invocar nacionalismos, que cheiravam a fascismo, nem comunismos que se temiam.
Todos procurámos perceber os desafios, embora muitos os aproveitassem para "render" a seu favor.
Deixou-se de invocar a História, porque era fascismo, e cometeram-se erros graves nesta negação. Só tardiamente se percebeu o que era geopolítico e geoestratégico e, por conseguinte, imutável, porque condicionante.
Mário Soares foi o homem que marcou o compasso da "dança" política que se seguiria até à plena adesão à CEE, tão desejada. Não se salvaguardaram os interesses nacionais mais profundos e ancestrais; acreditou-se numa viragem sem se assegurar o rumo dessa viragem.
Muito está ainda por explicar e por compreender. Falam as recordações e não fala ainda a História, por isso falam ainda as paixões.
Limitamo-nos a festejar, na pessoa de um ancião, o passado. Ele já pertence à História, porque, com todos nós, a fez.