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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

07.12.20

Páginas do Meu Diário - 12


Luís Alves de Fraga

22 de Fevereiro de 2019

Há dois dias, estive a reler, sem grande preocupação, a História de Portugal do professor A. H. de Oliveira Marques ‒ conheci-o pessoalmente e colaborei, muito vagamente, com ele num projecto sobre a Guerra Colonial, era uma simpatia e um verdadeiro senhor ‒ e, hoje, antes de me sentar em frente do computador, rememorei um pouco do que li.

Ao contrário do que fez o consagrado historiador, é curioso o facto de, quase todos os manuais de História de Portugal para consumo de estudantes e da grande massa de leitores não especializados nestes assuntos, colocarem a tónica da perda da independência na questão sucessória (morte ou desaparecimento de D. Sebastião sem deixar descendência directa) sem cuidarem de fazer uma análise, mesmo que breve, ao panorama social e económico de Portugal na época, pois, para além do problema da sucessão ‒ facto indiscutível e origem de tudo o mais ‒, havia condições para se desejar, em certos meios, a transferência da soberania portuguesa para o soberano de Espanha. São estas coisas que os divulgadores da História fazem, escondendo ou omitindo aspectos que, se contados, completam os quadros explicativos dos acontecimentos. Nem toda a gente tem paciência ou possibilidades de ler Oliveira Marques ou mesmo Vitorino Magalhães Godinho, mas quase toda a gente leu os mais que precários manuais de História que se usam nas nossas escolas. São vaguíssimas as explicações complementares para justificar a união ibérica.

Na verdade, tudo começa, na melhor das perspectivas, pela influência cultural de Espanha ‒ Castela ‒ na corte portuguesa e em certos meios tidos por eruditos, pois, desde o reinado de D. Manuel I (1495-1521) até ao fim da vida de D. Sebastião, falava-se correntemente castelhano e aceitavam-se como boas as modas trazidas pelas rainhas provenientes do reino vizinho. Contudo, nas ruas das cidades, vilas, aldeias e campos deste país, continuava-se a construir a língua nacional e a manter e fazer crescer os hábitos e a maneira de estar e ser português. Havia, por conseguinte, um contraste entre a gente dita culta e os populares.

Mas, nesta análise, o mais poderoso elemento de aproximação a Espanha, foi o comércio desenvolvido pela coroa e os grandes financiadores das explorações mercantis do Oriente. A explicação é fácil e rápida.

O comércio que se fez, durante o século XV, com os povos das costas africanas carecia de muito pouco e pequeno financiamento em metais preciosos, mas, ao chegar à Índia e, logo depois, a Malaca, à China, às Molucas, porque, para além de serem regiões com culturas antiquíssimas, que já participavam na rede comercial do Índico, através dos Islâmicos, os negócios passaram a fazer-se contra pagamentos em prata e ouro, que faltavam em Portugal. Todavia, esses metais existiam em grande quantidade em Espanha, vindos das Américas. Sevilha era o grande centro de negócios, enquanto Lisboa definhava a olhos vistos.

A grande nobreza cheia de rendimentos provenientes da posse da terra, cujas origens se firmaram nos reinados de D. João I, D. Duarte, D. Afonso V e D. João II, com a chegada à Índia e ao Oriente, só os poderia ver aumentados, no século XVI, se se empenhasse na demanda do comércio das especiarias ou, em alternativa, aceitasse servir o rei de Espanha onde havia condições para ser ainda maior.

Não foi, por conseguinte, a falta de um herdeiro de D. Sebastião ou do cardeal-infante D. Henrique que atirou a coroa de Portugal para a cabeça de Filipe II; foi o somatório das três anteriores razões, que não deu sustentáculo à luta humilde e descabelada do povo miúdo capitaneada pelo infante bastardo D. António, prior do Crato, ambicioso e sem grandes créditos em Espanha.

Lisboa, depois da retirada de Filipe II, ganhou a dimensão daquilo que poderia ser em todo o tempo: uma cidade de província, sem corte, sem poder e sem grandeza. As pequenas cortes ganharam lugar nas quintas e domínios da pequena nobreza fugida para onde ela podia ser grande. É ler, de Francisco Rodrigues Lobo, A Corte na Aldeia, obra na qual se pressente a nostalgia de um tempo onde, por ser independente e ter rei soberano, Portugal tinha lugar como Estado na Península e na Europa.

E foi assim que dei por mim a repensar este Portugal de agora, cada vez mais litoral de Espanha e cada vez mais governado por Bruxelas, sendo o nosso Parlamento, o nosso Governo, as nossas disputas e os nossos partidos políticos o enredo de uma vida de aldeia numa aldeia global, da qual a Europa não é a parte de leão.

Porque amanhã é sábado, talvez esteja de melhor humor…