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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

23.11.22

O mundo de todos os direitos


Luís Alves de Fraga

 

Estão a ser avassaladores os protestos contra o Qatar e o mundial de futebol e o não respeito pelos direitos humanos que reina naquele emirato. Acredito que a maioria das pessoas encontre em tudo isto razões para bramar das mais diferentes maneiras, até como deu a entender o nosso Presidente da República de que há um tempo para futebol e outro para direitos humanos.

 

De futebol, nada percebo; de direitos humanos creio ter plena consciência que é uma matéria sensível e em constante mutação sobre a qual possuo alguns conhecimentos e muitas dúvidas; e sobre o Qatar sei o que quase toda a gente sabe: o dinheiro é muito, o luxo é imenso e os negócios sujos são a pontapés.

Em face destes circunstancialismos, a “farpa” de hoje andará à volta dos dois últimos aspectos, já que, no chuto na bola, não quero nem meter colher nem pé.

 

Que houve vigarice na escolha do Qatar para por lá se jogar o mundial de futebol, todos nós sabemos. Mas, sejamos coerentes e deixemos cair a pergunta que poderia ser Jesus, o Messias, a fazer:

‒ Neste mundo de agora e de hoje só se fez vigarice na escolha do Qatar? Não há mais vigarices na política mundial? Não há mais trapaças por esse mundão? Então, quem estiver isento que atire a primeira pedra!

 

Claro, posta a questão nestes termos, imediatamente se pretenderá relativizar a vigarice… Esta ou as outras. Surge o argumento de que uma coisa é o futebol e outra os direitos humanos; uma coisa é o gás natural e o petróleo e outra o reconhecimento da ausência de democracia no Qatar e, mais isto e aquilo.

Pois, o problema está no mais isto e aquilo! É que quando se mistura diversão com negócios, política e moral o caldo fica todo entornado… Se se pretende negociar sem empecilhos têm de se ultrapassar determinados conceitos de natureza ou política ou moral e vice-versa. Mas o mais fácil é seguir o caminho que, desde a mais remota antiguidade foi traçado: converter os povos às mesmas religiões para se negociar e “reinar” em “tranquilidade de consciência”. Foram os Fenícios que, paulatinamente, impuseram os seus deuses aos povos com quem comerciavam, também assim procedendo os gregos, os romanos, os celtas, os visigodos, os católicos, os muçulmanos, os hindus, os, budistas e tantos outros que sempre entenderam estar na igualdade de princípios morais a suavização das arestas que as vendas e trocas geram ao fazerem-se. Mas será agora o tempo de “converter” o Qatar à nossa moral tal como o fizeram os comerciantes do passado?

A moral é uma das expressões mais fortes de qualquer cultura, assim como a língua, mas, aquela sobrepõe-se a esta ‒ com línguas diferentes, mas com princípios morais iguais o entendimento é possível ‒ de tal forma que é na base das diferenças morais que nascem os preconceitos de toda a natureza, em especial os raciais e os xenófobos. E eles, para que não subsistam dúvidas, estão à vista.

 

Ora, no Qatar e naquilo que se realiza durante quase um mês, o elemento cultural que se vai impor é o futebol e a sua forma de gerar comportamentos culturais e, assim, o Estado anfitrião quer assumir-se como o monte Olimpo da Grécia clássica: durante aquelas disputas de chuto na bola todas as divergências se aplacam, como nas Olimpíadas do mundo grego, para se centrarem somente nesse segmento cultural da actualidade, e lá vão todos os “crentes” dos deuses futebolísticos prestar-lhes culto, aplaudindo os vencedores e vaiando os vencidos. Não queiramos que o Qatar seja mais do que aquilo que é!

Quando Marcelo Rebelo de Sousa diz que vai fazer a apologica dos direitos humanos na sua ida aos jogos de futebol ou está a enganar-nos ou está completamente enganado: ali só se vai falar de “coice na bola” e esquecer todas as diferenças e todas as divergências. Depois, sim, será o tempo, se os homens assim o quiserem, de conversão do Qatar aos direitos que tanto elogiamos.

 

Os comentadores de todo o mundo, que falam agora dos direitos humanos e na falta deles quando se construíam as “catedrais” e os “templos” daquilo a que já chamaram “desporto-rei”, são os lapidadores prontos a atirar as pedras na “adúltera” que todos desejaram ter tido no leito. Esta é a hipocrisia do nosso tempo! Este é o tempo de todas as hipocrisias!