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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

13.09.20

Fases da minha vida ‒ 62

(O auto de averiguações)


Luís Alves de Fraga

 

O tempo e a falta de qualquer apontamento escrito não me permitem precisar o momento em que chegaram ao BCP-31 os dois oficiais nomeados pelo general-comandante da 3.ª Região Aérea, para darem início ao processo de averiguações subsequente ao requerimento de saneamento do comandante. Julgo que terá sido ainda antes do mês de Agosto, talvez meados de Julho.

O oficial averiguante era o já conhecido, mas agora, coronel Proença ‒ o tal comandante do AB-1 que contestou o concurso público ‒ e o oficial escrivão era o tenente-coronel pára-quedista Alves Cerveira de Oliveira, vindo do BCP-32, com sede em Nacala.

Começaram por ouvir, admito, mais do que uma vez, o segundo comandante, major Catroga Inês, seguido de todos os oficiais da unidade.

Não sei o que disseram, pois nada contaram. Mas não posso deixar de colocar em destaque o facto de, por essa altura, serem já muito grandes as intrigas entre capitães, havendo como que uma manifesta vontade de me afastarem de delegado do MFA, na unidade.

Ao conjecturar que perdia a legitimidade no desempenho da função, porque já se faziam sentir as influências com matriz política nas posições dos oficiais, coloquei o cargo à disposição para que se fizessem novas eleições. Claro, o resultado caiu na pessoa de um capitão que era, quase pela certa, o intriguista mor da unidade; o único que tratava o anterior comandante por tu e que, contudo, mais acicatou os camaradas contra ele. Mas, com o desenrolar do processo de averiguações, verifiquei que a unidade estava a desmoronar-se, principalmente a partir dos oficiais, havendo já algum mal-estar entre os sargentos, que se posicionavam num ângulo quase oposto ao dos seus superiores hierárquicos.

 

Devem ter durado cerca de duas semanas as averiguações, tendo regressado o coronel Proença ao seu cargo de chefe do estado-maior da Região Aérea e o tenente-coronel Oliveira ao comando do BCP-32.

Dias depois, de concluído o auto de averiguações começaram a fazer sentir-se as consequências da insubordinação: marchou de imediato para Tancos o major Catroga Inês, com a comissão dada por finda, bem como todos os outros oficiais pára-quedistas do quadro permanente, independentemente do posto. Dos oficiais da Força Aérea ‒ os bicos de pato no dizer dos páras ‒ poucos ficaram na unidade. Eu fui um deles.

 

Em Agosto a minha mulher e os meus filhos regressaram a Portugal e, em Setembro ou começo de Outubro, fui contemplado com a visita do, na altura, major de Administração Sacramento Gomes.

Vinha a mando do director delegado da DDSIC, na altura já com sede em Nampula, para saber, por ordem do general-comandante da Região Aérea, qual era a colocação que eu pretendia, pois, de momento, não podia ficar no BCP-31. Tratava-se, como suspeitara, da limpeza absoluta da velha unidade.

Apanhado de surpresa, com a consciência de que me faltavam oito meses ou um pouco mais para terminar a comissão, dei a única resposta séria e honesta, que me assaltou no momento: ir ao Aeródromo Base n.º 6, Nova Freixo, fazer a desactivação administrativa da unidade (estava sem chefe de contabilidade havia alguns meses) e, depois, regressar à minha unidade, ou seja ao BCP-31, visto só perfazer vinte e quatro meses de serviço em Abril de 1974.

O major Sacramento Gomes respondeu-me, textualmente:

‒ É assim que vai ser. Trazia ordens do nosso general para aceitar qualquer proposta que me fizesse, incluindo a de regressar de imediato a Lisboa.

Fiquei a olhar para ele e, mentalmente, a ofender-lhe a mãe e toda a ascensão feminina da sua família. Fez o jogo mais sujo que se podia fazer, embora eu tenha tido oportunidade de ter a mais bela e única experiência da minha vida: ver nascer um novo Estado! Todavia, tive, nesse momento, um dos primeiros avisos do que se tornaria moeda corrente entre nós: o oportunismo, pois o major Sacramento Gomes tinha sido um dos poucos oficiais da Força Aérea empenhado, na noite de 24 para 25 de Abril de 1974, no golpe militar, tomando de assalto as instalações da emissora do Rádio Clube Português.

 

Não tardou que embarcasse para a minha nova colocação, conhecer uma outra realidade, experiência também única: entregar uma base aérea à FRELIMO e sair de lá no último avião português a descolar da pista.

 

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