Eleições, partidos, programas, e objectivos políticos
A maior parte de todos nós pouco terá pensado, quando vota nos momentos eleitorais, na relação entre os partidos, os seus programas eleitorais e os seus objectivos políticos. No máximo, julgo, cada um de nós relaciona somente duas destas três variáveis: objectivo político dos partidos e programas eleitorais ou objectivos políticos e partidos políticos. Ora, é manifestamente, insuficiente ligar só duas destas variáveis. Vamos ver porquê?
De um modo geral, todos temos uma noção do leque de partidos em que queremos votar, porque ou estamos à direita, ou à esquerda, ou ao centro. Dito de outra maneira, temos uma opção partidária por julgarmos conhecer o objectivo político do nosso partido de preferência. Contudo, o que é isto de nos situarmos numa destas posições? Vejamos.
Se estamos à direita sabemos que, no máximo, o nosso voto só pode ir para os partidos do centro; se estamos à esquerda a nossa alternância de escolha só vai até uma formação política de centro-esquerda; mas, se a nossa posição natural é ao centro o nosso voto, por norma, tem uma estreita amplitude de variação: ou vai para um partido de centro-esquerda ou para um de centro-direita. Ora, resta saber, como é que em Portugal temos estas percepções. Tentemos explicar aquilo que, admito, seja a generalidade.
No melhor dos casos, o eleitor leu o programa do partido da sua escolha; no caso intermédio, leu as propostas do partido da sua escolha para aquele acto eleitoral; no caso extremo, o eleitor nunca leu nada sobre o partido da sua escolha, baseando a sua opção numa vaga simpatia pelo partido ou agrupamento de partidos, porque julga saber os ideais que propagandeia (objectivo político).
Assim, deixo de lado a análise do último grupo, por razões evidentes, e fixo-me somente nos dois primeiros.
É manifestamente insuficiente ler a proposta feita para o acto eleitoral ou só ter lido o programa do partido. É, porque, nem a segunda e menos ainda a primeira, nos fazem saber com exactidão qual é o objectivo político de cada partido. É aí que está o busílis da questão!
O objectivo de cada partido é aquilo que ele aspira realizar quando puder chegar ao poder; é aquilo que ele julga definir como bem-comum da sociedade; é aquilo que ele faria se pudesse manter-se no poder por tempo indeterminado. No fundo, e usando uma linguagem matemática que me não é muito familiar, é determinar o limite para o qual tende o partido, se fosse totalmente livre para lá chegar.
Adivinho o pensamento de muitos leitores: mas isso, afinal, todos nós sabemos!
Não, não sabemos, porque não está, normalmente, explícito no programa do partido; está disfarçado, através de expressões que envolvem o tipo de sociedade desejada pelos fundadores do partido. Menos ainda está no documento eleitoral onde se expõem as intenções partidárias para aquelas eleições legislativas específicas.
Só há uma proposta de execução que diz, em princípio, a verdade quanto aos desejos do partido ou da lista independente: é a que se elabora para as eleições autárquicas. E aí tudo pode ser aceite como verdade, por um simples motivo: não se discute a tomada do poder político total.
Então, caros leitores, vamos ver o que é, nas eleições legislativas, segundo o meu critério, votar à direita. Posso dizer que corresponde, como meta, a chegada ao poder de um partido que tem como objectivo a livre concorrência do mercado como regulador da vida da sociedade; isso tem custos elevadíssimos. Votar à esquerda é escolher um partido que, em última instância, aceita a ausência de concorrência no mercado, porque deseja a produção e o consumo planificados; isso tem custos elevadíssimos. Votar no centro-esquerda corresponde a criar a possibilidade de, se alcançar o poder com significativa maioria, implantar uma sociedade que se balança entre a livre concorrência e uma delimitação dos estragos da prática da mesma; isso tem custos muito elevados. Votar no centro-direita é, do ponto de vista ideológico, apontar para uma sociedade onde a livre concorrência vai ter mais possibilidades de se movimentar limitada, aqui e ali, por legislação restritiva dos efeitos perniciosos da concorrência definida pelo mercado; isso tem custos sociais muitíssimo elevados.
Em face ao exposto, parece, para além de um estudo mais apurado sobre as verdadeiras intenções partidárias, fica-se quase paralisado no momento de votar. Pessoalmente não fico. Sei qual o tipo de sociedade que ambiciono como limite e, depois, voto em conformidade táctica ou estratégica.
Votar em conformidade táctica ou estratégica é tema para uma próxima abordagem a esta magna e, por vezes, confusa questão. Tão confusa que, uma larga faixa do colégio eleitoral português, se abstém de exercer esse direito e essa obrigação.