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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

18.05.19

Desilusão


Luís Alves de Fraga

 

Tenho estado, como é meu hábito, atento às notícias nacionais e internacionais, mas mais do isso, atento aos debates feitos nas várias estações de televisão. E é aí, por causa dos noticiários, que hoje me vou focar.

 

Por certo, muitos dos meus leitores e amigos, têm percebido que, de há anos a esta parte, aumentaram exponencialmente as averiguações jornalísticas e judiciais sobre casos de corrupção, fraude e outros crimes praticados por agentes do Estado ou por indivíduos particulares cujo intuito é lesar o património financeiro de todos nós. Rebentaram-se empresas de renome e com valor estratégico simplesmente para beneficiar, em milhões, uns quantos e, em milhares, outros, que servilmente entraram em jogadas escuras e duvidosas.

Quando se “espremem” as notícias e as disputas televisivas a sensação obtida é a de que toda a gente – com ou sem capacidade para tal – anda a tentar enriquecer por qualquer preço e à custa do que for necessário. E disto nem escapam figuras populares com grandes ou médios rendimentos; estou a lembrar-me de Cristiano Ronaldo – a defraudar o fisco espanhol – e de Tony Carreira – a plagiar músicas de canções.

 

Ainda tento, cheio de boa vontade, arranjar desculpas para tal intoxicação da opinião pública: estamos em tempo de campanha eleitoral e é preciso denegrir o Governo ou é imperioso desacreditar a solução governativa conseguida por acordo à esquerda. Mas poderemos e deveremos estribar a explicação em argumentos desta natureza? Julgo, será forçar em excesso a guerrilha política e eleitoral, gerando teorias da conspiração, para justificar o papel quase maquiavélico dos órgãos judiciais e dos meios de comunicação social. A alternativa passa por olhar bem de frente o caminho percorrido pela democracia nacional, integrando-a no fenómeno global capitalista.

 

Há cem ou cento e cinquenta anos, a política, na Europa, ainda não tinha sido conspurcada por uma íntima relação com o capital: giravam em círculos diferentes, mesmo quando se verificava uma aproximação tendencial; os interesses financeiros procuravam a melhor forma de se impor às governações, mas a ideologia política ainda comandava a atitude tanto na conquista do poder como na condução da gestão pública. Recordemos, para fazer prova do que disse, a luta gerada pelos chamados partidos de massas e os partidos de quadros (classificação devida a Maurice Duverger, no começo da segunda metade do século XX); aqueles recebiam o poder vindo das suas bases de apoio e estes impunham o poder partindo do topo. Os primeiros estavam mais próximos do projecto socialista/comunista e os segundos mais chegados à tradição liberal capitalista. Em ambos dos casos o limite de actuação partidária visava conquistar o apoio e a aprovação do eleitorado e, assim, caminhava-se para a conquista possível do bem-comum.

Esta foi a realidade estudada, até há muito poucos anos, nas universidades.

 

Só na aparência as coisas acontecem hoje como as estudou o politólogo francês e, menos ainda, como as tinha enunciado Robert Michels, em 1911. Actualmente, julgo, consequência do fim da bipolaridade da vida internacional e da globalização a par da desnacionalização do capitalismo, passou a haver, como se refere amiúde, uma intimidade promíscua entre o grande capital e os políticos, reduzindo-lhes a quase nada a noção de serviço social, assumida no passado pelos governantes nos séculos XIX e XX.

 

Em Portugal, essa promiscuidade gerou uma ânsia de enriquecimento a qualquer preço, sem olhar a meios nem a condições cívicas e morais. Dá-nos a sensação de que todo o mal-estar transmitido pelos meios de comunicação social indicia a necessidade de pôr fim ao regime democrático, levando os menos esclarecidos a reavivar o sonho do “salvador da pátria”, de um endurecimento da política para conseguir honestidade na vida privada e pública.

Para mim, vindo do tempo da ditadura, tudo isto representa uma desilusão.