Demissões
É notícia o pedido de demissão dos chefes de serviços de medicina interna e de cirurgia das urgências do Hospital de S. José, em Lisboa.
Demissões, porque não se responsabilizam pelo estado caótico a que chegaram os respectivos serviços. Ameaçam com apresentação de queixa na Ordem dos Médicos.
Vamos tentar perceber o que está mal nesta situação, para além da natural justificação dada pelos demissionários.
Este Governo assumiu duas responsabilidades políticas:
1.ª Agir ao contrário do Governo Passos Coelho, isto é, em vez de austeridade usar o poder de compra para melhorar a situação dos Portugueses;
2.ª Assumir e cumprir as obrigações impostas pela União Europeia (UE) e pelo Banco Central Europeu (BCE).
Ora, só numa margem muito estreita é que estes dois objectivos são compatíveis e essa margem é ditada pela possibilidade de evitar o deficit orçamental. Ou seja, o desequilíbrio do orçamento tem de estar contido dentro dos três por cento, mas, ao mesmo tempo, tem de se dar capacidade de compra aos consumidores, que podem ser funcionários do Estado ou não. A margem de manobra, para qualquer dos lados, é ínfima. A acrescentar a tudo isto, o Governo pretende reduzir a dívida externa, para ter uma "almofada" orçamental, que resulta da redução do chamado serviço da dívida, ou seja, dos juros a pagar. Mas, não haveria problema de maior, se o Estado não tivesse um tão grande encargo com os pagamentos aos seus funcionários, nem tivesse de suportar as despesas de conservação de todas as infraestruturas.
Tomando em consideração os encargos e as receitas do orçamento, percebe-se que existe uma impossibilidade de praticar aumentos de salários dos funcionários e aumentos de despesas de conservação.
Como é que se ultrapassa este obstáculo?
Muito simples: pedindo dinheiro emprestado, ou seja, aumentando a dívida pública.
Aqui acende-se a luz vermelha da UE e do BCE.
De facto, sem qualquer sombra de dúvida, continuamos em regime de austeridade e isto mesmo sabiam-no o PCP e o BE quando optaram por formar maioria parlamentar para dar sustentação ao Governo do PS.
E o PS está a viver no fio de uma navalha, pois, não podendo ir contra a UE, tem de ir contra o PCP e o BE. Mas isto atira-o para os braços do PSD, levando-o a ter de, declaradamente, fazer uma política de direita.
E como é que se soluciona este imbróglio?
Através de sobrecarregar a indústria e o comércio com mais taxas e impostos!
Mas isso vai rebentar com a pequenina galinha de ovos de prata que nós temos!
Então como fazer?
Só há um processo: recordar à UE que Portugal desmantelou todas as suas indústrias, os seus estaleiros, a sua frota de pesca, a sua frota mercante, reduziu a nada a sua agricultura, para satisfazer os critérios de admissão no Mercado Comum e estar disposto a consumir os produtos produzidos lá fora sem compensação, nem defesa alfandegária. Dirá a UE que já pagou aquando do desmantelamento e que Portugal não se soube preparar para enfrentar uma "nova vida", mas o certo é que o BCE não pagou, ainda, a nossa adesão à moeda única! É por aqui que se tem de "atacar" e "responsabilizar" a Europa!
Dirão que fomos irresponsáveis. Teremos de replicar que aos produtores europeus sabe muito bem terem aqui mais um mercado de consumo; então que paguem para o ter.
Evidentemente, há que reformar o Estado, dimensionando-o à medida do nosso orçamento. Acabem-se com fundações, com sociedades parasitas e com parcerias gulosas; reduzam-se os salários e mordomias de políticos (sabem que cada deputado ganha mais do que um coronel das Forças Armadas?).
Espero ter sido capaz de explicar de forma clara e linear os espartilhos da nossa economia e do nosso orçamento.
O Governo, em vez de estar contra o PCP e o BE, terá de entrar já em reformas profundas para não deixar cair o SNS no descalabro patente na demissão dos clínicos responsáveis por serviços imprescindíveis.
Tire cada um as suas conclusões.