Consumo ou austeridade?
Ontem vi parte de um painel liderado pelo José Gomes Ferreira, na SIC, onde peroraram uns senhores mais do que comprometidos com as grandes empresas e com a alta finança nacional; só um terceiro, professor do ISEG, me pareceu descomprometido e isento.
A questão em debate era reflectir sobre como se recuperará a economia portuguesa. Dois dos intervenientes apostavam forte nas medidas de austeridade, ou seja, levar novamente os funcionários do Estado e pensionistas a pagarem a crise de modo a que, com todos os alívios possíveis, as empresas recuperem os lucros perdidos. O professor defendeu, e bem, que a economia readquire pujança através do aumento do consumo e, para tal, a austeridade é absolutamente inadequada, pois, sem dinheiro não é possível comprar.
As divergências entre os intervenientes no painel resultam de dois ângulos de análise: ou se pede dinheiro emprestado para superar a crise ou vai-se buscá-lo internamente, evitando o endividamento.
Na primeira perspectiva, transfere-se o pagamento da crise para o futuro, quer dizer, quem vai liquidar a dívida são os nossos filhos e os nossos netos; na outra solução, quem se lixa somos nós, os quase a morrer, os com alguns anos de vida e os com muitos anos de vida pela frente. Ainda mais resumidamente: uns preferem comprometer o futuro e outros o presente imediato.
Pessoalmente, aposto na primeira hipótese: comprometer o futuro. Não o faço porque quero empurrar com a barriga o que se passa no presente. Não!
Opto pela solução dos empréstimos por várias razões, das quais destaco duas, que, presumo, são basilares: as economias não tendem, ao longo do tempo, a encolher, mas sim a expandir-se; o preço do dinheiro vai baixando com a passagem do tempo.
Vejamos com o pormenor possível.
Foi em 2009 que se liquidou totalmente a dívida contraída cento e cinquenta anos antes por Fontes Pereira de Melo. O peso dos juros da dívida foi tornando-se mais baixo, porque em simultâneo, ocorreram dois efeitos: a desvalorização do dinheiro (efeito da inflação) e aumento da economia nacional (o mesmo é dizer, da capacidade produtiva do país), que deu uma dimensão menor ao valor em dívida.
É evidente que, os juros das dívidas contraídas agora, vão ser, para a nossa capacidade produtiva momentânea, altos, mas, o objectivo, lá mais à frente no tempo, é fazer crescer essa tal capacidade de produção. Numa palavra, esta opção corresponde a uma aposta no enriquecimento da Nação.
Claro, o objectivo dos empresários, investidores na economia, não é o de enriquecer os netos ‒ qualquer um deles ri-se dessa ideia, pois sabe que, deixando boas infraestruturas financeiras ao morrer, os netos, se souberem administrá-las, as vão ampliar ‒, mas o de se enriquecerem a si mesmos, e já, por isso, quanto mais benefícios colherem no momento presente, melhor será, mesmo que à custa do mau passadio dos seus trabalhadores.
Espero ter sido suficientemente claro para que os leitores possam compreender os objectivos em presença e, assim, possam formar opinião sobre se a saída para a crise se faz com austeridade ou com consumo.