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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

18.02.23

Carnaval


Luís Alves de Fraga

 

As minhas crónicas não têm a pretensão de fazer História (nem pequena nem grande); são meras e breves passagens pela memória para deixarem a minha visão de um “ontem” que recordo e vivi, isto, está bem de ver, quando não me debruço sobre outros assuntos, aos quais poderia colar o epíteto de “mais sérios”.

Estamos em pleno Carnaval e ontem à tarde fui até Lisboa a um grande centro comercial, que estava quase “às moscas”, enquanto a ponte 25 de Abril, no sentido Norte -Sul se encontrava encravada de automóveis que, percebia-se pelo tipo de passageiros, iam de viagem… Viagem aproveitando as férias de Carnaval. É sobre isto que hoje me vou debruçar.

 

Quando eu era criança, até mesmo quando os meus pais eram jovens, viajar em tempo de férias para “fazer férias” era algo que não estava ao alcance das bolsas comuns, nem as bolsas comuns tinham meios de transportes para se deslocarem de um ponto distante para outro. Deste modo, férias tinham-nas os estudantes, porque, para os restantes o trabalho era como o pão nosso de cada dia. Talvez, não sei, não me lembro, na minha juventude, alguns empregos do Estado e grandes empresas fizessem feriado na terça-feira de Entrudo. As festas tinham lugar no sábado à tarde e à noite, no domingo e, depois, na noite se segunda para terça e na terça à tarde, porque quarta-feira já era dia de trabalho para quem não era estudante.

 

O “povo”, e quando digo povo refiro-me às classes sociais mais baixas, divertia-se à sua maneira, vestindo-se de forma trapalhona, fazendo barulho nas ruas e sempre por lá apareciam os “xexés” ou também designados por “chachas” figuras típicas da minha infância.

Para grupos mais dados à paródia organizada, havia um corso (ainda vi uns dois) no Campo Grande, com carros onde umas meninas se exibiam tão “descascadas” quanto a moral fascista permitia, atirando serpentinas e saquinhos cheios de serradura à cabeça dos basbaques que retribuíam com piropos mais ou menos decentes.

Os cinemas (alguns) faziam matinés para a garotada se divertir a atirar os papelinhos e as serpentinas mais os tais saquinhos, que, por norma, não magoavam a não ser aqueles que vinham cheios de bagos de grão de bico.

Havia, também, para as famílias que se conheciam, os chamados “assaltos” quando uma série de foliões, mascarados ou não, batiam à porta carregados de garrafas de vinho, cerveja ou, até, nos casos mais “finos”, de champanhe. A balbúrdia estabelecia-se quando se criava um espaço para dançar, e jogar montes de papelinhos (confetis) que representavam o grande problema de limpeza da dona da casa no dia seguinte, tudo isto ao som de música brasileira tocada em qualquer gira-discos posto em qualquer lado. E, pessoas antes desconhecidas, dançavam e divertiam-se como se fossem velhos amigos de há muito tempo.

Nos cinemas (alguns) também se organizavam bailes, à noite, mais refinados levando um filme de hora e meia a durar uma noite até às seis da manhã. Era um tempo em que, em Lisboa, porque só de Lisboa eu falo, se procurava uma boa disposição saudável e indiferente ao que viria nos dias seguintes. O Carnaval eram três dias!

 

Para mim, as diversões mais acessíveis eram os bailes nas chamadas “Casas Regionais” (dos Açores, da Beira Baixa, da Beira Alta, de Trás-os-Montes ou na Cooperativa Militar) onde se dançava sem parar ao som de conjuntos musicais que tocavam sambas e marchinhas até à exaustão. Eram momentos para arranjar namoricos, que podiam morrer no fim da noite ou durar a quadra carnavalesca.

Eram tempos muito diferentes dos actuais, porque o Carnaval constituía, realmente, um escape para as agruras e dificuldades do dia-a-dia. As ruas pejavam-se de crianças mascaradas e as dificuldades deitavam-se para trás das costas, pois havia forma de diversão para todas as idades e para todas as bolsas. Jornais como o “Diário de Notícias” criavam uma página para os papás levarem os seus rebentos mascarados colocando-lhes a fotografia, vindo, assim, a ser “importantes” por saírem nas colunas desse diário de grande tiragem.

 

Claro que o progresso tecnológico, uma maior abastança monetária e uma mais notável tendência para o isolacionismo individual ou familiar, levou a que já nada se repita do mesmo modo. Creio que, segundo julgo, mesmo igual ao passado, só o Carnaval no Rio de Janeiro… mas lá faz calor e cá está frio.