Alberto João Jardim
Ontem à noite, por mero acaso, apanhei uma entrevista televisiva dada pelo antigo governante da Região Autónoma da Madeira (RAM) ao Porto Canal.
Antes de começar a discretear sobre o entrevistado e o que disse, quero declarar o quanto não nutri nunca simpatia por Alberto João Jardim.
Esse advogado – talvez sem grande importância ou valor na Madeira, antes de 25 de Abril de 1974 – estava, por laços familiares, ligado à elite funchalense e ao regime salazarista. Teria, se a ditadura não caísse, como caiu, um lugar assegurado na Acção Nacional Popular, a herdeira da União Nacional, de Salazar, para conseguir singrar na sua cidade natal ou, talvez, até no continente. Ao que consta, nunca se lhe conheceu qualquer ímpeto democrático ou liberal antes da revolta dos capitães em 1974. Aluno de baixa craveira – o que não é motivo para o desprezar como político, pois não é, nem foi, caso único – depois de ser Presidente do Governo Regional, distinguiu-se por conceitos de democracia assaz estranhos, porque, além de cultivar a demagogia, detestava tudo o que, de algum modo, pudesse aproximar-se do pensamento socialista, nas suas várias interpretações.
Parece que no desempenho do cargo de décadas não aumentou o património pessoal, mas, ao que consta, terá sofrido de grande miopia quanto aos patrimónios de quem trabalhou com ou ele ou próximo dos que dele dependiam. Provavelmente, sempre lhe faltaram provas para concluir da veracidade dos rumores!
Ontem, na entrevista, disse coisas que me deixaram a pensar. Não lhe vou fazer discurso laudatório, todavia, reconheço que tem razão ao afirmar que tem havido decisões políticas tomadas pela maioria parlamentar merecedoras de ser escrutinadas pelos eleitores. Não mandou dizer por ninguém, mas disse-o, estranhava que certos políticos que iniciam carreiras governamentais sem grande património as acabem detentores de muitos milhares de euros. Afirmou que tal não se consegue com o recebimento de três ou quatro mil euros por mês.
Não imagine o leitor que Alberto João Jardim tinha só em mente José Sócrates! Se foi esse o caso, então, não passa de um tonto… e ele provou, mutos anos, que de tonto não tem nada.
Não pude deixar de admirar, com bastante ironia, a franqueza – que vai direita à vaidade do antigo governante madeirense – com que se referiu à sociedade local antes de 25 de Abril de 1974, (cito de memória): «era quase feudal; havia os senhores e o povo». E para identificar o “povo” deu a imagem da mulher com o lenço na cabeça, «como se fosse árabe».
Pelos vistos, hoje continua a haver povo, por lá, pela Madeira, só que já não andam as mulheres com lenços na cabeça e, por isso, não são árabes!
Alberto João Jardim, pese a idade que tem, continua a ser um “político de ontem” com o populismo próprio de quem domina em áreas de grande obscurantismo cultural e político.