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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

14.01.20

A nova década


Luís Alves de Fraga

 

Ontem, ao serão, graças ao aviso lançado por um Amigo, passei, já tardiamente, por um canal televisivo onde se discutiam os tempos de agora. Apercebi-me que se falava do Irão, do assassinato do general, de petróleo, de clima e poluição e, também, das esperanças para o futuro. Do que vi e ouvi, escolhi para tema de reflexão de hoje a mudança de paradigma político que se avizinha.

 

Há cem anos começavam os, depois, designados “loucos anos 20”. Foi um tempo, na Europa e nos EUA, de desbunda. A guerra, acabada em 1918, provara quão efémera era a vida humana, desbaratada nas trincheiras por vontade de políticos que até tinham dificuldade em justificar a razão da carnificina, gerando um tempo de desejo de viver sem responsabilidades, ainda que correndo riscos, um tempo de loucura, desde o uso e abuso de cocaína até à dança desengonçada de ritmos novos, passando por uma profunda alteração da moda e dos costumes. Na Europa e nos EUA procurava-se um novo caminho, um novo rumo para a vida.

 

Como a História não se repete, de certeza não vamos reviver o que se passou há cem anos, mas, contudo, estamos num impasse político, social e, acima de tudo, económico.

Os Estados europeus perderam quase toda a importância política e financeira de há cem anos. Hoje o centro da decisão das ocorrências no mundo deixou de estar ligado ao eixo Londres-Paris-Berlim para se estabelecer na linha que une Washington-Moscovo-Pequim. Já nem sequer é bipolar a decisão política no globo, como conseguiu ser após a 2.ª Guerra Mundial; com a queda do bloco de Leste, multiplicaram-se os centros de instabilidade, ganhando autonomias impensáveis.

A separação, pelo menos aparente ou disfarçada, entre a política e a finança tornou-se, na viragem do século, promíscua, evidente e avassaladora. As fortunas aumentaram a níveis impensados, fugindo aos sistemas fiscais dos Estados, fixando-se em paraísos aduaneiros onde se lava o dinheiro cujo valor se multiplica exponencialmente. Os resquícios de ética nos comportamentos sociais, comerciais e políticos desapareceram. A democracia herdada do século XIX e transformada com as mudanças do século XX está em plena crise; vêem-se proliferar, um pouco por todo o lado, os populismos, que não matam o sistema democrático, mas alienam-no, tal como se notam afloramentos de fascismos diferenciados daqueles que existiram no passado, mas, todavia, plenos de xenofobia, de racismo, de violência.

 

A segunda década do século XXI ameaça fazer ruir os procedimentos sociais, políticos e económicos tradicionais sem nos mostrar alternativas ideológicas e doutrinárias como aconteceu no final do século XIX. Sabemos que se esboça uma mudança, mas não sabemos qual é nem para onde vamos. A única ideologia que parece comandar a sociedade é a chamada globalização. Mas ela surge-nos mais como uma ameaça de destruição do que como uma redenção política, social e económica. Parece que se vive para o consumo sem ter oportunidade de poupar, enquanto outra parte da população global cai na mais sinistra miséria. O discurso político está centrado nas alterações climáticas ao mesmo tempo que subsiste uma prática contrária à sustentabilidade da vida na Terra.

 

Há, cada vez mais, um egoísmo colectivo, não nacionalista, porque, parece, se quer esbater fronteiras com apropriação de tudo o que é dos outros como, se quem pode viajar, desejasse “comer” o mundo, consumindo-o através da afirmação de o ter percorrido de lés-a-lés. Em simultâneo, há quem nunca tenha saído do seu pedaço de chão e morra sem consciência do que se passa fora da distância do seu olhar.

Os fossos económicos e culturais aprofundam-se até atingirem proporções descomunais. Há gente, no mundo, que nunca passará do simples conhecimento de si mesma, sem outros horizontes de destinos que não sejam a sobrevivência e a morte. Por outro lado, “desperdiça-se” educação e instrução com gente que não quer aprender, porque tem acesso a quase tudo sem esforço.

De facto, objectivamente, não há progresso! Há desigualdades onde uns beneficiam de descobertas e outros ajudam, quando muito, a construir os artefactos que estabelecem as diferenças.

 

A crise dos anos vinte deste século vai desaguar não sabemos em que oceano, mas em algum lado a humanidade encontrará o seu fim.