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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

18.07.19

A guerra em África: Serviço Postal Militar


Luís Alves de Fraga

 

Um dos mais importantes aspectos a levar em conta, em situação de combate ou de profundo isolamento, é o moral das tropas. Uma tropa desmoralizada é uma tropa capaz de não oferecer resistência perante a acção do inimigo; é uma tropa amorfa, sem “pontes” para a vida e para o exterior de si própria. Um dos processos para lhe erguer o moral é mantê-la em contacto, tanto quanto possível, permanente com o mundo exterior ao combate, à guerra. Isso faz-se através de lhe dar notícias, sejam jornais, televisão, radiotelefonia e correspondência postal. Hoje, um telemóvel e um computador portátil dispensam todos os tradicionais meios de comunicação, embora, o excesso de informação tenha mostrado o reverso da medalha: a resiliência do combatente fica mais exposta às novidades recebidas, daí que, por regra, a permanência em zona de guerra se tenha reduzido substancialmente.

 

Entre nós, a primeira vez que se montou um grande sistema de distribuição de correspondência postal foi durante a Grande Guerra, quando enviámos para França o Corpo Expedicionário Português, com um pouco mais de cinquenta e cinco mil homens. Já nessa época os correios eram extremamente rigorosos e disciplinados no manuseamento da correspondência e das encomendas postais.

Mais tarde, no começo dos anos 50 do século passado, quando se criou o Campo Militar de Santa Margarida, onde se faziam grandes manobras, durante o mês de Setembro, para treino de uma divisão integrante das forças da NATO, novamente se reactivou o serviço de correios, o qual serviu de modelo para, em Junho de 1961, por ordem do chefe do Estado-Maior do Exército, general Câmara Pina, se requisitar aos CTT (Correios Telégrafos e Telefones) ‒ coisa aparentemente impossível de se conseguir nos dias que correm ‒ pessoal para retomar e ampliar o SPM, de modo a fazer chegar a todas as unidades, nas colónias, a correspondência postal.

 

Em abono da verdade, era inegável o bom funcionamento dos CTT e foi com facilidade que a organização deste serviço se articulou com a disciplina militar. Os funcionários foram graduados em oficiais e, mais tarde, ampliou-se o quadro de pessoal do SPM.

O correio chegava às unidades mais distantes, muitas vezes, levado por via aérea, sendo a forma de dar alento, conforto e boa disposição aos soldados.

É certo que a criação dos aerogramas, conseguida pelo Movimento Nacional Feminino, trouxe uma maior facilidade de troca de correspondência pela sua gratuitidade. Era uma só folha, mas, bem aproveitada, chegava para dizer o essencial e, o índice de alfabetização das praças não era tão elevado que carecesse de mais papel; contudo, se preciso, sempre se podia mandar outro aerograma!

 

A minha consciência não ficaria tranquila se me esquecesse de que a guerra em África teve dois “lados”: o das nossas tropas e o dos guerrilheiros.

Ora, o que foi verdade, em termos de resiliência para os soldados portugueses, por causa de terem notícias da família, dos amigos e dos seus lugares de origem, não foi verdade para os guerrilheiros. Para eles não houve SPM, nem televisão, nem rádio, nem qualquer tipo de movimento feminino de apoio. Contaram exclusivamente com o auxílio das populações ‒ que corriam riscos imensos ‒, com a sua vontade, com a força da ideologia que defendiam e com pouco, muito pouco, mais. E não se diga que não sabiam ler nem escrever ‒ porque é mentira ‒ nem que a família não gostaria de saber notícias deles.

 

Só seremos verdadeiramente dignos de nós e do nosso esforço quando formos capazes de reconhecer os sacrifícios e a enorme capacidade de resistência daqueles que combatemos. E, se o fizermos, ao referir a valia do nosso SPM, somos obrigados a concordar que fomos uns felizardos, mesmo no meio de toda a miséria e sofrimento pelo qual passaram as nossas tropas.