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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

18.11.22

A confusão instalada


Luís Alves de Fraga

 

A memória nem sempre faz de nós pessoas confiáveis, pois, uma ou outra vez, julgamos estar a afirmar uma única verdade e, afinal, já tinham ocorrido duas ou três anteriores.

Ora bem, encontro-me nesse dilema: parece-me que nunca houve tanta confusão na governança do país como está a ocorrer de há, talvez, quatro ou cinco meses a esta parte. São casos de compadrio, de suspeição, de greves, de manifestações, de nepotismo, de encobrimento de falsas declarações, de vigarices, de trapalhadas, de má interpretação das leis, eu se lá que mais!

 

O país tem um governo estável como já não havia há muitos anos, fruto de uma maioria absoluta no Parlamento e parece, todavia, que a minoria parlamentar e grupos de cidadãos arregimentados fora da organização administrativa da nação fazem questão de instabilizar aquilo que devia ser firme. Mas, a verdade, é que dentro do próprio Governo há descuidos individuais que desacreditam todo o colectivo. Dá a sensação de que “cada um toca a música que sabe” sem ligar ao “regente da orquestra”.

 

É verdade que no Parlamento, por culpa de quem fez opções erradas, há um partido, cujo líder tem o hábito de “armar alvoroço” de desestabilizar não só a Assembleia da República como, também, o Governo e a sociedade em geral. É um grupo parlamentar que anima, pela negativa, a massa mais ignorante do nosso eleitorado, a populaça mais alienada e desligada das causas públicas, que só sabe espumar ódios e vinganças sem tino nem lógica.

Esse grupo parlamentar não tem implantação verdadeira no eleitorado; tem implantação nos exaltados estados de espíritos existentes nas franjas do eleitorado, naqueles que não sabem escolher com base numa ideologia, numa postura pensada e ponderada, naquele tipo de sindicalismo inorgânico que reivindica sem a noção dos limites do possível.

Creio que essa técnica de movimentar as massas populares está a ser copiada por elites despeitadas e, até, pelos órgãos de comunicação social.

Estas são as razões endógenas para a confusão, no meu parecer, porque nisto de analisar comportamentos sociais cada qual, desde que usando de meios honestos, pode encontrar motivações díspares, embora, se prevalecer a independência e a probidade, encontre pontos comuns. Vamos agora tentar relacionar o que se passa cá dentro com o que se passa lá por fora, visto que, por força da capacidade de comunicação existente nos tempos que correm, a “contaminação social” é quase imediata.

 

Escusado será referir, por ser reconhecidamente brutal, o populismo trumpista que vigorou nos EUA e que veio desregular o mais ou menos estável e reconhecido sistema democrático americano. Quase de seguida surgiu o bolsonarismo no Brasil com idênticas características, mas com a agravante de se tratar de um povo onde a percentagem de desinformação é muitíssimo maior e o analfabetismo político ser quase total, salvando-se uma minoria urbana; acresce que esta corrente de populismo se reflecte quase directamente em Portugal por três vias: redes sociais, porque usam a mesma língua, influência por via dos órgãos de comunicação e, finalmente, uma imensa quantidade de imigrantes que simpatizam com Bolsonaro e se encarregam de lhe glorificar as virtudes nos meios onde se movimentam.

Ainda na sequência de uma linha de mudança e de desacato e irreflectido populismo, tivemos e temos os “amarelos” em França e o nacionalismo xenófobo de Marine Le Pen, que arrastou inúmero eleitorado nas consultas ao povo francês. Na mesma linha estão os italianos e, marcando uma diferença na democracia europeia, os húngaros e os polacos. Não quero exaltar ou referir as alterações mais antigas em Espanha.

Para contribuir para a nossa situação tivemos a epidemia do Covid 19 e mais as suas variantes com todas as medidas discutíveis nos diferentes países do mundo, desde o negacionismo à mais rigorosa imposição de isolamento ocorrida na China onde a força policial calou toda e qualquer recusa ao cumprimento das determinações estatais. Nesta transição entre o bom estado de saúde no mundo e a situação pandémica dá-se o Brexit e toda uma desordem no Reino Unido que vai ao arrepio da melhor tradição britânica.

Se pararmos para nos fixarmos nos parágrafos anteriores, percebemos que a imagem da democracia estável de há dez ou quinze ou mesmo vinte anos está de rastos, está desfeita e o que resta são breves instantâneos dessa velha representação da prevalência da vontade dos povos através de formas ordeiras de impor a vontade das maiorias.

 

Tudo isto se refletiu em Portugal e fez balançar o nosso tranquilo leque de partidos políticos com assento no Parlamento, chegando ao ponto de desaparecer um dos que fazia parte da refundação da democracia, em 1974, representativo da direita mais extrema, surgindo novos agrupamentos, invocando motivos e objectivos completamente díspares daqueles que discutiram e aprovaram a Constituição de 1976.

 

Esta amálgama de mudanças fora e dentro de Portugal dá-nos a sensação de uma instabilidade que nos incomoda e nos enerva, mas teremos de ter a frieza necessária para perceber que, se por um lado, as “velhas” democracias estão em movimento de “ajuste tectónico” o nosso ainda jovem sistema político deve ser analisado com o distanciamento que se usa ao corrigir a adolescência e as suas patetices próprias da imaturidade.

O grupo de extrema-direita, que fizemos chegar a terceira força política, é um “bluff” social e político e, como tal deve ser tratado ou destratado, e para alcançar esse desiderato resta-nos apostar forte nos partidos de esquerda e nos de direita tradicional, que ainda se sabem movimentar dentro de um quadro nacional respeitador de tradições, que não passam por vender o país ao desbarato em nome de soluções económicas que só satisfazem os grande grupos financeiros que se passeiam pelo mundo.