Do aperto até à Europa e à elite que nos governa
Em Portugal o aperto está a ficar insuportável: aumentam os impostos, cresce o custo de vida, aumentam os transportes urbanos e não só, ficam mais caros os combustíveis, as taxas moderadoras nos hospitais estão pela hora da morte, as facturas da água, da electricidade e do gás são de valor mais alto para os mesmos consumos, os salários e pensões descem.
Dizem que estamos em regime de “emagrecimento”, mas há uns “gulosos” que continuam a mamar na teta enquanto nós chupamos no dedo!
Já passei por duas intervenções do FMI em Portugal e não me lembra que tenham assumido os contornos desta. Só faltam as senhas de racionamento e as filas para a aquisição de géneros para o estado actual me recordar os tempos da minha mais recuada meninice, no final da 2.ª Guerra Mundial. Quando passamos a usar os automóveis alimentados a gasogénio? Ainda me lembro de os ver na cidade de Lisboa!
Não quero acreditar que a Alemanha tenha chegado a propor a perda de soberania orçamental da Grécia, transferindo-a para um comissário da União Europeia!
Era esta a Europa de Jean Monnet?
Esta é a Europa de uma elite de políticos que está – toda ou a grande maioria – desligada dos seus povos, que não se representa mais do que a ela mesma. Uma elite que, no caso nacional, é medíocre, impreparada e quase inculta, porque desconhece os grandes valores da Cultura Portuguesa. Fala inglês, discorre, às vezes mal, sobre notícias do dia-a-dia, leu uns quantos livros técnicos das suas áreas de formação, mas está desligada e desconhece as grandes linhas enformadoras do carácter português, da orientação política secular que possibilitou chegarmos aqui soberanos e independentes. É esta ignorância que aflige, que se torna imperdoável, especialmente face à arrogância comportamental destes “senhores do Poder”.
No ano passado, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal – Luís Amado – em mesa-redonda pública defendia, como “grande descoberta”, a viragem de Portugal para o Atlântico, para África e o Brasil, esquecendo, ou desconhecendo, que essa foi, desde o início do século XV, a estratégia adoptada pelos Portugueses para garantirem o seu lugar na Península e na Europa.
O que aflige nesta elite que nos governa é a ignorância do passado! Se fossem conhecidas dos governantes a História e a Geopolítica nacionais talvez, aquando da adesão à CEE as condições políticas negociadas tivessem sido outras.
Mário Soares e os seus companheiros de viagem, na ânsia de negarem o fascismo português, negaram também os grandes vectores condicionantes da nossa vivência quase milenar. E o perdão dessa geração de políticos é mais difícil de conceder, porque faziam parte de uma faixa etária que tinha por obrigação saber, pois recolheram da 1.ª República os ecos que ainda pairavam no ar quando eram jovens. Cegaram politicamente e lançaram-se nos braços da Europa como virgens inocentes nos braços do amante experiente. Aceitaram tudo o que lhes foi pedido como coisa natural, como pagamento de uma aproximação que, julgaram, era um favor que lhes estava a ser concedido. E o “tecnocrata” Cavaco Silva, doutorado na Grã-Bretanha, ignorante do saber centenário dos Portugueses e da sua História, desconhecedor das interpretações mais elementares dos vectores que conduziram ao longo de séculos a pátria portuguesa – sabedor do deve e haver contabilístico e de mais umas quantas teorias económicas que repudiavam como monstruosas as marxistas – para além de deixar destruir o tecido industrial português, foi incapaz de mandar estudar e traçar uma política de desenvolvimento que aproveitasse, no mínimo, o máximo de capitais que a Europa, interesseiramente, despejava a jorros sobre Portugal. Mas Cavaco Silva foi mais longe do que os seus antecessores: impôs, nacionalmente, um novo paradigma de aceitação de condução política: o personalismo, o líder. Foi ele quem fez a transmutação do modelo de discussão das ideias e ideologias políticas para a discussão e aceitação do líder partidário. “Ou me aceitam a mim e à minha condução política ou me rejeitam e demito-me da liderança partidária”. A política passou a ser um homem e um programa de governo que ninguém, ou quase ninguém, lê. A política passou a ter um nome e um rosto! Deixou-se de discutir a ideologia que dava forma ao programa! Era assim conveniente em nome da menoridade mental dos líderes e da “tecnocracia” que substituiu a política. E Portugal e os Portugueses deixaram de ter oportunidade de discutir linhas de força, ideias, vantagens; passaram a discutir política como quem discute treinadores de futebol.
Por causa de tudo isto, chegámos à hora do aperto insuportável. Claro que, enquanto colectivo, temos culpas nas escolhas de liderança que fizemos. Esquecemo-nos que somos júris de um “concurso” no qual os candidatos são os políticos e nós as autoridades que lhes damos posse. São eles os devedores e nós os credores. São eles o elo mais fraco e nós o mais forte. Eles governam porque nós lhes damos a governação.
Quando será que nós, enquanto Povo, nos capacitamos do imenso poder que temos e do formidável respeito que nos é devido? A ditadura roubou-nos essa visão de autoridade que em nós reside! Os servidores são eles e nós somos os patrões. A ditadura, por o ser, inverteu esta ordem e nós todos deixámo-nos convencer. Acordemos desse sonho mau! Somos nós quem manda! Os governantes são nossos mandatários. Somos mandantes não somos mandados!