Feriados
A estranha ideia deste Governo em fixar-se na resolução de minudências quando o país atravessa a mais séria crise financeira com reflexos económicos desde 1926 fala, só por si, da incompetência, da mediocridade e, talvez, do seu reaccionarismo político, para não dizer, também, da sua subserviência ao estrangeiro.
Já me ocupei aqui do aumento de meia hora de trabalho diário para todos os portugueses empregados. Não vou voltar ao assunto. Desta feita criticarei o corte de quatro dias que são feriados entre nós.
Se a memória não me falha, a última vez que houve corte de feriados em Portugal foi aquando da implantação da República, a qual, por se assumir laica, reduziu drasticamente a quantidade de feriados religiosos que abundavam no país. Ficaram os mais tradicionais e com maiores raízes culturais.
Passos Coelho e os seus companheiros de governação querem passar à História pelo absurdo facto de reduzir feriados nacionais invocando para isso razões de carácter económico, particularmente de produtividade. Mas quantos feriados se propõem abolir? Qualquer coisa como quatro. É ridículo! Quatro dias a mais ou a menos de trabalho num ano é indiferente e não altera a produtividade deste povo. Como já disse há dias, o problema da produtividade é, fundamentalmente, uma questão mais profunda e que se não resolve com medidas avulsas desta natureza.
Fala-se no corte de dois feriados religiosos e de dois laicos quando o Estado português é, realmente um Estado laico. Porquê esta divisão equitativa?
Fala-se na extinção do feriado de 5 de Outubro e na de 1 de Dezembro. Ora, qualquer destas datas são marcos indeléveis na História de Portugal que só uma cambada de analfabetos pode ignorar e desprezar. A recuperação da independência e soberania em 1 de Dezembro de 1640 é uma data que não deve ser esquecida dos Portugueses; corresponde à refundação de Portugal. A aclamação da República em 5 de Outubro de 1910 é outra data que representa uma mudança de cento e oitenta graus no rumo dos destinos da Pátria: foi a aclamação da República. A aclamação do regime que permite a Cavaco Silva ser Presidente e tantos outros aspirarem a sê-lo neste país de gente ambiciosa de cargos e prebendas civis. Estas duas datas, sendo abolidas da memória colectiva, dão de quem assume a decisão duas indicações bem claras: desrespeito pelo regime político em que vivemos e total desinteresse pela nacionalidade.
Querem acabar com feriados? Querem que sejam quatro? Então qual o motivo porque não escolhem a terça-feira de Carnaval e a sexta-feira santa? Que se não venha dizer que esta última ofende os católicos e os cristãos! E os republicanos e os Portugueses que se revêem no 5 de Outubro e no dia 1 de Dezembro?! Tem receio o Governo da reacção da Igreja de Roma? E não tem da reacção da reacção dos Portugueses? Dos Portugueses cultos e amantes da sua pátria? Tem receio das autarquias que festejam o carnaval e que com isso conseguem uns cobres de rendimento turístico? Valerá, em termos financeiros, esse dia mais do que se for de labor normal?
Confesso que, se não gostava do Governo Sócrates pela carga de hipocrisia e mentira de que se revestia, não gosto do Governo Coelho pelas mesmas razões e mais a demagogia que transpira.