A meia hora
Mais uma vez se vai fazer a opção errada! Vai-se aumentar o tempo de trabalho em meia hora diária com a possibilidade de o patronato usar esse tempo conforme entender.
Deixemos para mais tarde a análise marxista desta medida e fiquemo-nos simplesmente pela apreciação prática da ideia.
Pretende-se que a produtividade aumente. Pessoalmente acho muito bem, com ou sem crise, que assim se proceda. Aumente-se a produtividade, mas não se aumente o tempo de trabalho, pois há muitas e variadas formas de rentabilizar a produção.
Se calhar, era mais importante que se desse formação aos nossos empresários para que aprendessem a aumentar a produtividade sem ser à custa do trabalhador. Bastava que se soubesse organizar as empresas de forma racional de modo a reduzir os desperdícios em tempo, matérias-primas e trabalho. Quantas vezes a falta de rentabilidade vem por causa da existência de circuitos redundantes? Quantas vezes um simples gesto pode aumentar a rentabilidade e, por consequência a produtividade? Nada disto o Governo equaciona! E não equaciona, porque ou não sabe ou não quer adoptar as medidas correctas, dando provas de uma incompetência fora do tempo que vivemos.
A produtividade pode aumentar-se de forma indirecta e mais demoradamente através do ensino. A escola deve ensinar a trabalhar, mas, para isso era necessário que o Governo e o ministro da Educação deitassem mãos aos programas e, deixando de lado as estatísticas, procurassem a excelência do ensino. A disciplina social na escola é uma via de aumento de produtividade… Tão simples! Mas os professores não sabem isso e os alunos não adivinham e, menos ainda, tal ideia passa pela cabeça dos nossos governantes. Depois, na escola há tantas vias para se aprender e ensinar a aumentar a produtividade! Tudo pode ser feito se se ensinar os alunos a investigar! Não se trata de copiar da Internet, mas sim investigar de modo a gerar a corrente inventiva e dedutiva que promove a modernidade através de ideias novas. Mas os professores não sabem – nas universidades não os ensinaram – e os governantes desconhecem essas vias. Melhorar a produtividade pode passar por ensinar um conjunto de matérias essencialmente viradas para a actividade prática, coisa que os nossos professores também, na grande maioria, não sabem fazer por causa do ensino demasiado clássico que tiveram nas universidades e os nossos governantes desconhecem em consequência de formas anormais de exercício da paraplegia mental.
Aumentar o tempo de trabalho em meia hora diária é, na perspectiva marxista, entregar ao patronato mais-valia (aquela parte do trabalho que o trabalhador não recebe por constituir o lucro do capitalista, ou seja, a parcela que qualquer trabalhador dá ao patrão para poder receber uma parte do verdadeiro pagamento daquilo que efectivamente faz nas horas de trabalho). É aumentar, por via administrativa, arbitrária e impositiva, o lucro do patronato, o mesmo é dizer, do capitalista, seja ele pequeno ou grande.
Depois, olhando na perspectiva capitalista para a medida, corresponde a aumentar os gastos fixos da empresa – particularmente se ela não for fabril – porque não é por estar mais tempo no local de trabalho que o trabalhador administrativo (tomada a palavra no seu sentido mais lato) mais produz. Pelo contrário; consome mais energia, mais material e não traz à entidade patronal mais produtividade. Isto aprende-se nos cursos de Gestão de Recursos Humanos, que os nossos governantes não frequentaram! Aprende-se que o período de trabalho administrativo só é rentável (nos casos mais bem sucedidos de notável organização) até 45% do tempo de presença do trabalhador no local de trabalho; o resto é desperdício que se escoa desde o tempo de fumar o cigarro, até ao de tomar o café, passando por todo aquele que se está ao telefone, ao telemóvel ou simplesmente a olhar para as moscas! Mas isto não sabe o Dr. Passos Coelho nem os seus assessores mais directos. Mas isto não sabe o senhor ministro do Trabalho nem os seus assessores mais directos. Não sabem porque desconhecem o que se passa ao nível da aprendizagem da Organização & Métodos do Trabalho Administrativo! Não sabem porque não desconhecem o que se passa ao nível da Organização & Métodos do Trabalho Fabril.
É uma tristeza que assim seja, porque o Governo Passos Coelho vai hoje dar mundialmente mais uma prova da ignorância em que está mergulhado.
Deus – se O há – que nos proteja da ignorância, porque ela é muito atrevida! Ou, dizendo de uma maneira mais popular e brejeira, “estamos feitos” com estes tipos!