Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

29.01.08

Políticos corruptos, em Portugal?


Luís Alves de Fraga

 
Corrupção é coisa que não existe em Portugal! Isto, toda a gente sabe! Aliás, todos nós nunca convivemos com corrupção! Nem com ilegalidades! E o mal é este de sermos completamente virgens e, consequentemente, inocentes, em tais matérias.
 
Vou dar-me como exemplo. Filho de uma família da pequena burguesia urbana de Lisboa, nascido durante os anos difíceis da 2.ª Guerra Mundial, convivi, ainda criança, com as célebres senhas de racionamento e as infindáveis bichas, ou como agora se diz, fugindo ao brejeiro brasileirismo, filas do peixe e de outros géneros com que a minha Mãe tinha de alimentar a família. Claro que nessa época de falta e consumo controlado nunca houve falcatruas, nunca houve padeiro que fizesse misturas ilícitas na farinha, nem distribuidor de leite que tivesse urinado no dito para acrescentar mais um litro ao precioso líquido necessário ao alimento das crianças! Não, porque em Portugal sempre imperou a honestidade! Claro que não houve armazenistas que praticassem o açambarcamento para depois venderem mais caro o que haviam comprado a preço de dez réis o mel coado! Claro que nunca houve fortunas feitas de um dia para o outro e que ninguém sabe explicar! Claro que muitos homens da minha idade que usufruíram de uma excelente vida, quando os pais haviam nascidos tão pobres como Job, não fazem ideia nenhuma do que tenha sido corrupção e desonestidade! Foram milagres! Foram outras tantas Senhoras de Fátima que apareceram a uns pobres pastores conferindo-lhes poderes mágicos para ficarem ricos como Ali-Babá! Porque corrupção nunca houve em Portugal!
 
Senhores chega de ironia!
Eu cresci os meus primeiros anos a conviver com corrupção e com corruptos! Digo-o sem qualquer tipo de receio.
Quando ia, diariamente, às compras com a minha Mãe bem ouvia ela dizer ao talhante lá do bairro: — Senhor António, um quilograma de bifes, mas dos especiais — e lá ia o senhor António à câmara frigorífica especial tirar um bom naco de carne tenrinha e cortar os desejados bifes. Bifes que eram vendidos acima do preço tabelado, claro está! A minha saudosa Mãe, na ânsia de pôr na mesa o melhor, de alimentar a família com carne, peixe, manteiga, chouriço e outros artigos de qualidade extra, alimentava, também, contra-vontade, a corrupção dos pequenos comerciantes que, entretanto, já tinham vivendas nos arredores de Lisboa.
Foi com esta corrupção que eu cresci.
Com ela cresceram todos os jovens da minha geração e das gerações mais próximas. Habituámo-nos a ver pactuar com a falcatrua. Mais. Habituámo-nos a fazer parte da falcatrua. Mas, estávamos, vão-me dizer, em ditadura! Uma vez mais, tenho de dizer: claro! Estávamos em ditadura e se não houvesse esta cedência perante a corrupção iríamos comer os bifes mais duros que houvesse nos talhos de Lisboa, nos talhos de Portugal! Iríamos, nós a gente da chamada classe média remediada ou abastada, porque os pobres nem bife tinham para comer…
 
O medo da denúncia política cresci eu com ele, convivi com ele. Todavia, tive, também, sempre medo das consequências da denúncia da corrupção, por causa das consequências… Depois não havia à mesa aquelas coisas boas de que eu tanto gostava!
Foi este sentimento que moldou gerações e gerações de Portugueses e possibilitou que nuns se fosse implantando a cumplicidade do silêncio e noutros a certeza da impunidade.
 
Quando um afoito bastonário da Ordem dos Advogados vem dizer «existe em Portugal uma criminalidade muito importante, do mais nocivo para o Estado e para a sociedade, e que andam por aí impunemente alguns a exibir os benefícios e os lucros dessa criminalidade e não há mecanismos para lhes tocar. Alguns até ostensivamente ocupam cargos relevantes no Estado português» há cadeiras que estremecem como resultado do tremor que se apoderou de quem nelas está sentado. António Marinho Pinto não tem medo de comer bifes duros ou, até, de não comer bifes! Mas o tremor de quem treme não resulta do medo… provém da raiva. Raiva, porque alguém com responsabilidades na sociedade civil ousou fazer uma acusação que muitos fazem sem terem a audição do bastonário.
O impoluto engenheiro Cravinho já havia sugerido, em tempos, a aprovação de uma lei contra a corrupção… Despacharam-no para bem longe! Igual sorte teve Ferro Rodrigues. Será que vão mandar Marinho Pinto para outro lugar que não aquele que os seus pares lhe atribuíram?
 
O bastonário, face aos níveis de corrupção que todos os dias se verificam no nosso país, tinha de começar por algum lado e começou por atacar o Governo, pois dele dimana o exemplo — o mau e o bom. Agora, clama-se que Marinho Pinto tem de fazer prova, denunciando. Ora essa! A prova de inocência tem de ser feita pelo acusado; por todos quantos, como há sessenta anos ocorreu, de um dia para o outro, deram sinais exteriores de riqueza! Cabe ao Estado identificar esses sinais e, se o Estado nada receia, porque nada receiam os seus agentes, deve pedir as explicações que entender.
 
Claro que Marinho Pinto sabe, tão bem como eu sei, que as suas palavras só vão servir para ocuparem um parágrafo — pequeno — na História da actualidade, porque Portugal, todo o Portugal, todos nós, é uma Nação de corruptos. Corruptos, porque colaboramos passivamente com a corrupção ou porque somos agentes activos da mesma. Cada um que escolha o lugar que mais lhe convém!
Eu, tal como o bastonário da Ordem dos Advogados, já optei: acuso. O leitor fará como melhor lhe convier.

21 comentários

Comentar post

Pág. 1/2