Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

30.06.23

A educação dos educadores


Luís Alves de Fraga

 

Deparei-me hoje com a notícia de que a Polícia de Segurança Pública (PSP) vai aumentar a segurança do ministro da Educação por este ter sido alvo de ameaças e ataques à sua viatura com ele lá dentro. Numa atitude, naturalmente pensada e ponderada, desvaloriza o assunto, atribuindo-o à rivalidade entre sindicatos de professores.

Pessoalmente estou em sintonia com os professores, até porque tenho alguns na minha família chegada e sei o empenho que têm de ter para exercer com correcção o trabalho de educadores. Mas não posso concordar com manifestações públicas ou privadas de violência contra o ministro ou qualquer membro do Governo seja qual for a razão reivindicativa. Tais acções são próprias de quem não entende o que é a democracia nem o modo como ela se conduz, ficando muito próximas das que são usuais na extrema-direita ou fascista.

 

Quando na Europa há uma clara tendência para apoiar grupos políticos de extrema-direita (veja-se aqui ao lado, na Espanha, o que já está a acontecer em certas comunidades dominadas pelo Vox) eu recordo o horror do nazismo, do fascismo italiano e do franquismo. Todos eles começaram por exaltar a violência, tendo como principal alvo a prova de que a democracia não oferecia a tranquilidade necessária ao crescimento e estabilidade das nações.

Quando a democracia aceita no seu seio os movimentos que atentam contra ela o único meio a contrapor é o da força contra aqueles que, pela desordem, querem o fim das liberdades. Por isso, os professores activistas e propugnadores de meios violentos para alcançarem os seus direitos devem rever as suas atitudes e os seus métodos sob pena de estarem a contribuir para o mal-estar nacional e para viabilizar medidas que não são as mais apropriadas para a vivência em democracia.

29.06.23

A situação russa e ucraniana


Luís Alves de Fraga

 

Não tenho a menor dúvida de que, no Ocidente, se está a preparar o clima necessário para encontrar uma solução rápida para o conflito no Leste europeu. Qualquer coisa que ponha um ponto final na guerra russo-ucraniana. Todos os indícios estratégicos vão nesse sentido. Vamos ver se tenho alguma ponta de razão.

 

A fissura ideológico-militar que teve lugar no passado fim de semana nas fileiras russas dão-nos a indicação de que existem divisões significativas entre os altos comandos em Moscovo; haverá quem queira endurecer o empenhamento na guerra e quem a veja como um erro estratégico tremendo (reprovável na medida em que veio colocar a nu as incapacidades militares da Rússia, empurrando-a para a situação de potência regional, ficando atrás da China). Do ponto de vista de alguns generais russos, se calhar, é preferível uma negociação rápida com a Ucrânia, mantendo as conquistas alcançadas do que sucessivas pequenas derrotas no terreno, as quais somadas vão representar um pesadíssimo desperdício de vidas a par de um insucesso militar altamente explorado pela propaganda ocidental.

Ao contrário do que ainda ocupa os órgãos de comunicação social, pouco me interessa o que vai acontecer na Rússia quanto à tentativa golpista de sábado passado. Putin tem a inteligência e a prática suficientes para saber como deve lidar com este assunto sem perder a popularidade para se manter no poder. É preciso que não confundamos os nossos desejos com a realidade a desenrolar-se no Kremlin.

 

Por outro lado, olhemos para a Ucrânia.

A “grande” ofensiva que iria pôr os russos em debandada está a resumir-se a algumas centenas de metros de terreno conquistadas ao inimigo. Ontem na CNN Portugal (e note-se que foi nesta estação e não numa outra!), ao fim da noite, foi explicado muito claramente como está organizada a linha de defesa russa no Donbass e quais as dificuldades que os ucranianos têm de vencer para chegar ao contacto directo com o inimigo. Disse o major-general Agostinho Costa que, a este ritmo, a Ucrânia precisará de dezasseis anos para conquistar todo o território ocupado pelos russos.

 

Na minha opinião, como disse inicialmente, está a ocorrer uma suave reviravolta nos noticiários, embora se continue a exaltar os massacres de populações civis sujeitas aos mísseis russos, de modo a criar o clima que leva o Ocidente a aceitar a paz que se tem de impor a Kiev e que Moscovo deseja (até já o nosso ministro dos Negócios Estrangeiros afirmou, em entrevista à Rádio Renascença, que “talvez” lá para 2024 se veja o fim do conflito).

Esta manobra comunicacional resulta de, por um lado, os EUA terem apoiado e empurrado a Ucrânia para uma guerra que Moscovo não evitou, pois corria o risco de ver aumentar a proximidade das ameaças da OTAN. Assim, cabe a Washington “arranjar a saída” para descalçar esta bota. A grande estupidez foi a Europa e, em particular a União Europeia, ter alinhado, sem reticências, com os EUA, mas disso já tratei no meu recente livro «Ucrânia, uma guerra de embustes» (Colibri).

 

O que realmente lastimo, nas nossas televisões, é a escolha de comentadores civis, usualmente gente que se julga especialista em relações internacionais, que, sem qualquer tipo de informação credível, lançam para o ar opiniões desconchavadas, levando quem sabe um pouco desta matéria a rir-se de tanta falta de respeito pelos telespectadores.

24.06.23

A rebelião


Luís Alves de Fraga

 

Os últimos acontecimentos na Rússia levaram-me a passar o dia em frente da televisão à espera de alguma novidade. Para além do avanço de Prigozhin largas centenas de quilómetros em solo russo, nada de concreto se passou até ao momento em que, a quatrocentos quilómetros de Moscovo, por intervenção do presidente da Bielorrússia, a coluna Wagner parou e, segundo parece, vai regressar aos seus acampamentos.

 

Ouvi teses, palpites e hipóteses o mais complexas que se possa imaginar. Claro que a de uma intervenção estrangeira junto do patrão da empresa Wagner também foi atirada para o ar, mas rapidamente desapareceu. Porquê? Porque Prigozhin faz parte do grupo mais nacionalista russo e é amigo pessoal de Putin. É possível que eu me tenha enganado, embora a traição seja uma realidade a admitir, especialmente se o traidor verificar, no terreno, que o exército russo é incapaz de levar por diante uma campanha. Então, por nacionalismo, é preferível parar uma guerra do que mantê-la até à prova real da ineficácia do agressor.

Mas, a mais rebuscada das hipóteses que ouvi, foi a de um historiador (será defeito de quem faz História?) quando admitiu haver um entendimento entre Putin e Prigozhin que desse ao primeiro a possibilidade de afastar todo o seu estado-maior, atirando para cima dele a responsabilidade de uma campanha falhada, dando-lhe assim, ao mesmo tempo, o meio de, salvando a face, poder iniciar negociações de paz com a Ucrânia.

 

Como estamos no plano da mera especulação teórica, tudo é aceitável, desde que assuma algum aspecto verosímil.

Os próximos dias vão ser de expectativa, pois tudo se explicará em função do desenrolar dos acontecimentos na Rússia. Contudo, uma coisa é certa: nestas quase vinte e quatro horas Putin foi o alvo mais evidente de uma rebelião sem precedentes no decurso de uma campanha militar. Veremos se o acto seguinte não passa por um golpe palaciano em Moscovo.

24.06.23

Guerras perdidas


Luís Alves de Fraga

 

Um submarino de pequenas dimensões ia visitar os destroços do Titanic, depositados no fundo do mar a três mil e oitocentos metros de profundidade. Era uma “guerra” contra as leis da física. Poderá já ter sido ganha algumas vezes, mas, tal como o cântaro, tantas travou combate que, desta, ficou lá. E morreram cinco pessoas.

A atenção dos órgãos de comunicação social esteve focada neste acontecimento durante vários dias. O mundo inteiro (com exclusão dos excluídos do mundo televisivo) soube tudo o que se refere a submarinos e pressão subaquática.

Cabe perguntar, qual a razão de tanto interesse e tanto tempo gasto em noticiar este acidente que SÓ vitimou cinco pessoas? A fortuna dos que iam ver os restos do Titanic? A importância “científica” destes mergulhadores? O prazer mórbido de dar conta da morte de gente dita importante? É que, para mim, nada justifica a excessiva atenção dispensada a este naufrágio e a quase indiferença perante os naufrágios dos pobres emigrantes no Mediterrâneo quando demandam a chegada à Europa, para eles o paraíso na Terra.

Todos nós sabemos (alguns com plena consciência e outros não tanto) que quanto maior for a catástrofe menor o impacto social. Desde o holocausto até ao marmoto no Pacífico ou desde a explosão de um veículo aeroespacial até à implosão do submersível, a regra é sempre a mesma: mais vítimas, menos tempo perdido pela comunicação social; menos vítimas, mais tempo de antena.

O critério parece ser o do consumismo: menos produto no mercado, mais caro ele é; mais produto no mercado, mais barato ele se torna. É lamentável que a lei da oferta e da procura tenha chegado a este limite.

 

A “ofensiva” ucraniana parece ter entrado num impasse. Talvez se esteja à espera do melhor momento para atirar para a “fornalha” mais uns largos milhares de homens que podem ir esbarrar contra as posições defensivas russas… ou talvez não!

Dá-me a sensação de que o preconizado por mim há um ano e que está publicado no meu livro “Ucrânia uma guerra de embustes” se começa a esboçar: o esboroar de um dos poderes políticos em confronto.

Com efeito, a revolta do patrão dos mercenários da força Wagner contra as chefias militares russas pode levar a uma “implosão” do poder putinista e, se tal acontecer, à dos seus postos de comando. Pode acontecer uma debandada geral.

Mas, porque não acredito em bruxas (embora possam existir) a minha grande dúvida é a de saber se as razões invocadas pelo “patrão” dos mercenários são as que diz ou se são outras muito mais subtis, muito mais secretas e muito menos patrióticas. Para ser preciso deixo a pergunta: «Quantos dedos da CIA estão por trás desta reviravolta?» É que mercenários não têm pátria; movimentam-se ou por dinheiro ou poder! Assim se justifica o discurso de Putin, ameaçando de morte e acusando de traição aqueles que lutarem contra a ordem estabelecida na Rússia.

Para mim, e a acreditar que os mercenários conseguem levar por diante os seus intentos, creio que se estão a gerar as condições para entrarem em campos os diplomatas e, então, a “grande ofensiva” ucraniana poderia ter como arma secreta a revolta de Prigozhin.

 

E assim vão as “guerras” neste planeta que, sendo casa comum de todos nós, parece estar a esboroar-se.

15.06.23

As pequenas fissuras


Luís Alves de Fraga

 

Não vou ser longo para não vos cansar com a lengalenga do costume sobre esta guerra e os efeitos colaterais que já provocou e continuará a provocar.

Quando chegar ao fim o conflito bélico declarado entre a Rússia e a Ucrânia nós, na Europa e no chamado «mundo ocidental», estaremos diferentes e procuraremos soluções estratégicas diferentes. Claro que, por não ser adivinho nem me arriscar em prognósticos sem fundamentos, não sei se esta diferença será mais intensamente vivida nuns lados do que noutros. Contudo, tenho a noção de que se vão sentir alterações na política externa de todos os Estados europeus, algumas delas irreparáveis. E já começam a estar à vista.

 

Hoje, em Espanha, há sinais de desagrado. A OTAN vai fazer uma reunião com responsáveis das indústrias de guerra dos Estados integrantes, mas não convidou os das indústrias do país vizinho. Resultado: retaliação imediata da ministra da Defesa, que já declarou a sua ausência da reunião.

Isto não é nada. Mas isto indicia o que vai ser o futuro, pois da junção de pequenos problemas faz-se um grande problema e desse até ao surgimento de uma quezília entre Estados ou Estados e organizações vai um passo.

 

Não creio que em Portugal se dê grande importância a pormenores como estes, no entanto, era bom estar com um olho aberto, pois é assim que tudo pode nascer e um bom serviço de informações tem de avisar a tempo para, com tempo, se definir a forma de actuar.

https://elpais.com/internacional/2023-06-15/espana-bloquea-el-plan-industrial-de-defensa-de-la-otan-por-la-exclusion-de-sus-empresas-de-una-reunion.html?sma=newsletter_alerta20230615

09.06.23

Mais um livro


Luís Alves de Fraga
Desta vez fugi da minha especialidade em História e

SessoesAutografos2023_LAF (1).jpg

dediquei-me à minha formação em Estratégia. Estarei na Feira do Livro na tarde de 13, dia de Santo António, no pavilhão da editora Colibri, entre as 15 horas e as 16h30 para autografar os exemplares que quiserem.
Convido os meus amigos a passarem por lá, matamos saudades e podemos falar um pouco. Espero-vos.
08.06.23

A barragem


Luís Alves de Fraga

 

Ultrapassa tudo o que eu consigo aguentar, a forma tendenciosa como, entre nós e, de certa forma, na Europa ocidental, se comenta a guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Agora, o alvo da propaganda anti-Rússia, está a ser a barragem.

Ontem suportei mal as interpretações e comentários de dois convidados de um dos canais noticiosos. Vou tentar explicar o meu ponto de vista.

 

A barragem está, sem dúvida nenhuma, no lado do território já conquistado pela Rússia. Isto quer dizer que, ao longo da margem esquerda do rio, estão estacionadas tropas russas com o respectivo material de apoio e bélico e, evidentemente, populações ou simpatizantes da causa russa ou conformadas com a mudança de autoridade política.

A questão que se discutia, na televisão, era se a Rússia tinha provocado o rebentamento da barragem para obter algum tipo de ganhos tácticos. Sejamos, no mínimo perspicazes para enquadrar e dar resposta a esta questão.

Se a Rússia fosse a autora do desastre ecológico teria feito sair do terreno todas as suas forças e bem assim todo o material bélico com a antecedência necessária para os colocar o mais atrás possível numa situação defensiva. Ora, este movimento de tropas e de armamento teria sido visível aos olhos dos satélites espiões que vigiam toda a linha da frente dos invasores. Será que estou a delirar? Não. Nem pouco mais ou menos! Estou absolutamente convicto daquilo que afirmo e qualquer dos meus leitores, se quiser ser imparcial, concorda comigo, pois se há algum movimento de tropas que é mais perceptível à observação aérea é o do recuo. Para negar a lógica do que acabo de afirmar teríamos de aceitar que Moscovo se dispunha a sacrificar a vida de algumas centenas ou milhares de soldados que lhe fazem tanta falta. Isso é inimaginável dentro do quadro de contestação interna que se vive na Rússia.

 

Afastada a hipótese anterior, como se pode justificar o rebentamento da barragem? Vamos por partes.

A qual dos lados em combate interessa o que aconteceu? A resposta é uma só: a nenhuma delas. Então, como se deve explicar o sucedido? É aqui que começa a parte mais técnica.

Estando a barragem no lado ocupado pelas tropas russas é natural que as tropas ucranianas, nomeadamente a sua artilharia, tenham vindo a bombardear as zonas próximas da infraestrutura agora reduzida a escombros. E, era do conhecimento geral, a barragem já apresentava fissuras. Fixemo-nos neste pormenor.

As fissuras não foram causadas pelo rebentamento de mísseis, nem de drones suicidas, pois, ou já existiam antes da guerra ou surgiram em consequência dela. E como?

É preciso perceber que tanto drones explosivos como mísseis têm, hoje em dia, uma precisão que o erro pode ser de dez a vinte metros ou talvez menos. Contudo, a artilharia convencional, aquela que usa granadas explosivas ou perfurantes, embora a sua precisão seja hoje muito maior do que era na 2.ª Guerra Mundial, está longe da que se obtém com mísseis e drones, o mesmo é dizer que o erro ou desvio pode ir para além dos trinta, quarenta ou cinquenta metros do alvo. Pronto, chegámos ao ponto que mais interessa.

 

Quem é que bombardeia a zona próxima da barragem? Não são os russos; são os ucranianos. Então, as explosões de granadas de boa e significativa potência podem ter estado a cair nas proximidades da barragem e, assim sendo, provocaram ondas de choque capazes de fazer vibrar o material fragilizado da represa de água. E, como diz o povo, tantas vezes o cântaro vai à fonte que numa delas deixa lá a asa.

Se a explicação, tanto do professor universitário como do oficial general, tivesse sido esta as pessoas, embora não culpando os ucranianos, perceberiam que os causadores deste acidente ambiental poderiam ter sido os disparos de artilharia convencional vindos do lado de Kiev, provocando, sem intenção, o desastre que, propagandisticamente se quer atribuir às decisões de Moscovo.

É esta ausência de imparcialidade que confunde quem nada sabe de guerra, de artilharia, de explosões e de vibrações do terreno. E confundir quando se pode tentar explicar outras visões é tão criminoso como bombardear sem levar em conta as consequências daí advenientes.

05.06.23

A contra-ofensiva


Luís Alves de Fraga

 

Será que é realmente uma contra-ofensiva o que os ucranianos começaram ontem? Tecnicamente, só o seria se se tratasse da resposta a uma ofensiva russa. Assim, de facto, não é, tratando-se de uma ofensiva contra as tropas inimigas instaladas no terreno e em simples estado de alerta. Esclarecido este ponto, vamos tentar compreender o que daqui resultará.

 

Ao contrário do que o comum dos leitores imagina, esta ofensiva não vai alterar grandemente o curso da guerra, pois, por muito material bélico que a Ucrânia tenha recebido dos países da NATO e dos EUA, não reúne número suficiente de soldados para conseguir fazer recuar as tropas russas até às suas fronteiras, facto que, efectivamente, constituiria uma derrota para Moscovo.

Estou a pressentir nos mais exigentes dos meus leitores uma pergunta: então para que se leva a cabo a ofensiva? A resposta divide-se em dois grandes ramos: por um lado, para justificar a defesa do território, partindo do pessoal político que ocupa o poder na Ucrânia ou, dito de outra maneira, é a forma de justificar, perante os cidadãos ucranianos, os sacrifícios que Zelensky e a sua equipa política têm exigido à nação, ao mesmo tempo que é uma forma de se sustentarem nas cadeiras que ocupam; por outro lado, poderá ser o processo de conseguir iniciar uma negociação diplomática que resulte num cessar-fogo, num armistício ou no “congelamento” das acções militares de um lado e do outro. De qualquer forma são “jogadas” estratégicas que têm em vista a manutenção do “status quo” interno, na Ucrânia, ao mesmo tempo que os aliados de Kiev se podem desobrigar de continuar a alimentar a guerra.

 

É verdade que a Rússia não é aquele bicho-papão que, em Fevereiro de 2022, os órgãos de comunicação social do mundo ocidental nos impuseram. Nessa altura eu tive o cuidado de afirmar, ao cabo de várias semanas de conflito, que o exército russo era, afinal, um tigre de papel se excluirmos o arsenal nuclear. Está provado que eu tinha razão: Hitler (o famoso ditador com quem Putin foi comparado), num ano de guerra tinha conquistado a Polónia, a Dinamarca, a Noruega, a Bélgica, os Países Baixos, o Luxemburgo e a França, para além da ocupação de outros Estados nos Balcãs. Putin conquistou uma parte, e só uma parte, a do leste da Ucrânia, até agora!

Ora, face a esta disparidade, jamais se poderá afirmar que a Rússia pretende conquistar a Europa ocidental; ela e os seus generais querem aquilo que sempre quiseram: manter a distância suficiente entre os países integrantes da NATO e o seu território. E, ontem, num dos canais de televisão, o major-general Agostinho Costa teve de enfrentar o pivot que sistematicamente se opôs à explicação sobre a ofensiva e uma hipotética vitória sobre a Rússia. Este “incidente”, sem exaltações e com sorrisos à mistura, deu para perceber que o relevante é passar para a audiência uma ideia e uma imagem falsa ou tendenciosa sobre o que, na verdade, é importante, ou seja, aquilo que antes tentei explicar em poucas palavras. Disto nunca tive dúvidas, mas, se as tivesse, ontem desapareceriam.

 

Este apontamento serve, espero, para ajudar aos meus leitores a reflectir, mesmo que não concordem com os meus argumentos.

04.06.23

Do SIS até à asneira


Luís Alves de Fraga

 

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à TAP tem dado dos nossos deputados a pior das imagens que se possa desejar para um Estado democrático e de direito. Aquilo parece mais um pátio alfacinha dos primeiros anos do século XX do que um lugar onde a decência e o bom senso deviam imperar. Ali é um lavar de roupa suja, procurando cada partido ser mais contundente e badalhoco do que o anterior. Por lá não se quer apurar verdade nenhuma, pelo contrário, quer-se enlamear o Governo de modo a preparar a opinião pública para um “acontecimento decisivo nacional” que faça saltar de S. Bento António Costa (a minha simpatia em relação ao homem é reduzida) e o Partido Socialista.

Mas se o lavar de roupa suja naquele pátio alfacinha já vai na roupa íntima o certo é que ao meter o Serviço de Informações de Segurança (SIS) ao barulho ultrapassa tudo o que manda o recato de um Estado que se quer digno e respeitado no concerto dos Estados do mundo.

 

O SIS não é uma polícia no sentido clássico do termo; é um serviço que nos garante a segurança interna contra todas as ameaças que nos possam fazer correr riscos colectivos. O SIS não prende, não tortura, não inibe a liberdade; o SIS acompanha a vida nacional em combinação com serviços similares estrangeiros para avaliar quem, onde e quando pode gerar uma ameaça à normalidade do nosso quotidiano. As informações que colhe nem sempre serão utilizadas ou divulgadas às entidades policiais ou judiciárias, porque não contêm matéria capaz de indiciar um ilícito criminal. Os seus agentes trabalham na sombra sem necessidade de publicidade. Aliás, esta constitui a maior e pior ameaça para o bom êxito daqueles serviços, daí que seja vergonhoso o espectáculo que os nossos (?) deputados estão a dar perante o mundo.

Claro que os órgãos de comunicação social acabam prestando um péssimo serviço a todos nós, dando cobertura à banalização da acção do SIS: o que está em causa é a boa ou má gestão da TAP e dos representantes do Governo nela acrescida da irresponsabilidade ou/e da falta de orientação governamental. É isto que tem de ser averiguado e não a razão de o SIS ter tido algum papel na apreensão do computador do assessor do ministro.

 

Ontem, num dos canais de televisão, foi entrevistado o engenheiro Ângelo Correia. Por norma, estou quase sempre em desacordo com o que diz. Desta feita ele disse o que acabo de dizer e mais aquilo que tenho andado a repetir quanto ao assunto TAP.

01.06.23

Estratégia, subordinação ou falta de visão?


Luís Alves de Fraga

 

Há coisa de um ou dois dias vi e ouvi na televisão a presidente da comissão europeia, Ursula von der Leyen, declarar uma total fidelidade da UE à causa bélica da Ucrânia, juntando os destinos de ambas. Fiquei siderado. Explico a razão.

 

Em primeiro lugar a comissão europeia, sem mais nem menos, sem uma consulta aos cidadãos da União, arrasta-nos a todos para o “barco” que os eurocratas de Bruxelas entendem que deve ser o nosso; depois, ao adoptar este posicionamento, está, implicitamente, a colocar os Estados integrantes da UE na posição de subalternos da política e da estratégia global dos EUA; finalmente, demonstra uma total incapacidade de delinear uma estratégia para colocar a Europa ocidental numa posição de equilíbrio entre as forças e as linhas estratégicas que se vão definir no futuro próximo, quando o conflito militar entre a Rússia e a Ucrânia ficar congelado ou se resolver, pois, uma coisa vai ser certa: nunca mais o relacionamento entre o ocidente e o oriente será igual ao que era antes de Fevereiro de 2022.

Realmente, os EUA estão a reerguer a cortina de ferro que levou à Guerra Fria, embora, de momento, as fronteiras dessa cortina passem já pela China, e, provavelmente, pelas da União Indiana, porque, se está a definir um outro bloco com características neutralistas, semelhante ao que Sukarno alimentou em 1955, embora adaptado e integrado a um outro tempo histórico que é o do presente e do futuro que se adivinha.

 

Ursula e os seus conselheiros não percebem ou não querem ou não podem perceber que a pobreza estrutural da Europa não tem de ser alimentada com as migalhas do imperialismo americano, mas, para sobreviver, tem de voltar a estar ao lado dos Estados que, noutros tempos, a alimentaram quando eram suas colónias. Todavia, ao contrário de então, agora e amanhã, seguindo uma política de cooperação. Esse era, tem de ser, o caminho da UE e o da Grã-Bretanha. Claro que esta última, porque há muito tempo está rendida a Washington, sentirá dificuldade em cortar essa amarra. E eu percebo a razão: trata-se de não perder um prestígio que já não existe desde o fim da 2.ª Guerra Mundial. A Carta do Atlântico acorrentou os destinos de Londres, através da abdicação de Churchill perante Roosevelt, aos EUA: foi a velha raposa política londrina a dizer ao anafado hóspede da Casa Branca: «poderemos ser grandes, se ambos formos grandes». Foi um jogo de ilusionismo.

 

As vantagens de uma neutralidade da Europa perante uma nova ordem estratégica decorrem de poder ter o melhor de dois mundos, minimizando aquilo que pode ser o pior de ambos. Isto, se não tomarmos em linha de conta um outro aspecto que ainda pesa nos nossos dias: a cultura dominante.

Com efeito, por muito que o mundo se tenha “americanizado” o substrato cultural continua a ser de natureza europeia; a Europa ainda tem encantos, história e peso intelectual não só nos EUA como também por quase todos os continentes, embora para lá do Médio Oriente, comecem a impor-se as culturas dos povos dessas regiões que, nos momentos decisivos da vida internacional, optam por tentar uma conciliação entre o que é oriental e o que é ocidental. Tal atitude mostra ainda o “valor” da cultura europeia. Vemos, por conseguinte, que uma opção clara e definitiva pela “ocidentalização americana” contribuirá para o desaparecimento dos resquícios da Europa no mundo, quando este século estiver a chegar ao seu termo. É isto que desejamos para os nossos netos e bisnetos?