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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

29.04.23

Francisco


Luís Alves de Fraga

 

Era o nome do meu avô materno, daquele que mais fortemente me influenciou no meu sonho de menino: ser militar. Curiosamente, como todos os Franciscos era conhecido em família pelo Chico.

Há dias vi um outro Chico, o Buarque de Hollanda, receber o diploma do prémio Camões e escutei com atenção os discursos do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa (naturalmente, escrito por ele), o de Lula da Silva e o do homenageado.

 

Se o discurso de Marcelo Rebelo de Sousa foi o de um professor habituado a ler, a devorar livros, o discurso de Chico Buarque de Hollanda foi o do sentimento, o dos sentimentos; nele misturam-se as recordações do pai, o grande mestre, as lembranças de todas as miscigenações que estão na sua ascendência, o atrevimento do menino que quer cantar canções populares, compondo-as, as do romancista e, até, a da atenção da gravata comprada hoje de manhã pela mulher.

Foi aqui que eu percebi, na comoção da compra de uma gravata pela mulher, Carol, que aquele compositor e poeta, que nos endereçou um poema/canção tão lindo/a, sabendo da nossa “festa, pá”, e falando do “tanto mar” que, então, nos separava, porque nós estávamos em liberdade e lá não, sem hábitos de gravatas tinha sido autêntico na sua alegria com o pedido de um pouco de cheiro de alecrim.

Meu Deus, e tudo isto foi há tanto tempo e estamos todos tão mais velhos! Contudo, quando fecho os olhos, ainda me sinto nesse dia glorioso e sinto a nossa juventude e os primeiros vagidos da liberdade que nascia. Mesmo em Moçambique, lá longe, onde estava em comissão militar, sem a agitação da capital do “império”, foi inesquecível a efusão vivida na Rádio do Aeroclube da Beira, no quartel do Batalhão de Pára-quedistas, entre os capitães operacionais que tinham sido meus companheiros na Academia Militar.

Mais tarde, muito tempo mais tarde, surge o Chico Buarque com a sua canção “tanto mar” e gostei de o ver ‒ mais velho‒, há dias, na televisão, a receber o diploma do prémio mais alto da literatura em língua portuguesa.

https://www.youtube.com/watch?v=OPRamfFppZ0

20.04.23

Abril, águas mil


Luís Alves de Fraga

 

O nosso povo, certamente devido à sua ignorância literária e à falta de estudo noutros tempos, foi acumulando conhecimentos com a Natureza e soube sobreviver deste modo, passando de pais a filhos provérbios, resumindo modos de fazer, proceder, actuar e, assim, durante centenas de anos tínhamos a certeza de que chegado Abril, havia de chover o necessário para a terra dar os frutos precisos para a sobrevivência da população.

Estamos em Abril e notícia de chuva é coisa que por cá e na Espanha não existe… só talvez na Galiza e um orvalho nocturno no Minho. São as mudanças climatéricas, dizem os muito entendidos em meteorologia, ciência que, até à chegada da era dos satélites artificiais, estava muito próxima da adivinhação graças à probabilística. Que gozo se fazia com o oficial chefe do serviço meteorológico, no ano de 1966, quando o transporte de oficiais da Base Aérea n.º 2, situada na Ota, chegava à portagem da mini autoestrada de Vila Franca e os bilhetes comprados e deitados imediatamente fora, se juntavam ora num ora no outro dos dois cantos da edificação de cobrança!

‒ É pá, hoje o vento está de sul! Vai chover?

E ele, com grande poder de encaixe, sorria e dava uma resposta só para não ficar calado.

 

Há quarenta anos explicavam-se as alterações climáticas com base no uso de aerossóis que destruíam a camada de ozono, fazendo-lhe um buraco por sobre os pólos Norte e Sul,. Não se falava ainda (pelo menos nos meios públicos e entre gente pouco esclarecida) no efeito de estufa resultante do aquecimento global do planeta. Só mais tarde a combustão de matérias fósseis e de outros elementos provocadores de poluição começou a ser a culpada das chuvas ácidas e das mudanças climáticas e do degelo das calotes polares.

À volta desta temática, as contradições são mais do que muitas: o tráfego aéreo, tão poluidor como qualquer locomotiva a carvão, continua a aumentar sem preocupação no mundo inteiro; o mesmo acontece com os navios de toda a espécie que navegam nos oceanos e mares interiores, contudo, a grande preocupação centra-se nos veículos automóveis, nos comboios e nas fábricas que usam como combustível o carvão ou produtos resultantes do petróleo.

Não tenho conhecimento de que alguém ande a estudar a simples, mas ao mesmo tempo complexa, hipótese de o eixo da Terra se estar a deslocar! E bastam uns milímetros em cada ano para ser suficiente a alteração climática e os degelos. Só que, a ser assim, a Terra tal qual a conhecemos pode ser diferente, muito diferente, daqui a cinquenta ou cem anos, basta pensar que já houve mar onde hoje é terra firme e vice-versa.

Poder-se-á perguntar, sendo como deixo sugerido, qual a razão para se não publicitar e a resposta só pode ter uma: os efeitos económicos globais como reagiriam?

Por enquanto, não vale a pena preocuparmo-nos a não ser com os protectores solares, as galochas e as salamandras para aquecer as nossas habitações quando fizer muito frio.

17.04.23

Lusodescendente e Lula da Silva


Luís Alves de Fraga

 

Foi um alarido imenso nas nossas televisões o facto de um jovem americano, ao que parece com ascendência portuguesa, ter tido acesso a documentos secretos e super-secretos do Pentágono. “Digam o que disserem, mesmo que digam mal, falem de mim; isso é que importa”, parece ser a frase ideal dos órgãos de comunicação nacionais, porque a ordem intrínseca da prioridade da notícia, entre nós, foi invertida, pois, importante era a divulgação dos documentos e, só depois, a ascendência do seu autor. Cá, rejubilava-se por causa do jovem militar da Guarda Nacional dos EUA ter tido como avô um português e, chegou-se ao cúmulo de discutir se esse sujeito, esse Teixeira, nasceu na Beira Alta ou nos Açores!

Isto é ridículo e, pior ainda, acaba por ser triste, pois deixa completamente à mostra a escala de relevância que as nossas televisões dão àquilo que devia ser notícia, revelando que, afinal, a inversão de valores pouco interessa, pois, o que se discute é a audiência captada, mesmo que se nivele toda ela pela medida mais pequena que possa haver.

Os comentadores, alguns, tentaram remediar as asneiras nascidas nas redacções noticiosas, chamando a atenção para o facto de um militar de baixa graduação ter possibilidades de aceder a documentos com altíssima classificação de segurança. Isso é que é importante, na medida em que põe a claro que a “blindagem” do segredo, no seio do Pentágono, ou não é assim tão estanque como se pensa ou a selecção de quem trabalha com material classificado não é devidamente bem feita. E, deste modo, temos, realmente, notícia, já que nos deixa a pensar se, até, não haverá aqui uma armadilha bem montada para que a informação possa “voar” através da inocência e gabarolice de um jovem insonte, que pagará com a prisão o “golpe” que os generais e a CIA quiseram pôr de pé para dizerem o que não pode ou não deve ser dito pelas autoridades norte-americanas.

 

Na mesma linha, esquecendo Bolsonaro (ou talvez não) as nossas televisões puseram em destaque “negativo” a visita de Lula da Silva à China e nem deram o devido destaque do que ele disse ou criticou sobre o actual estado de vida nas Nações Unidas.

Lula afirmou que a ONU está longe de defender a finalidade para que foi criada: evitar as guerras e encontrar soluções diplomáticas para os conflitos de interesses que possam ocorrer no mundo. E ele tem, afinal, toda a razão: as Nações Unidas foram boicotadas pelos EUA que têm vindo, paulatinamente, a estender o seu império a todos os Estados da Terra, com exclusão daqueles que procuram fugir, através do aumento da capacidade militar, a esse “abraço”.

Lula da Silva discorda do império do dólar e da necessidade de todo o comércio internacional ser feito em dólares desde que os EUA decidiram acabar com o padrão ouro para dar cobertura às moedas nacionais.

No final das contas, Lula só quer aquilo que todos os Estados, com grandes capacidades ou potencialidades comerciais e produtivas, desejam: consolidar-se através das suas moedas nacionais. Quando o Iraque disse que ia passar a comerciar petróleo em euros… foi militarmente invadido pelos exércitos dos EUA e hoje é uma das várias regiões instáveis da Terra.

 

Espero que nós e os nossos órgãos de comunicação social saibamos receber Lula da Silva sem ressabiamentos idiotas, porque o mais importante é a nossa economia e o mercado brasileiro ainda pode ser um dos que vale a pena conservar para venda daqueles produtos que por lá tanto apreciam.

07.04.23

E o mundo já está diferente


Luís Alves de Fraga

 

Se procurarmos saber o número de conflitos militares que, neste momento, estão a acontecer em toda a Terra, ficamos abismados pois só nos damos conta de dois ou três, sendo que para nós (aqui em Portugal e na Europa e talvez nos EUA e no Canadá) o mais destacado é a guerra entra a Rússia e a Ucrânia; o resto passa-nos ao lado.

Este fenómeno ocorre por uma razão muito simples: olhamos para o mundo com os olhos do eurocentrismo ou, se quisermos ser mais rigorosos, com os do “ocidentalismo”, o mesmo é dizer, segundo aquilo que nos fomos habituando a chamar “ocidente” ou “otanismo” (palavra que acabo de inventar para dizer que devemos à OTAN ou NATO, à sua propaganda e à sua forma de conduzir a estratégia global desde 1948). Nós, aqui na Europa Ocidental e as elites intelectuais nos EUA e no Canadá, fomos moldando a nossa forma de olhar a estratégia de segurança e defesa das nossas nações e Estados segundo os “receios” gerados, na sequência da 2.ª Guerra Mundial, por Washington e Londres numa articulação de medo do que poderia advir da vontade despótica de Estaline e da URSS, nascendo assim a Guerra Fria, que deu oportunidade a Washington e ao Pentágono de se assumirem como os orientadores da paz e da segurança no mundo, enquanto a URSS e os EUA semeavam “guerras quentes” na periferia deste centro que, geograficamente, se delimitava, a Ocidente, pelo território americano e, a Oriente, pelas fronteiras da Eurásia, sem incluir a China que, em todos os sentidos, ainda estava à procura do seu lugar no mundo.

 

A queda do muro de Berlim e a implosão da URSS modificaram completamente o quadro estratégico anterior, porque o medo da expansão do comunismo quase desapareceu (restavam pequenos focos numa China que ainda não imperava no Oriente, em Cuba e pouco mais). A propaganda, sobre a qual se montara o medo da URSS, ao desaparecer deixou mais à vista que as razões estratégicas da OTAN não tinham fundamento no que se dizia, mas sim nas velhas teses geoestratégicas que sempre opuseram o chamado poder marítimo ao poder terrestre devidas a teóricos que antecederam a revolução russa de 1917 ou com ela chegaram a conviver. Deste modo, a potência marítima ‒ indiscutivelmente os EUA ‒ mantiveram, como inimigo potencial, já não a URSS, que não existia, mas a Federação Russa, grande potência terrestre e rival como potência estratégica, também, por ser a herdeira natural do arsenal nuclear daquela.

Esta foi a motivação que terá levado o Pentágono e os seus generais, a aconselharem a Casa Branca a, tão rápido quanto possível, atraírem para o seio da OTAN os antigos Estados satélites da URSS, reduzindo o espaço entre a “barbacã” e as “muralhas do castelo russo”, cuja torre de menagem se situa em Moscovo, no Kremlin (estou a falar segundo uma linguagem de defesa medieval). Ficou de fora a Ucrânia por causa da sua instabilidade política e proximidade cultural à Rússia, contudo, Moscovo reivindicou para si a península da Crimeia, pois, estrategicamente, lhe era fundamental para exercer algum comandamento sobre o Mar Negro a partir de Sebastopol, sua grande base naval.

Ora, este cerco, que se iniciou logo a seguir à implosão da URSS, atingiu o seu máximo quando a Ucrânia manifestou o desejo de entrar na OTAN, facto que, do ponto de vista russo, representava já um avanço muito para além da “barbacã”, ficando o potencial inimigo mesmo junto à “muralha” do “castelo” russo, o que era de todo inaceitável para o Kremlin. A invasão subsequente da Ucrânia, além de preventiva, foi uma resposta ao Pentágono. Todavia, neste ano que decorreu, face à estratégia continuada da Casa Branca e da Europa, principalmente, através da aplicação de sanções, levou Moscovo a mudar radicalmente a sua própria estratégia ao nível global e, aquilo que não se ouviu nos primeiros meses de guerra, é agora explanado por estrategistas e comentadores bem informados intelectualmente neutros: o mundo, depois desta guerra, vai ficar diferente nas suas divisões de forças e de importâncias económicas, pois dividir-se-á em duas ou três grandes áreas de influência estratégica, ficando, talvez, obsoletas as velhas teses geoestratégicas que regeram o pensamento ocidental nos séculos XIX, XX e começo do actual. A explicação é simples.

 

O chamado Ocidente desfaz-se para dar origem a um bloco europeu, mais frágil e dependente, mas  mais autónomo dos EUA, estes perderão o estatuto mantido até agora de primeira potência mundial para serem a segunda, porque a primeira vai ser asiática/sulista, pois juntará a Rússia, a China, a Índia, a Coreia do Norte, a África do Sul e outros Estados sul-africanos e, se calhar, o Brasil que está à espera do momento próprio para se tornar um potência do circulo das de primeira grandeza.

Nesta nova organização, perderão os EUA e a Europa e ganharão a Rússia, a China e a Índia, levando por arrasto países africanos e asiáticos. A política económica e de defesa dos EUA terá de voltar-se para o Pacífico, relegando o Atlântico para um plano secundário. A Europa terá de se redefinir nas suas vocações e relacionamentos internacionais. O fim da Ucrânia vai arrastar ao fim de uma antiga ordem mundial para gerar uma nova delineada, segundo os traços que admiti anteriormente. Os planisférios vão passar a desenhar-se, tendo a Rússia e a China no centro e o Oriente será o continente Americano e o Ocidente a Europa e o Atlântico. Deixemos passar uma década, talvez duas.

02.04.23

Da Habitação à Entrevista


Luís Alves de Fraga

 

Foi já há vários dias que António Costa deu uma entrevista à SIC sobre a questão da habitação e dos planos que estão associados ao projecto, que primeiro lançou para auscultar a opinião pública e que, depois de devidamente rectificado, avança, agora, para o Parlamento.

Creio que já se disse tudo sobre o assunto, mas, talvez seja ou inocência ou sonho meu, falta acrescentar o mais importante deste projecto: a sua finalidade estratégica no plano político nacional. É para esse ponto que vou chamar a vossa atenção, repito, talvez ingénua ou onírica.

 

Diz-se que a questão habitacional é um problema nacional. Não é! Trata-se, mais do que tudo, de algo que se fica pelos aglomerados urbanos, em especial os de grandes dimensões geográficas, podendo estender-se, em casos mais raros, aos de pequeno tamanho. E não é nacional, porque, como Costa mostrou no mapa, que tirou do bolso, é mais do litoral do que interior.

Se tomarmos em boa conta o que acabei de escrever, não compete ao Governo resolver regionalismos, pois, para aquele devem ficar os de âmbito nacional. António Costa e a sua equipa de ministros e de secretários de Estado, com consciência ou não, lançaram um projecto de medida política estrutural mais profundo do que parece. Vamos ver.

 

Passando para as câmaras municipais muitas das atribuições que vão resolver o problema da habitação, o Governo está a descentralizar aquilo que, até agora e desde sempre, esteve nos lombos do Executivo ou seja, como se dizia nos séculos XIX e XX, na área do Terreiro do Paço. O que cabe, por agora, ao Ministério da Habitação é gerir fundos financeiros, disponibilizar para habitação imóveis que são propriedade do Estado e estão devolutos, articular o trabalho dos municípios e pouco mais; o resto que se entendam com as câmaras municipais, com as juntas de freguesia, com os poderes locais. Esta é uma mudança estrutural na política portuguesa e não é só por causa de se estar à procura de soluções para a falta de habitação; é, porque vai dar aos portugueses e às eleições municipais uma muito maior importância do aquela que tinham até agora. Vai obrigar a escolhas de partidos políticos e de executivos camarários que representem e defendam os interesses dos munícipes. Vai obrigar os moradores das vilas e cidades a escolherem os presidentes de câmara que lhes resolvam efectivamente aquilo que cada um espera que seja resolvido ao nível do poder municipal. A crítica ao poder local pode e deve ampliar-se para níveis que cheguem à capital. A atenção à gestão dos orçamentos municipais deve estar mais na preocupação das populações, podendo estas intervir em concordância com o artigo 49.º da Lei 75/2013, de 12 de Setembro, que estabelece, taxativamente, o seguinte sobre as reuniões das assembleias municipais: «Sessões e reuniões: 1 — As sessões dos órgãos deliberativos das autarquias locais são públicas, sendo fixado, nos termos do regimento, um período para intervenção e esclarecimento ao público. 2 — Os órgãos executivos das autarquias locais realizam, pelo menos, uma reunião pública mensal, aplicando-se, com as devidas adaptações, o disposto na parte final do número anterior.»

 

Está na altura, de com as devidas autorizações, se criarem jornais electrónicos, que vivam de publicidade local, para exercerem a actividade informativa e crítica dos municípios, defendendo os munícipes e os seus interesses.

Estarei a delirar ou está na altura de os cidadãos aprenderem a viver com os seus direitos de cidadania, em vez de criticarem os governos da Nação, seja ele qual for, para exigirem maior respeito por aquilo a que acham que têm direito? A democracia representativa é um convite ao desleixo cívico e à crítica irresponsável. Costa está a abrir caminho para se começar a reclamar “por baixo”, pelo poder local.