O visto da estupidez
Hoje, em Praga, foi aprovada a decisão de acabar com os vistos de entrada na União Europeia (UE) dos cidadãos russos, que, segundo julgo, se deslocassem em turismo.
Porque me impuseram esse estatuto, sou cidadão da UE; não o solicitei nem fui consultado sobre se o queria ou rejeitava. Impuseram-mo. Mas uma coisa não me podem tirar, por enquanto: a liberdade de expressão sobre aquilo que penso… E penso que a limitação ou corte de vistos de entrada na UE a cidadãos russos, que venham fazer turismo, é a maior estupidez colectiva que o colectivo de políticos da União podia cometer.
A aplicação de sanções económicas, como, creio, já tive oportunidade de dizer, é um acto de belicismo contra a Rússia, porque este país não atacou a UE, mas um Estado terceiro a quem nada nos liga; nem tratados, nem alianças, nem nada! Tal solidariedade configura, por si só, um acto bélico. Se a ele juntarmos o fornecimento de ajudas várias de matriz militar, então, mais nos estamos a envolver no conflito. Some-se-lhe, agora, esta decisão e, sem sombra de dúvida, declaramo-nos inimigos da Rússia.
Ora, perante um quadro internacional desta natureza, abrimos as portas a uma agressão armada da Rússia a qualquer dos Estados da União, porque tais atitudes acossam Moscovo contra aquilo que por lá já se chama o Ocidente. Em vez de sabermos adoptar uma postura neutral e expectante, a UE, por causa da sua ligação e dependência da OTAN, assume-se como aliada da Ucrânia, porque aliada dos EUA.
Esta guerra não é nossa. Esta guerra é, em primeiro lugar, um conflito civil entre povos que já fizeram parte da mesma nacionalidade (a Rússia e a Ucrânia) e, em segundo lugar, um conflito entre os EUA e a Rússia.
Agir sobre cidadãos civis (ou até militares) da Rússia é um acto provocatório de toda a dimensão; uma dimensão que justifica uma atitude de defesa por parte do Kremlin. E não se diga, depois, que Moscovo mandou atacar por ser uma potência imperial! Se espicaças o animal feroz e não esperas reacção és francamente mais estúpido do que ele.
O que a UE e os EUA estão a fazer é, jogando com a certeza de que a arma nuclear nunca será usada pela Rússia, obrigar Moscovo a dobrar os joelhos e aceitar um estatuto político internacional de segunda grandeza. Mas, ao proceder deste modo, está-se a abrir a porta para que o vazio deixado pela Rússia seja imediatamente preenchido pela China, o que já ficou demonstrado há semanas, aquando das provocatórias visitas a Taiwan por parte de políticos responsáveis de Washington.
Depois, isolar os russos do contacto com os Estados da UE, é privá-los da única porta de informação diferente das verdades oficiais determinadas pelo Kremlin. Ou seja, é retirar rumo à contestação interna que se possa gerar dentro das fronteiras da Rússia contra o actual sistema político que os sufoca.
Numa palavra, a presente medida alia dois pólos opostos: o das vinganças dos antigos Estados satélites da URSS com os falcões do Pentágono e de Washington, permitindo, uma vez mais, que a UE se dissolva na política de uns e de outros, dando de si a imagem de uma unidade sem objectivos políticos distintos e autónomos, para além de tudo aquilo que se limita a regular o comércio entre os seus componentes.
Faltam, no Parlamento Europeu, vozes que façam ouvir a voz do homem comum e da rua desta União.