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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

27.07.21

A estratégia das grandes potências


Luís Alves de Fraga

 

Porque na notícia saída no “El Pais” de hoje sobre a possibilidade de Marrocos ter espiado as comunicações telefónicas do Presidente de França há um grande fundo estratégico, e porque a França e Marrocos são aliados, para reforço do muito que tenho afirmado sobre Defesa Nacional, resolvi traduzir e transcrever uma parte dessa notícia, de modo a que os meus leitores e amigos possam perceber a diferença entre a Defesa e Segurança, em França, e a Defesa Nacional, no nosso país. Aliás, como tenho dito várias vezes, o nosso ministério é mais das Forças Armadas do que daquilo que se intitula.

Aqui vos deixo o texto:

 

«Marrocos, um aliado estratégico da França, nega ter alguma vez contratado o programa Pegasus à NSO e rejeita o que descreve como “acusações infundadas”. A empresa israelita, por sua vez, afirma que Macron "nunca foi um alvo e nunca foi alvo de clientes da NSO".

Na França, o debate sobre o facto de um país amigo poder espiar o Chefe de Estado rapidamente levou a uma discussão sobre a possível leviandade de Macron em proteger suas comunicações. Desde que a notícia de uma tentativa de espionagem sobre Macron foi publicada na terça-feira, o Governo francês e o palácio do Eliseu evitaram convocar o Marrocos.

"O Presidente da República ordenou uma série de investigações em sentido amplo", anunciou o primeiro-ministro Jean Castex, na quarta-feira, em entrevista à televisão. Mas acrescentou: “Seria irresponsável da nossa parte fazer acusações até sabermos exactamente do que se trata e as medidas que esta situação pode exigir”.

Para tratar das revelações sobre Pegasus, Macron convocou quinta-feira um Conselho restrito de Defesa e Segurança Nacional, formato que se reúne semanalmente e do qual fazem parte os ministros da Defesa, Relações Exteriores, Interior e Economia, entre outros. No final da reunião, uma fonte da presidência francesa, que pediu anonimato, declarou: “Se os factos forem provados, são obviamente muito graves. No momento, nenhuma certeza surgiu [sobre as divulgações], donde, toda a cautela é necessária nos comentários."»

25.07.21

As pétalas dos cravos também caem


Luís Alves de Fraga

 

Abril, o Abril de Portugal, o do renascimento da esperança ao parir, de novo, a Liberdade, ao propor, de novo, a Democracia, o Abril com cravos nos canos das G3, está a perder folhas.

É o tempo, dizem uns, é a idade, dizem outros, é a doença, afirmam alguns entendidos.

 

Abril foi um tempo de tudo, em que muitos quiseram demais e outros queriam de menos. Muitos queriam, sem saber, um sonho, uma utopia. E Abril também foi tempo de utopias!

 

Saraiva de Carvalho, não é nome de rua. É nome de um major, que numa noite, a de 24 para 25 de Abril de 1974, foi capitão. Foi o Capitão que planeou, que coordenou, que deu ordens aos militares que queriam essas ordens e deu voz ao Povo que queria tez voz.

 

O major Otelo Saraiva de Carvalho morreu hoje. O cravo já quase não tem pétalas...

22.07.21

Ainda a Reforma e a dúvida do Almirante


Luís Alves de Fraga

 

O almirante Alexandre Reis Rodrigues levantou, há pouco tempo, num artigo intitulado «As razões que a razão não entende», a questão da justificação mais profunda para se verificar a alteração que o ministro da Defesa Nacional propõe para a estrutura dos altos comandos das nossas Forças Armadas.

Ao ler, com atenção, o texto fui sendo levado para memórias já quase esquecidas sobre assuntos militares aos quais dediquei alguma atenção há anos. Comecei a juntar pontas: coisas de agora e coisas de antanho.

 

Porque escrevi há dias um texto sobre a nova disposição sobre sacos de compras. Para me documentar fui ver o Decreto-Lei e verifiquei que, no preâmbulo, se faz uma exaustiva referência às directivas dimanadas da União Europeia e à subordinação que a legislação nacional deve a essas mesmas directivas, o mesmo é dizer, os Estados membros têm uma imensa parcela da sua soberania hipotecada a uma outra que lhes é superior e imperativa: a da União.

 

Há dezasseis anos escrevi (Revista Militar n.º 2440 ‒ Maio de 2005) um artigo intitulado “Forças Armadas: Uma contradição europeia?” ao longo do qual teci muitas considerações, passando a transcrever algumas donde se perceberá a razão do título:

«Até há bem pouco tempo, os tratadistas políticos e os estrategistas europeus, em consonância com os dos restantes continentes, dividiam os interesses nacionais em dois grandes grupos: permanentes e transitórios. Nos primeiros cabiam, no topo da enumeração, a defesa da independência e da soberania, ou seja, a permanência da vontade de se continuar a Nação como um Estado capaz de emparceirar, na ordem externa, em pé de igualdade, com outros Estados

Mais à frente, disse: «(…) a cultura dos interesses nacionais faz-se, pelo menos, em três grupos distintos de servidores do Estado ou, melhor dizendo, da Nação: o dos Políticos, o dos Diplomatas e o dos Militares. Ora, só se pode cultivar o que se conhece, razão pela qual é imprescindível manter viva, no seio deste grupo, a aprendizagem dos valores mais elevados e mais puros do nacionalismo actuante, os quais se consubstanciam em uma palavra, entre nós, um pouco esquecida e quase obsoleta: Patriotismo.»

Páginas depois afirmei:

«Quando de uma comunidade de interesses essencialmente económicos [estava a referir-me à CEE] se transitou para uma união política com objectivos que transcendem em muito os anteriores, naturalmente passou a estar-se perante uma nova realidade, exigindo novas posturas por parte dos Estados. Uma delas implica a alteração do conceito de soberania. É sabido que a União Europeia pretende assumir-se como uma unidade política com um grau de soberania superior ao dos Estados que a integram.»

Um pouco mais à frente, dizia:

«Se olharmos a actualidade através das «lunetas» herdadas da Revolução Francesa concluímos, sem dificuldade, o quanto a União Europeia é uma subversão da ordem interna e da ordem externa dos Estados soberanos. E nem se pode invocar exemplos de Uniões ou Federações existentes no continente americano, porquanto essas se assumiram como «revoluções» libertadoras de uma subjugação colonial que, por coerência, teriam de romper com o modelo de onde provinham.»

Logo de seguida avancei:

«A União Europeia ao subverter o modelo herdado e consolidado de Estado, através de um aprofundamento da prática de uma soberania «superior», subverte concepções centenárias nos Estados e Nações do continente. Uma delas é, sem sombra de dúvida, a do Patriotismo. A Europa encontra-se em fase de abandono das Pátrias para avançar rumo a um novo conceito que, por não estar claramente definido nem ser absolutamente consensual, ainda se busca qual cego no labirinto de Creta. Contudo, há que ter em consideração que os nacionalismos definidores dos Estados ainda não foram enterrados.»

Depois continuei:

«(…) face à subversão em curso e que todos os políticos «euro-crentes» defendem, coloca-se, com profunda acuidade e pertinência, a questão de saber sobre que pilares deverá assentar a base formativa dos militares ‒ e em especial dos oficiais das Forças Armadas ‒ desta Europa subvertida. Nos velhos conceitos de Patriotismo nacionalista que vêm do século XIX? Nesse caso está-se a corromper, por dentro, a evolução tão desejada por todos aqueles que defendem a União Europeia como futura unidade política supranacional. Gera-se, propositadamente, o vazio formativo nos novos quadros militares? É sabido que a Natureza tem horror ao «nada»; ele há-de ser preenchido por uma qualquer ideia ou ideologia. Será a acertada e conveniente?»

Porque começa a ser fácil perceber onde eu pretendo chegar agora, limito-me a mais uma transcrição:

«Na nossa opinião, só após terem sido lançados os alicerces da política comum será possível falar de uma política de defesa comum, já que esta advém, como vimos anteriormente, da prévia definição dos interesses a salvaguardar. Poder-se-á, no presente, falar de cooperação militar entre Estados, mas não será mais do que isso mesmo, na exacta medida em que os aspectos fundamentais se continuam a centrar na defesa dos interesses das Nações. Podemos, então, deixar a pergunta: sobre que ideais deverão começar a ser educados os futuros oficiais de umas Forças Armadas europeias?»

 

As preocupações que deixei ao longo desse trabalho, cuja finalidade apontava no sentido da formação dos futuros oficiais militares da União Europeia, levaram-me a, em função do artigo do almirante Reis Rodrigues, redireccionar-me, pois a resposta às justas causas daquele oficial da Armada, não vão ser dadas na perspectiva que eu alinhei há dezasseis anos!

Não, elas, em vez de começar por baixo, vão começar por cima!

A reorganização dos comandos das nossas Forças Armadas faz ‒ não posso apostar, porque não tenho mais dados do que a simples dedução ‒ parte do plano de criação das Forças Armadas da União, no mais curto espaço de tempo.

Tudo se tornou urgente em função de um conjunto de dados externos a Portugal: o fenómeno Trump e a nuvem negra que pode pairar em qualquer momento sobre a Europa, se o elo atlântico se quebrar; a pandemia, que veio mostrar à saciedade a dependência em que a Europa está da China, porque é lá que está a indústria que faz falta à sobrevivência com autarcia limitada da Europa e, por fim, mas não por último, a corrida aos armamentos modernos que a China está a fazer, com especial orientação para o seu mar, facto que obriga os EUA a deslocar a sua força para o Pacífico, deixando à Europa a obrigação de defender o Atlântico. Acrescente-se, para ultimar, a pressão que a Rússia pode fazer nas fronteiras orientais da União.

 

Não apostando, creio não estar longe do alvo, pois Bruxelas e os europeístas ‒ aqueles tecnocratas que resolvem tudo nas costas de todos nós ‒ são bem capazes de ter o dossiê já preparado para a criação das Forças Armadas da União. Faltará a directiva, mas essa prepara-se num abrir e fechar de olhos, se todos os ministros da Defesa estiverem de acordo. E se a minha hipótese estiver certa, é assim que se justifica a perda de importância dos Chefes dos Estados-Maiores dos ramos, que passarão para lugares bastante subalternos numa orgânica da força europeia.

 

Porque o ministro da Defesa Nacional não nos explica nada, nem ele nem o Primeiro-Ministro, seguindo o trilho aberto pelo almirante Reis Rodrigues, todas as deduções são possíveis.

20.07.21

Lógicas e ilógicas


Luís Alves de Fraga

 

Ler o Decreto-Lei n.º 102-D/2020, aquele que tem origem nas directivas da UE sobre resíduos e reciclagens é um frete insuportável. Por ali se percebe o que se faz no parlamento europeu e em Bruxelas. Segundo parece ‒ mas é mesmo só por parecer ‒ a intenção é magnífica, mas, para quem olha com um olhar crítico este mundo de consumo só tem vontade de os mandar a TODOS para um sítio que socialmente estou proibido de dizer.

 

Vamos lá ver.

Este mundo está montado no princípio da economia de mercado, que se justifica pelo aumento do consumo, através de ampliar as necessidades dos potenciais compradores.

Então, ou eu sou completamente burro, idiota e tanso, ou a economia de consumo está invariavelmente e indesmentivelmente destinada a gerar desperdício. Desperdício que, pela sua natureza, agride o ambiente!

Bom, isto parece-me uma incongruência!

 

Daqui por três anos (se eu for vivo) o meu telemóvel ‒ que dá uma excelente resposta às minhas necessidades e até as supera ‒ vai estar incapaz de funcionar em tão boas condições como agora. Vou ter de o substituir e o seu destino é a reciclagem. Passados mais três anos o processo repete-se igual ou talvez pior.

Mas, se saltarmos do telemóvel para a torneira da água do lavatório a coisa terá possibilidades de, em vez de três anos, ter um ciclo de cinco, oito ou dez anos. E a televisão? E a aparelhagem de som? E os móveis de madeira comprados naquele estabelecimento sueco ou noutros nacionais, do mesmo género? E os móveis de cozinha? E o automóvel cada vez mais electrónico? E? E? E?...

 

Quando eu era menino, as mobílias da casa de jantar dos meus avós, as cadeiras e tudo o mais que havia lá por casa tinham a idade do casamento deles e estavam boas e reparavam-se e continuaram a existir em casa de alguns dos meus primos. O mercado não tinha como finalidade o consumo. Visava satisfazer o comprador, através da qualidade, da durabilidade, da beleza, do requinte. Os meus avós não careciam de mostrar aos vizinhos que alteravam as mobílias da sala em cada cinco anos, nem que os cortinados estavam fora de moda!

Os meus avós não faziam desperdício, porque usavam e tornavam a usar tudo o que haviam comprado vinte, trinta, quarenta anos antes.

 

Não aguento mais! Tem de ser!

Tenho vontade de pedir emprestada, a um dos meus primos, a cadeira da secretária do meu avô para atirá-la aos cornos de um ou de vários burocratas da União Europeia e, por arrasto, aos arautos da economia de consumo, porque, ou querem mais produção e mais desperdício ou optam por uma produção duradoura e menos consumista, donde, com menos resíduos e menos reciclagens.

 

Não aguento com incoerência e ilogicidades, por isso, nas lojas, agora, refilo contra o pagamento dos SACOS DE PAPEL, por causa do aumento dos resíduos! Ou será que os ricos podem gerar todos os resíduos que quiserem, ficando os remediados impedidos de tal direito?

 

Que mundo é este? Que União Europeia é esta?

17.07.21

Um milhar


Luís Alves de Fraga

Este blog começou em Agosto de 2005 e acabei há pouco de colocar o milésimo texto.

Sinto-me satisfeito, porque neste espaço, tenho por hábito escrever crónicas com alguma dimensão (quase sempre mais de uma página A4) o que, sem fazer qualquer contagem, me leva a pensar que, por aqui, já estão mais de mil páginas publicadas.

Não sei se terei tempo, paciência e disposição para fazer uma recolha com a respectiva selecção por temas ou assuntos de modo a pensar na publicação de um livro de crónicas. Seja como for, elas estão aqui à disposição de todos os leitores, que tenham interesse em lê-las.

Este apontamento é, quase de certeza, um dos mais pequenos que aqui deixei.

Obrigado a todos os que têm tido pachorra para ler algumas das coisas que por aqui foram ficando.

17.07.21

Cuba, o Socialismo e a Liberdade


Luís Alves de Fraga

 

O contexto do nascimento do socialismo em Cuba é tão diferente daquele que hoje se vive no mundo como o de um dia de sol é para uma noite de lua nova (o céu está plenamente escuro).

Cuba era e foi, durante todo o tempo anterior à vitória da guerrilha começada na Sierra Maestra, um feudo da pouca vergonha dos americanos medianamente endinheirados! E, meus amigos não me digam que é fantasia, porque, para poder estabelecer uma comparação plausível, ao que era Havana para os Americanos idos dos Estados Unidos, vou buscar o exemplo que eu vi, em 1967, na antiga cidade de Lourenço Marques, hoje Maputo, nos bares da rua Major Serpa Araújo, homens brancos, alguns jovens e outros nem tanto, provenientes da África do Sul, quando por lá se vivia o mais radical apartheid, agarrados a prostitutas negras, beijando-as com lascívia e loucura, como nunca eu presenciara em qualquer prostíbulo de Lisboa.

Antes de Fidel, Cuba e Havana eram o quintal das brincadeiras proibidas dos EUA, daí que os sucessivos Governos cubanos fossem apoiados e acarinhados por Washington. O último foi o ditador Flugencio Baptista, que encontrou exílio dourado na ilha da Madeira, em 1959.

Quando Fidel Castro mostrou o desejo de mudar a situação, impondo outros padrões sociais na sua Pátria, os EUA iniciaram um cerrado boicote a Cuba e, naturalmente, como seria de esperar naquela conjuntura mundial, Moscovo disponibilizou-se para oferecer todo o apoio ao novo senhor do poder em Havana. Era a lógica da Guerra-Fria.

 

Fidel construiu, na sua ilha, dentro dos limites do possível, com o apoio da URSS, em troca da venda de todo o açúcar àquele Estado comunista, o socialismo que procurou remediar os muito pobres, cobrir com hospitais o seu país, disponibilizando assistência sanitária gratuita, alfabetizando um povo que maioritariamente não sabia ler, abrindo a possibilidade de frequência de cursos universitários a todos os jovens que mostrassem capacidades intelectuais, apoiando a investigação científica que fazia falta a uma tentativa de melhorar as condições de vida das populações.

Mas Cuba não é um território rico, assim, jamais conseguiu aspirar à auto-suficiência.

 

Neste quadro, grosseiramente traçado, temos zonas de belas cores, zonas de cores mais suaves e esbatidas e zonas de negrume perturbante, o mesmo é dizer, muita população melhorou as suas condições de vida, outras contentaram-se com o balanço entre o que perderam e o que ganharam e outras desgostaram-se, de todo, de certas imposições a que o novo regime obrigava. É que um regime socialista, num território estruturalmente pobre, tem de ter mão pesada sobre aqueles que procuram afincadamente defender os seus interesses individuais mesmo que indo contra os interesses colectivos. Esses, sentir-se-ão sempre vítimas, tanto mais quanto mais se lhes impuser um silêncio que não destabilize os parcos equilíbrios alcançados.

 

Desde a queda da URSS ‒ e já lá vão muitos anos ‒ os EUA continuam a impor um férreo bloqueio (há quem prefira chamar-lhe embargo) a Cuba. Um bloqueio que só se justifica por dois motivos evidentes (admito que existam outros, que a minha inteligência não enxerga): um, fazer desaparecer a vaga sombra de um regime político que ainda se reivindica de socialista (para o homem vulgar dos EUA socialismo é o mesmo que comunismo, sendo que comunismo é o papão que vai comer os seus States) e, outro, reduzir, novamente, Cuba ao grande bordel e casino que foi noutros tempos.

Esta segunda razão é aquela que dá mais garantias aos decisores económicos, militares, políticos e financeiros de que os EUA, para além de terem como destino natural aquele que o Presidente James Monroe lhes determinou, têm aquele que os Presidentes Wilson e Roosevelt lhes traçaram no prosseguimento da 1.ª e da 2.ª Guerras Mundiais: árbitros e polícias da política internacional fora do continente americano.

 

Se o comum dos cidadãos do mundo tivesse uma clara visão do que é a política externa dos Estados Unidos estaria há muito tempo a condenar a atitude de Washington contra Havana. É um acto de justiça mínima.

07.07.21

As manhas do Júdice


Luís Alves de Fraga

 

Vi ontem, na televisão, mais uma diatribe deste comentador de coisa nenhuma. Vejo, porque, usando a mesma expressão dele, temos de admitir que até o mais ignorante, o mais estúpido, o mais incapaz dos nossos interlocutores pode ter, por trás das suas palavras, uma estratégia de comunicação. Ora, ele não é nem ignorante, nem estúpido, nem incapaz, por isso, tem, de certeza, uma estratégia de comunicação, por isso, quando aponta erros aos governantes ou lhes faz elogios, tem um qualquer objectivo em mente.

 

Ontem, José Miguel Júdice defendeu duas ideias fundamentais: Governo, através da comunicação social, manipula a opinião pública (implicitamente está a acusar os jornalistas de estarem vendidos aos governantes) e as medidas adoptadas no combate à Covid 19 e suas variantes são erradas, tomando como base o número de mortes. O resto do que disse, pouco ou nenhum interesse tem para análise crítica.

Vejamos a questão dos números de mortes e a descarada manipulação que ele fez, perante os nossos olhos e ouvidos, para colocar em xeque o Governo e as autoridades de saúde, advogando o princípio do fim das medidas de confinamento para evitar a expansão do vírus.

 

Pegou no número total de mortes do ano passado de doenças várias e no de falecidos com Covid. Concluiu, como não podia deixar de ser, que a percentagem de mortos resultantes da pandemia era ínfima quando comparada com os de todas as outras doenças. Assim, José Miguel Júdice, de uma forma pouco explícita, mas suficientemente insidiosa, defende ser mais importante a economia do que a saúde, pois morre-se pouco em resultado da pandemia. Para ele, as medidas hesitantes, erráticas e ziguezagueantes do Governo, no que toca às soluções de combate à Covid 19, são resultado de desnorte. Para mim, como para quem sabe o que é lutar contra algo que não actua com racionalidade, os erros dos governantes resultam, precisamente, do comportamento variável e não controlável do vírus.

Júdice bateu-se, usando os argumentos da mortalidade e é aqui que está a manha, a manhosice, do advogado e proprietário da Quinta das Lágrimas, em Coimbra!

Expliquemo-nos.

 

Quando foi da segunda vaga, neste Inverno, os hospitais encheram-se de doentes com Covid, não tendo capacidade para tratar outras urgências comuns àquela época do ano, bem como de outras doenças não sazonais. É aqui que está o problema e não no número de mortos, que lamentamos!

Dando a volta como fez, José Miguel Júdice, ao colocar a tónica nas mortes retira-a dos internamentos, gerando a impressão de que a Covid 19 não tem gravidade, se pode tratar em casa e não passa de uma doença igual e de risco semelhante a uma pneumonia, uma gripe ou, até, uma constipação.

A distância entre a posição de José Miguel Júdice e a de Bolsonaro é nula, embora a forma de dar a volta à questão seja muito mais inteligente do que a do boçal capitão eleito Presidente da República brasileira.

Este causídico português ou está a perder qualidades ou menospreza os adversários, ao contrário do que começou por dizer ontem.

E dá-se palco, microfone e audiência a este antigo integrante do MDLP, ramo armado da extrema-direita portuguesa!

05.07.21

Estratégia e Economia


Luís Alves de Fraga

 

É vulgar o uso da expressão estratégia económica que nada tem a ver com estratégia e economia. Vamos começar por estabelecer e distinção.

 

Uma estratégia económica pressupõe a existência de uma luta, um objectivo e um ou vários modos para vencer, alcançando os objectivos, ou minimizando os estragos causados pela luta. Uma estratégia económica é, por conseguinte uma acção que se desenvolve, no domínio da economia com o intuito de conseguir um resultado.

Não podemos confundir com política económica, pois esta está a montante daquela e, assim, é ela quem determina a estratégia a adoptar ou seja o desenvolvimento dialéctico perante o desenrolar da acção.

Face ao exposto com sintetismo, ocorre uma pergunta retórica para prosseguirmos na exposição:

‒ E entre Estratégia e Economia, qual a relação existente?

Se aqui entendermos o termo Estratégia (propositadamente escrito com maiúscula) como o desenvolvimento dialéctico da acção condutora do Estado no prosseguimento dos seus superiores interesses e objectivos, percebemos que, ao estabelecer a complementaridade “Economia”, estamos a tratar desta como fazendo parte daquela. O mesmo é dizer, na Estratégia do Estado cabe tudo o que concorre para a realização dos interesses do colectivo sobre o qual ele, Estado, exerce o dever de tutela.

 

Definidos conceitos, temos obrigação de chamar a atenção para aspectos mais subtis da Estratégia do Estado ‒ se se preferir, também lhe podemos chamar Estratégia Nacional ‒ e que a separam da vulgar luta política. Na verdade, os objectivos estratégicos de um Estado devem sobrepor-se à disputa pela detenção da governação.

Ora, quando relacionamos Estratégia e Economia caímos no grande pomo de discórdia política, pois, no geral, os desentendimentos essenciais entre partidos passam pela forma como se deve encarar a Economia do Estado.

Reparemos que é por causa da política económica que, quase sempre, se deram os grandes confrontos bélicos e as grandes disputas internacionais. A política económica tanto passa pelo mercado interno como pelo mercado externo e, quanto mais os mercados dependerem uns dos outros, tanto mais difícil será traçar a política económica mais conveniente a uma sociedade.

 

O caso português é paradigmático nesse aspecto. Vejamos.

Na primeira metade do século XVIII, quando na Europa se desenvolviam grandes oficinas para produzir os artigos que podiam satisfazer os mercados internos dos diferentes Estados, no nosso país, em consequência da descoberta dos grandes filões de ouro no Brasil, comprava-se tudo o que lá por fora se produzia, sem a cautela de desenvolver uma política económica que apontasse para a autarcia possível, ou seja, que evitasse as importações. Praticava-se, nessa altura, em França, na Inglaterra, na Áustria e um pouco por toda a Europa, o chamado mercantilismo, que se traduzia por vender ao estrangeiro o mais possível, evitando comprar fora o quer que fosse.

Na segunda metade do mesmo século, com a queda da mineração brasileira, o marquês de Pombal deu um extraordinário impulso mercantilista à economia do reino, fundando oficinas de produção de tecidos de lã e de seda, de chapéus, de sapatos, de peças de vidro, delimitou a produção de vinho a zonas próprias, enfim, lançou aquilo que poderia ter sido a base de uma transformação industrial no momento em que a oficina deu lugar à fábrica. Mas tal não aconteceu, porque, por razões já por nós explicadas noutro sítio (Reflexão sobre o Capitalismo Português no Século XIX ) se optou, até quase ao fim da primeira metade do século XX, por aceitar que Portugal fosse um país essencialmente agrícola, com uma indústria controlada.

Curiosamente, quando se julgava que se estava a praticar uma política de incentivo à economia ‒ abertura de estradas e lançamento de vias férreas ‒ durante a Regeneração, com o patrocínio de Fontes Pereira de Melo, começou-se, de facto, pelo fim, o mesmo é dizer, abriram-se vias de escoamento da produção industrial, mas não se implantaram fábricas a cavalo das mesmas.

Em suma, pode dizer-se, que a nossa Estratégia Nacional nunca levou em conta a Economia e este nunca chega mesmo aos anos oitenta do século passado, quando um dilúvio de dinheiro foi vertido sobre Portugal proveniente da CEE. Repetiu-se, quase a papel químico, o mesmo erro de Fontes Pereira de Melo, mas, desta vez bem pior, pois desprezaram-se as linhas férias.

 

Ficar por aqui nesta análise sintética era enviesar o estudo da nossa Estratégia Nacional ‒ mesmo quando ela não estava vertida em letra de forma ‒ pois, os povos, por caminhos ínvios ou mais direitos, definem-na quase sempre (já vimos como a Geopolítica é fundamental nesse papel) mesmo sem grande noção da importância das suas acções ‒ algo semelhante à aprendizagem da busca do leite materno levada a efeito pelos mamíferos quadrúpedes após serem paridos ‒ (o que confirma a afirmação do general André Beaufre: «todo o homem faz estratégia sem saber»).

Realmente, se fizermos uma rápida análise interpretativa à Expansão Portuguesa, começando pela conquista de Ceuta, em 1415, até 25 de Novembro de 1975 (data da independência de Angola) percebemos que o eixo sobre o qual giraram as diferentes formas de geração de riqueza nacional foi o do comércio marítimo com todos os entrepostos comerciais criados ao longo das costas de África, da Índia, do Oriente e do Brasil. Não se tratou de um império territorial à maneira do de Espanha nas Américas, mas um fluxo mercantil que soube adaptar-se aos diferentes condicionalismos ditados pela concorrência e pela força das políticas imperiais europeias.

 

Infelizmente, nem nas nossas universidades nem os nossos meios políticos nascidos na sequência da revolução democrática de Abril de 1974 souberam dar a conhecer ou explicar esta Estratégia Nacional onde a Economia se tornou o pilar da independência e da soberania nacionais. Sempre se acreditou que o cadeado que fechava o portão por onde a Espanha poderia entrar era a aliança com a Grã-Bretanha. Ao não perceber a Estratégia Nacional, intuitivamente definida por sucessivos reis, governos e regimes, os negociadores da adesão de Portugal à CEE cometeram um erro de lesa-pátria, pois, virando as costas ao mar e ao comércio marítimo a grande distância, meteram o país no caldeirão dos conflitos europeus e mundiais, sem outro recurso do que o de aceitar o que nos fosse imposto.

Veja-se o caso da Holanda, país de fracos recursos naturais, cujo solo arável tem vindo a ser conquistado ao mar, que ocupa o primeiro lugar no transporte marítimo europeu o qual, para além de conduzir para o exterior a produção agrícola nacional (emprega 2% da população e exporta 60% da produção), transporta tudo de e para todo o lado. A Holanda não modificou a rota da sua Economia com a entrada na CEE.

Fora da União Europeia, temos o caso bem conhecido da Suíça. País de fracos recursos naturais, vive de uma fortíssima exportação de produtos produzidos nas inúmeras pequenas e médias empresas que dão trabalho e despende anualmente cerca de 15 mil milhões de euros em pesquisa e desenvolvimento. Trata-se de um Estado que soube orientar a sua Economia para nichos de mercado onde se afirmou pela qualidade.

 

Em Portugal, falta determinar o papel que a Economia tem presentemente na Estratégia Nacional, pois, se deixarmos que sejam interesses privados a escolher a direcção económica estamos a abrir uma profunda brecha na nossa defesa colectiva, expondo-nos à vontade estranha, que defenderá os seus interesses e deixará cair os interesses nacionais.

Será que o Ministério da Defesa Nacional está a trabalhar em consonância com o da Economia para garantir a nossa integridade, soberania e bem-estar?

03.07.21

Do linchamento em praça pública


Luís Alves de Fraga

 

Não fiz, nem vou fazer, uma pesquisa sobre os últimos vinte anos, mas, parece-me, nunca como agora se pediram tantos linchamentos políticos de governantes.

Não me interessa se são do partido A ou B. Interessa-me que a oposição política, em Portugal (se calhar no resto do mundo) ganha forças e estabelece novas “fronteiras” quando pode pedir a cabeça de um político.

Aquele que, admito, foi alvo de uma tremenda campanha de linchamento, quando ainda membro do Governo, dá pelo nome de Miguel Relvas. Que tinha telhados de vidro, lá isso, parece, tinha, mas…

‒ E linchamentos de personagens em situação de destaque social?

Bom, isso é o pão-nosso de cada dia!

O jogo do tribunal da opinião pública está a tornar-se, entre nós, um meio de verdadeiro terrorismo civil, o que muito me preocupa!

 

Agora, tal como antes, o ministro Cabrita está na mira de todos os “pelotões de fuzilamento social”. Não interessam inquéritos, processos de averiguações, nem nada. Interessa derrubar um político, um homem. Não há a preocupação de analisar factos; a preocupação é “queimar” o nome e a pessoa na praça pública!

 

No largo de S. Domingos, em Lisboa, está um cínico monumento, que parece tentar pedir desculpa a todos os judeus que ali foram mortos há várias centenas de anos, mas, a verdade, é que, naquela época, foram eles os perseguidos e hoje são políticos, figuras públicas, figuras anónimas, porque está-nos enraizado no sangue, na carne, no comportamento, esta cobarde forma de atentar contra a vida dos outros, sem nos preocuparmos com os resultados subsequentes.

Há um, dois ou três dias, de manhã, num qualquer canal de televisão ‒ daqueles que estupidificam a audiência ‒ onde se senta um senhor com ar patibular e mais um ou dois advogados desejosos de visibilidade, ouvi, de passagem, comentar o assassinato de uma mulher de cinquenta e poucos anos pelo marido de oitenta, porque “ela queria empregar-se, sair de casa e, depois, do casamento; queria ser livre”.

Claro que o velhote, na boca daqueles carrascos, foi um malvado, um criminoso, um homem incapaz de perceber fosse o que fosse. Foi mais um a engrossar a violência doméstica.

 

Mudei de canal e comentei com a minha mulher esta acção pouco pedagógica de fazer e de comentar notícias. Expliquei-lhe que ninguém foi capaz de olhar para aquele homem de oitenta anos e procurar “entrar-lhe” na cabeça!

É que, a um homem daquela idade, pouco ou nada lhe resta se não souber perceber que tem oitenta anos, que já não é um ser capaz de competir seja com quem for, que, se calhar, toda a vida esteve centrado na sua virilidade e no respeito que, através dela, julgava conseguir; que toda a vida esteve centrado na força física e no respeito que, através dela, julgava infundir. Ninguém, de entre aqueles juízes de opereta triste, olhou para o assassino e para os distúrbios que lhe assaltam a mente todas as noites, todos os dias, quando de homem ‒ segundo os critérios de uma sociedade onde cresceu e viveu ‒ já nada lhe resta!

Ficámos, eu e a minha mulher, a dissecar o que é ter cinquenta e tal anos e ter oitenta e o quanto é preciso perceber para se conseguir ter uma relação de casal estável quando ele é um velhote e ela ainda é capaz de parecer uma “mulher inteira”. Teríamos feito um programa televisivo educativo e destruidor destes pseudo-jornalistas que só gostam de ver “sangue”, vingança e, mais do que tudo, crueldade tão igual ou superior àquela que eles descobrem e acusam nas suas vítimas!

Isto não é liberdade de expressão; é subvertê-la, levando à subversão da democracia. É um sinal de fim de ciclo.

 

Esta sociedade global e autofágica, onde o importante é estar na crista da onda, mesmo que sem prancha de surf e sem saber surfar, irrita-me, desgosta-me e leva-me a crer que, por caminhos ínvios, está a pedir uma dura ditadura, que proíba desmandos sociais disfarçados de moral-comum. Comportamentos destes são desviantes da democracia e, por arrasto, da liberdade, pois, de modo subliminar, conduzem ao culto da violência.