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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

27.04.20

Fases da minha vida ‒ 7

(A Conferência)


Luís Alves de Fraga

 

Não foi a leitura do pequeno volume sobre a vida de S. João de Deus que se tornou determinante para a minha formação católica, quando tinha treze/catorze anos e estava nos Pupilos do Exército; ele foi a espoleta que me despertou para a exploração de uma outra forma de ser católico, a qual ia, necessariamente, muito para além da lengalenga dos pai-nossos, das ave-marias e de outras orações usuais ou mesmo da assistência à celebração da missa aos domingos.

Essa outra forma passou por perceber a profundidade do que se exigia para ser católico. Sê-lo, descobri, não passava somente ‒ e até, talvez isso fosse secundário ‒ por entrar em certos rituais e participar neles; passava por compreender os principais sacramentos daquela religião e, muito em especial, o da confissão que, continuo a achar, é um dos mais importantes, por ser o mais formativo.

 

É sobre isto que me vou debruçar, para se perceber esta fase da minha vida, que, depois de uma sólida ascensão, entra em declínio até por volta dos meus vinte e seis anos e desaparece em absoluto no meu regresso de Moçambique, em 1969.

 

A confissão auricular pode ser, no mínimo, duas coisas: um processo de regularizar contas com Deus e um caminho para o aperfeiçoamento individual.

Se olhada na primeira perspectiva ‒ creio ser a mais comum entre os que se dizem católicos ‒ a confissão é uma farsa para ambas as partes: para o que se julga crente e para Deus.

É uma farsa, porque lhe falta o elemento mais necessário, aquele que a torna um mecanismo de santidade, e que resulta da conjugação de dois sentimentos: o verdadeiro arrependimento e o desejo da não voltar a pecar, o mesmo é dizer deixar de praticar os actos determinantes da necessidade de confissão. Uma confissão com um arrependimento a prazo é um embuste para aquele que se confessa, pois sabe que não tem intenção de emenda; confessa agora, peca mais logo e torna a confessar amanhã. Isto é uma entremez!

Para ser valiosa, a confissão tem de ser antecedida do exame de consciência o qual, em boa verdade, não é mais do que uma autocrítica, que o católico preocupado com a sua salvação, fará constantemente, ou seja, estará sempre de sobreaviso quanto ao seu comportamento.

 

Esta era a tarefa que assumi entre os meus treze/catorze anos e os vinte. Cheguei a punir-me ‒ sem necessidade de nenhuma recomendação sacerdotal ‒ privando-me de comer ou pão ou fruta às refeições face ao meu exame de consciência!

Eu não brincava em serviço. E estou grato a mim mesmo e à Igreja Católica, pois foi deste modo que me formei, que moldei e disciplinei a minha personalidade. Acima de tudo, aprendi que posso mentir a muita gente, mas tenho a plena consciência da mentira, porque não minto a mim mesmo.

‒ Mas não vivi a minha juventude com todas as malandrices próprias do tempo e da época? Fui um anjinho?

‒ Nem pensem!

Fiz tudo o que devia fazer até aos meus vinte anos, mas com consciência do pecado e com arrependimento e desejo de não voltar a repetir. Claro, quanto mais os anos iam avançando, mais fui tendo a noção de que estava a entrar no plano inclinado da traficância com o divino: pecava, pedia desculpa e voltava a pecar, sendo que o propósito, sincero e verdadeiro, de emenda começava a ser, antes do mais, uma traficância comigo. Havia, para me tranquilizar a consciência ‒ mas só para isso ‒, uma intenção de não voltar a repetir, contudo, quando a ocasião surgia, a vontade reduzia-se a quase nada.

 

Foi neste contexto que, por volta dos meus dezassete anos, o capelão Ruy Corrêa Leal, nos propôs ‒ a quatro dos mais assíduos católicos de então ‒ a criação da delegação da Conferência de São Vicente de Paulo. Assumiu a presidência o Moita, a vice-presidência eu, como secretário ficou o Pamplona e como tesoureiro o Duran Clemente.

Não sei nem nunca me passou pela cabeça averiguar qual a base lógica para esta escolha, mas, seja como for, as únicas relações que me assaltam são de duas ordens: as idades, que eram muito idênticas e a distribuição por cursos: dois frequentarem os de indústria e dois o de comércio.

A nossa acção começou, primeiro, por arranjar, entre os alunos católicos de todas as idades, adesão à Conferência e, de seguida, com fundos financeiros angariados entre nós, o capelão e outros apoios externos (uma choruda participação da mãe do falecido marquês de Fronteira, Fernando de Mascarenhas, nossa vizinha), comprar géneros alimentícios para fazer pequenos cabazes que levávamos, ao fim das tardes de sábado, a casas de famílias residentes no bairro do Calhau.

 

As casas eram, na sua maioria barracas de madeira e zinco e as poucas de alvenaria tinham uma só divisão.

Ali aprendi o que era a real miséria ‒ financeira e moral ‒ destes bairros onde habitava a pobreza. Ali aprendi que as barracas têm um cheiro típico e uma ambiência interna característica. Ali vi a violência e a indiferença sociais exercida pelos possidentes sobre os que nada têm e que, tendo dignidade, acabam-na perdendo por força da indiferença de quem julga poder mais. Mas, ali, acima de tudo, comecei a aprender que a caridade não resolve o problema fundamental da falta de recursos e muito menos o da miséria.

Aprendi eu e mais alguns dos meus companheiros, incluindo os mais novos, que, tempos depois ‒ e não terá sido por acaso ‒ passaram a militar nos diferentes quadrantes políticos da esquerda portuguesa.

 

Em jeito de balanço, posso dizer, a vivência nos Pupilos do Exército, nos três últimos anos, marcou, por um lado, a culminância da minha prática católica e o começo do declínio desse aspecto. A grande vacilação deu-se quando surgiu a grande primeira paixão da minha vida, levando-me a pensar que a figura bíblica de Eva não aparece por mero acaso, ainda que não a veja como justificativa para a perdição do homem, bem pelo contrário.

23.04.20

A Grande Guerra revisitada


Luís Alves de Fraga

O Fim da Ambiguidade - 2ª ed.jpg

 

 

Como regra, há muitos anos, leio vários livros ao mesmo tempo, ou seja, é normal ter dois ou três livros em sítios diferentes da casa para onde me desloco com a finalidade de os ler. Quando digo livros, não falo de romances ‒ que só leio muito de quando em vez ‒, mas de ensaios.

De momento, tenho um cuja leitura entrou em ponto morto e vai-se arrastando penosamente; leio-o com dificuldade, porque se tornou monótono.

 

Estou entusiasmado com um grosso volume ‒ seiscentas e cinquenta e cinco páginas ‒ do neoconservador Niall Ferguson, com o título O Horror da Guerra: 1914-1918. A obra foi publicada, no original, em 1988, e só está traduzida em português desde 2018, pela editora Temas e Debates.

Trata-se de um historiador escocês com renome internacional e influência política na Grã-Bretanha, em França e nos Estados Unidos. A posição através da qual procura estabelecer originalidade centra-se na ruptura com as explicações usuais, buscando um olhar diferente sobre explicações anteriores. É o que faz no volume que estou a ler.

 

Ainda não cheguei ao final da obra, mas já posso tirar algumas conclusões: o autor questiona todas as homenagens que se fundamentem no heroísmo e nos valores de amor à pátria, nomeadamente na célebre afirmação latina de que É doce e honroso morrer (…); põe em dúvida a justificação para a beligerância britânica ter sido a invasão da Bélgica por tropas alemãs, tal como contesta, também, tantas outras explicações já tradicionais na historiografia da Grande Guerra. Depois, para total espanto meu, propõe-se fazer análises, partindo da posição condicional, ou seja, dito por outras palavras, se tal coisa não tivesse sido como foi como é que teria sido?

Desta maneira, tanto quanto entendo, não se faz História; fazem-se juízos políticos ou, no mínimo, romanceiam-se os factos, baralhando-os de acordo com a vontade do escritor, tornando hipotético o acontecimento e a explicação do mesmo.

 

Claro que a História se refaz e não pode dizer-se que está completa. Este refazer passa por encontrar outras explicações viáveis e verosímeis; jamais poderá ficar à deriva ou sujeito à vontade de quem aborda a temática em análise.

Tentarei explicar melhor o meu ponto de vista.

A verdade, em sentido absoluto, não existe; existem verdades para os acontecimentos que envolvam vários actores. Assim, a verdade de um, quanto à ocorrência em observação, será diferente da de outro, porque os condicionalismos que os levaram a agir de certa maneira são, também eles, diferentes. Deste modo, a história, o relato da ocorrência, terá de levar em conta toda a gama de fios que se entrelaçaram para se chegar ao tecido final.

Levando em consideração o que acabo de expor, conclui-se que a História se refaça com uma só finalidade: explicar melhor todas as condicionantes que determinaram a ocorrência dos factos tal como aconteceram e nunca como poderiam ter acontecido.

 

Vou continuar a ler o livro de Niall Ferguson, com o mesmo entusiasmo com que o iniciei, mas olhando-o criticamente, porque, sendo ele um neoconservador, simpatizante da causa de Marine Le Pen, me faz lembrar aqueles que, por cá, também querem reescrever a História lavando-a da nódoa salazarista. Seja como for, uma coisa tenho-a como certa: a razão da beligerância portuguesa já a expliquei, deixando-a escrita para a posteridade, e fi-lo, sem distorções, através de uma análise das condicionantes nacionais e internacionais da época, não dando origem a anacronismos. Admitindo que possa haver alguma coisa a acrescentar, os acrescentos não alteram a essência do que eu expliquei, pela primeira vez, em Portugal.

 

21.04.20

Fases da minha vida – 6

(Uma estranha figura)


Luís Alves de Fraga

 

Por muito que tenha sido desafiante e encantadora a minha entrada nos Pupilos do Exército, por muito que os condiscípulos do meu tempo e de todos os tempos teçam maravilhas sobre a nossa vivência, a verdade é bem diferente, se quisermos ser completamente honestos.

Realmente, o internato, a nova ordem de vida, o confinamento às paredes do Instituto, a rudeza de tratamento dos alunos mais velhos para connosco, os putos, abria, no mínimo, um desconforto dentro de nós que, em algum momento do dia, vinha tomar conta da nossa mente e gerar aquilo que, diz-se, só há na língua e natureza dos Portugueses: saudade. Às vezes, nem se sabia bem de quê se tinha saudade! Mas ela estava lá e uma certeza foi sendo marcada dentro de nós ‒ de mim: havia que saber viver com essa mazela, transformando-a nisso mesmo: uma mazela tratável de alguma forma!

 

Encontrei a panaceia para o meu mal através do exemplo do meu comandante de pelotão: ir até à capela dos Castros, nos claustros do velho convento, e rezar. Limitava-me a, depois do jantar, passar por lá e orar, da forma aprendida na catequese. Havia, no largo espaço por trás do altar, um armário com livros e ‒ não me recordo como ‒ consegui ler um deles, pequeno em volume, sobre a vida de S. João de Deus. Fiquei deveras impressionado com a personalidade do santo e com a dedicação aos doentes. Isso foi fundamental para aceitar como rumo de vida uma atitude mais cristã e católica no meu dia-a-dia nos Pupilos do Exército.

 

Mas, ligado à Igreja Católica, no Instituto, estava a figura do tenente-capelão Padre Ruy Corrêa Leal ‒ grafado exactamente assim! ‒, filho do general Corrêa Leal, antigo atirador de esgrima, na altura responsável pelo desporto nacional e, creio, pelas representações olímpicas do nosso país.

Era um jovem sacerdote ‒ presumo que ainda não teria trinta anos ‒ sendo uma vocação tardia, pois entrara para o seminário maior por já ter completado o liceu. Como mais tarde pude confirmar, pertencia à clique de apoio do cardeal-patriarca de Lisboa, o salazarista Manuel Gonçalves Cerejeira. Percebia-se, facilmente, que estava fora do seu meio; nas aulas de Moral apresentava exemplos de gente de um nível social muito, mas mesmo muito distante daquele ao qual pertencia a maioria esmagadora dos alunos. Relacionava-se com as senhoras infantas de Portugal, com a condessa, a baronesa e mais não me lembro quem. Era um menino queque como se dizia na data.

Sem qualquer tipo de juízo de valor, limitando-me a dizer o que todos nós víamos, tinha gestos e tiques, aqui e ali, amaneirados.

 

Porque eu era praticante assíduo da capela, o capelão adoptou-me como fiel católico à semelhança do que fazia a mais outros dos alunos frequentadores do rezar o terço após o jantar. Esse facto valia para nós, os mais constantes católicos do Instituto, o epíteto de bufos do padre. Isso incomodou-me até ao meu quarto ano de frequência dos Pupilos, depois já estava suficientemente crescido e antigo na Casa para não mais dar importância a tais arremetidas verbais. Aliás, no final do 1.º ano de Contabilistas (o equivalente ao 10.º de escolaridade) o Padre Ruy propôs-nos, a um pequeno núcleo, a fundação de uma delegação da Conferência de S. Vicente de Paulo, sendo que o nosso campo de actuação seria o do antigo e paupérrimo Bairro do Calhau, bem por trás do palácio da Casa de Fronteira. Fui apontado para o cargo de vice-presidente da dita delegação.

Guardarei para mais tarde descrever o que era e como funcionava a Conferência e de como foi dissolvente de práticas católicas, em alguns de nós, a acção hipoteticamente moral do capelão. Lá irei, lá irei, não pelo prazer de maldizer nem de justificar a minha postura perante a Igreja, mas tão-só de mostrar como um pseudo educador e formador de comportamentos gerou a necessidade de reverter princípios, orientando-os para objectivos bem mais práticos e mais valorosos.

 

Agora, julgo, é preciso deixar bem esclarecido, segundo, está bem de ver, a minha opinião, aquilo a que se chamava bufaria.

Em sete anos de convivência com o capelão nunca ele me perguntou, em circunstância alguma, por informações sobre os meus condiscípulos, nem eu lhos dava se a tal se atrevesse. Mas nunca, repito, nunca houve qualquer tipo de sondagem. Também não me consta que o tenha feito a outros dos restantes alunos católicos e que mais intimidade tinham comigo. Assim, a questão da bufaria só se pode colocar de uma de duas maneiras, separadas ou em conjunto, e que passo a explicar.

Antes porém, devo esclarecer que a minha dedução é feita hoje ‒ e nunca me passou pela cabeça nos meus tempos de jovem ‒ com base na experiência de vida adquirida no contacto com as mais estranhas formas de comportamentos do ser humano.

 

As tais duas maneiras, que posso avançar para justificar a nossa suspeita da existência de bufaria, são as seguintes: uma, as conversas tidas pelo padre-capelão com os oficiais instrutores e professores, que lhe relatavam um ou outro episódio do nosso comportamento, levando-o ao conhecimento daquilo que julgávamos nunca poderia chegar-lhe aos ouvidos, porque passado noutros âmbitos; outra, bem mais grave e mais astuta, terá ocorrido por haver condiscípulos que, sem grande formação moral e, menos ainda, católica, usavam o confessionário ‒ onde iam raras vezes ‒ para se queixarem de alguma coisa ou de alguém. Depois, porque para eles a confissão não tinha valor de sacramento, mas sim valor de instrumento de vingança, para, delatando comportamentos ou, pior, distorcendo realidades, por não serem identificáveis como acólitos do padre, se calhar, porem a circular a ideia da bufaria de modo a preservarem-se de qualquer suspeita.

A Santa Inquisição viveu, quase sempre, de denúncias feitas por invejosos e traumatizados, cobardes e traidores; o mesmo se podia dizer da PIDE/DGS. Hoje sabemos que foi assim. Qual a razão para ser diferente no Instituto dos Pupilos do Exército do meu tempo?

18.04.20

Chamam-lhe guerra?


Luís Alves de Fraga

 

Então comportem-se como se fosse uma guerra!

 

Se fosse um conflito bélico, a dívida iria subir sem parar e sem olhar a impostos futuros e, de certeza, nem seria com impostos que se resolveria a dívida contraída!

 

Eis a razão para a minha discordância das afirmações feitas por António Costa e que transcrevo do Público:

 

«Ainda na entrevista ao Expresso, o primeiro-ministro António Costa afirma que só haverá um Orçamento do Estado suplementar quando houver uma visão sólida das necessidades financeiras do país. E alerta, face aos inúmeros apelos para ajudar famílias e empresas: "Não podemos apoiar ilimitadamente porque é preciso ter consciência de que a despesa de hoje é o imposto de amanhã. É preciso perceber que não é altura de contar tostões para acudir às necessidades da saúde pública, mas obviamente temos de ter em conta que há amanhã."»

 

Temos de ter em conta, isso sim, que necessitamos de uma população a salvo de um perigo invisível e capaz manter poder de comprar para viver.

Ai, Dr. António Costa, cuidado com o que diz!

17.04.20

Fases da minha vida ‒ 5

(Os alunos graduados nos Pupilos do Exército)


Luís Alves de Fraga

 

Não se pense que as fases da minha vida se confinam às lembranças do internato no Instituto onde cresci para a vida! Não. Tenciono ir por aí adiante, recordando o que achar mais interessante e conveniente para dar testemunho do meu tempo. Assim, tudo tem uma fase. Fico-me, por agora, nos meus treze/quinze anos.

 

Que regulamentos informais existiam nos primeiros anos de aluno dos Pupilos do Exército? Quem os ditava? Quem os vigiava?

Umas poucas palavras respondem às interrogativas antecedentes: os alunos mais velhos e os graduados.

Afinal, esses regulamentos informais eram feitos de tradição, tal como o uso de vocábulos só de nós conhecidos (ou quase) ‒ uma tequinha=um bocadinho; cinco lecas=cinquenta centavos; cheirar=ficar sem qualquer coisa; e assim por diante ‒, gerando comportamentos e atitudes próprios e exclusivos.

 

Se é verdade que, de um modo geral, o aluno mais velho era, só por si, um educador, havia certos cargos instituidores dessa responsabilidade pedagógica.

Tentarei hierarquizar essas etapas dos educadores informais.

Os primeiros passos eram dados, mesmo sem ser graduado, como chefe de mesa.

Vou contar.

 

Ali por volta dos quinze/dezasseis anos já se podia ser nomeado, pela hierarquia oficial do Instituto, chefe de mesa.

Cada mesa tinha lugar para sete alunos; o chefe sentava-se a um dos topos e impunha a sua ordem ‒ algumas vezes, nem sempre a mais acertada ‒ aos condiscípulos, como regra, mais novos.

É sabido que é à mesa, no tempo das refeições ‒ para nós sempre rápido, tal o desejo de ir gozar alguns instantes de liberdade ‒ que se aprendem comportamentos e outras instruções.

Dos sete anos de permanência nos Pupilos, tanto quanto me recordo, fui chefe de mesa quatro anos, um deles ainda não graduado.

Confesso, pouco ou nada aprendi com os meus chefes de mesa: o primeiro, porque já estagiário, não almoçava connosco e era o vizinho do lado, o nosso caro Dionísio, quem tomava conta de nós; o segundo foi o Leal ‒ no ano seguinte, comandante de batalhão de alunos ‒, que não atava nem desatava; o terceiro já não me lembro, por isso, também, por não ter deixado marcas, nada me instruiu, até porque já eu tinha idade para não receber ensinamentos ‒ os que me poderia transmitir, entenda-se.

 

Quando me coube a obrigação de chefiar mesas procurei ser pedagógico com os mais novos: explicava-lhes como usarem os diferentes talheres, como descascar a fruta com faca e garfo, como sentarem-se à mesa sem apoio nos cotovelos; desenvolvia conversas que lhes trouxessem qualquer conhecimento adicional e houve um ano que os obrigava a escreverem-me cartas para lhes corrigir a redacção.

 

Os graduados começavam por ser comandantes de secção ‒ três por cada pelotão ‒, comandantes de pelotão, comandantes de companhia e comandante de batalhão. A sua acção pedagógica fazia sentir-se nas formaturas, nas salas de estudo, nas camaratas, exercendo, umas vezes com perfeição e outras não tanto, autoridade para trazer ao rebanho do bom comportamento os mais rebeldes à disciplina.

Está claro que essa autoridade passava, bastas vezes, pelo uso da força física: um tabefe bem assente, uma caldaça, um biqueiro no rabo.

Como regra, não se tratava de violência continuada, mas de uma forma de levar à memorização a não repetição de comportamentos desviantes do padrão comportamental do internato.

Acima de tudo, hoje, com a experiência de vida já adquirida, julgo que a acção pedagógica dos graduados desenvolvia efeitos contrários, embora construtivos, pois, quando era notória a injustiça, levava o injustiçado a, mais tarde, não repetir o comportamento reprovado e, quando era justa, conduzia à aceitação racional da disciplina, gerando tradições, fazendo escola.

Hoje, numa avaliação ponderada, admito sem relutância, que, na generalidade, os graduados eram ‒ pelo menos naquela época ‒ a pedra angular da formação de vários princípios comportamentais: disciplina, camaradagem, solidariedade, emulação, garbo, frontalidade, capacidade de resistência, sentido de grupo ou, se se quiser, de tribo.

 

O meu primeiro comandante de pelotão ‒ o Fernando Gonçalves Roberto ‒ foi marcante para mim.

Nos seus dezassete ou dezoito anos era, assumidamente, católico e respeitado nas suas opções por todos os companheiros de curso. Perante nós, os putos ‒ designação dada aos novos alunos ‒ era como se fosse um irmão mais velho, atento, mas sem pieguices consoladoras dos mais pequenos e saudosos da família e do ambiente das terras distantes, que tinham deixado para trás (convém não esquecer que havia entre nós, os caloiros, meninos com dez anos vindos de tão longe que só nas férias de Verão poderiam ir a casa!).

Olhando o Roberto, com os olhos dos meus treze anos, ele foi o marco mais importante na minha entrada nos Pupilos do Exército, pois tomei-o como exemplo a seguir: era assim, como ele, que eu queria chegar ao penúltimo ano do curso! Assim, seguro das minhas convicções, respeitado pelos meus iguais, exemplo para os mais novos.

Este desejo explica-me, hoje, o comportamento que passei a adoptar nos anos seguintes e a boa camaradagem que cultivei com o Roberto quando ele era já cadete da Escola do Exército (algumas vezes, passámos tardes de domingo a subir e descer a avenida da Liberdade, em grandes conversas sobre comportamentos nos Pupilos).

 

Desses anos que vieram vou ocupar-me em apontamento futuro.

16.04.20

Dívida pública


Luís Alves de Fraga

 

Já o disse e volto a repetir: só aumentando a dívida pública se consegue ultrapassar a crise económica gerada pela pandemia.

Por favor, não me venham com soluções de austeridade! Essas justificavam-se (?) se de uma crise nacional se tratasse, ou seja, se resultasse de um mau governo, de uma falência do Estado. Mas, no presente, estamos em situação de calamidade económica semelhante às que ocorreram após as duas Guerras Mundiais. Ora, assim sendo, o remédio tem de ser semelhante ao que então se utilizou…

 

E o remédio não foi o plano Marshall, como muita gente julga, em relação ao período a seguir à 2.ª Guerra Mundial; o plano ajudou a remontar o sistema produtivo e, consequentemente, a economia dos países europeus, que o aceitaram. Mais, o plano tinha como finalidade resolver a partilha da Alemanha e levá-la a tornar-se num Estado federal e soberano, mas sem intentos hegemónicos na Europa. O plano quis salvaguardar a Europa da influência ideológica da URSS.

 

Se o plano tinha uma finalidade bem definida, subsiste a questão de saber como é que os Estados resolveram o pagamento da guerra, porque ‒ é preciso dizê-lo ‒ a guerra fez-se com dinheiro! A produção das fábricas de armamento, dos estaleiros e as tropas foram pagas com dinheiro; dinheiro que os Estados não tinham e, por isso, pediram emprestado à banca ‒ a banca ganha sempre com as catástrofes.

Então, por um lado, houve uma injecção de dinheiro na economia europeia e, por outro, uma dívida para saldar. E as dívidas só se conseguem pagar se os Estados forem buscar a quem produz ‒ seja o capitalista ou o trabalhador ‒ os meios financeiros para liquidar juros e capital.

 

Acrescente-se que o empréstimo pode ser interno e externo; importante é saber negociá-lo, transformando-o em empréstimo de longo prazo. Deste modo, ganha o credor do Estado, pois recebe durante muito tempo o juro, e o devedor, pois tem margem para refazer o tecido económico e cobrar os impostos necessários para liquidar juros anuais e pagar as fatias negociadas do valor do empréstimo.

 

Portugal tem de pedir emprestado a juro muito baixo e a um longo prazo de liquidação.

É bom não esquecer que a dívida de guerra ‒ da 1.ª Guerra Mundial ‒ da Alemanha a Portugal foi paga há relativamente pouco tempo e que os empréstimos contraídos por Fontes Pereira de Melo, para abrir estradas e lançar linhas de caminho-de-ferro na segunda metade do século XIX, só foram totalmente pagos mais de cem anos depois.

 

Não nos assustemos com a dívida que formos contrair. Assustemo-nos com o refazer da economia, que deverá ser renegociada com Bruxelas, já que será conveniente levar a União Europeia a perceber a importância de possuir uma máquina produtiva tendente a assegurar a autarcia do espaço comunitário.

 

Tenho consciência que tudo o que acabo de afirmar é sabido dos ministros mais esclarecidos do nosso Governo; do que não tenho a certeza é que sejam capazes de se fazer ouvir no areópago europeu, e isso será uma lástima!

15.04.20

O fim da pandemia


Luís Alves de Fraga

 

O mundo, quando a pandemia for dada como extinta, não vai ser muito diferente do que já foi, digo eu!

 

O que está a acontecer é que, em muitos países, de forma dita natural, se expurga a sociedade de pesos mortos, porque improdutivos e pouco consumidores: os velhos!

E a vida continuará a ser igual, e refiro-me ao chamado mundo ocidental, pois, rapidamente, as pessoas sobrantes vão aceitar a engrenagem na qual nasceram e cresceram: a do consumo!

Um consumo justificativo do sistema capitalista em que só contam os lucros das grandes multinacionais, das grandes empresas por onde corre o sangue de todo o sistema: o dinheiro.

 

Esta pandemia veio mesmo a calhar!

Provoca uma paragem para realinhamento da máquina capitalista, sendo que ela mesma faz parte de um todo também virado para a reconstrução renovada do capital, pois gera, na paragem, o desejo incontrolado de consumir e, por conseguinte, voltar ao sistema em reparação.

 

As subtilezas do nosso mundo! A alienação em que vivemos!

14.04.20

Fases da minha vida ‒ 4

(Outra vez a educação)


Luís Alves de Fraga

 

Dedico esta memória/reflexão ao

Coronel João Augusto Miranda Soares

 

Educar miúdos entre os dez e os treze anos de idade à custa de regulamentos militares, já disse, era tudo menos transmitir-lhes valores iguais aos que, usualmente, recebíamos em casa, através dos nossos progenitores. Já disse antes, transgredíamos ‒ uns mais, outros menos ‒ esses mesmos regulamentos.

 

Como estou, por força deste confinamento social, retido em casa e tenho tempo de sobra para meditar, fazendo introspecções quase psicanalíticas, ocorreu-me interrogar-me sobre o que disse no apontamento passado.

‒ Os regulamentos formais, nomeadamente o de Disciplina Militar ‒ RDM ‒ (o antigo) à sombra do qual se decalcavam as nossas normas de conduta, não educavam e não eram instrumentos de educação?

Coloco a pergunta, porque me assaltou a memória uma frase ouvida ao meu pai: «Não preciso do RDM, porque nele estão as mais elementares normas de conduta social, adaptadas à vida militar!»

 

Realmente, nos meus quarenta anos de oficial no activo e na efectividade de serviço, pude verificar que o meu pai tinha razão: o RDM era uma compilação de normas de conduta social, na generalidade, e, em circunstâncias específicas, de conduta marcadamente castrense.

Então, o que eu e todos os meus condiscípulos recebemos foi uma educação militar começada em tenra idade!

Os nossos valores, aqueles de que nos orgulhamos, vêm daí, da educação marcial: verticalidade, frontalidade, lealdade, empenhamento, emulação, vontade, resiliência, ordem, coragem, camaradagem, solidariedade.

Sendo verdadeira a minha dedução, posso e devo acrescentar-lhe o peso de várias outras afirmações contidas no lema e no hino do Instituto. Vejamos as que me ocorrem.

 

Do hino:

«Filhos de Portugal saudemos a alvorada

Que desponta abençoando a nossa Pátria querida

E se por um traidor a virmos atacada

Desprezemos por ela a nossa própria vida»

 

Repare-se neste particularismo tão evidentemente consonante com o juramento de bandeira feito por todo aquele que assenta praça e é soldado: o oferecimento da vida em defesa da Pátria. Nós, muito antes de o fazermos, já o cantávamos ao cantar o hino da nossa Escola! E, mais curioso ainda, é que na formula de juramento de bandeira se refere a Constituição e a República e, no hino do Instituto, se enaltece a República ‒ a alvorada que desponta ‒ e os traidores à Pátria, o mesmo é dizer, os que atentarem, cá dentro ou lá fora, contra o regime republicano e a Nação.

 

Mas, continuando, ainda no hino:

«Ao estudo e ao trabalho producente

Dediquemos com alma e com prazer

Toda a nossa atenção alegremente

Saibamos o Instituto enobrecer»

 

Cá está, quase subliminar, a ordem, o prazer de estudar e de trabalhar, comprometendo-nos com a obrigação de enobrecer aquela que passava a ser a nossa alma mater ‒ a mãe que do seu ubero nos alimentava, preparando-nos para a Vida.

 

Do lema:

E o hino remata com o lema dos Pupilos do Exército: «Querer é Poder».

A frase lapidar que, no fundo de cada um de nós, nos anima, reunindo todos os valores inculcados através de uma cultura castrense, modesta ‒ porque não nos exalta como uma elite, filhos de uma elite, antes como pupilos do Exército, como filhos de Portugal ‒, modesta, dizia, mas laboriosa, pois só pelo trabalho honramos, enobrecemos, a Casa materna.

 

Como as palavras têm a força das pequenas gotas da chuva, que se transforma em rio e de rio em mar, acabei por prometer falar de modelos e de regulamentos informais defendidos pelos alunos mais velhos e graduados do meu tempo e fiquei-me, se calhar, por redundâncias, que a poucos interessam. Contudo, se os meus leitores mais velhos, os que não passaram pela minha experiência educativa, pensarem um pouco e analisarem os fins da Mocidade Portuguesa ‒ obra do regime salazarista ‒ perceberão a imensa distância ideológica que separava o espírito dessa organização fascizante do daquela onde eu tive o prazer e a honra de me formar: para nós a Pátria tinha um nome ‒ Portugal ‒ para a Mocidade Portuguesa, o nome era Salazar.

13.04.20

Fases da minha vida ‒ 3

(À procura de modelos)


Luís Alves de Fraga

 

Na falta de uma acção educativa por parte dos professores e de todos os militares e civis colocados nos Pupilos do Exército e com responsabilidades sobre os alunos, a educação, o mesmo é dizer, a aprendizagem de comportamentos, de valores sociais e morais tinham duas origens, nos tempos em que por lá andei: nos regulamentos formais e oficiais determinantes da disciplina e nos regulamentos informais estabelecidos pela tradição e transmitidos pelos alunos graduados e/ou mais velhos.

 

Pode parecer relativamente fácil impor as normas disciplinares formais a crianças entre os dez e os doze/treze anos de idade, mas, na realidade, será que era?

Ao olhar para trás é esta a pergunta que se me avantaja na mente, pois quase garanto o contrário.

Na verdade, aprendi/aprendemos a cumprir regras estabelecidas contra punições que temia/temíamos. Mas muitos de nós, mantendo uma aparência disciplinada, fazíamos coisas que representavam a mais absoluta revolta contra uma educação que era só punitiva (não foi por acaso que Alexandre Cabral, ex-aluno, escritor e ensaísta de renome sobre Camilo Castelo Branco ‒ hoje já quase esquecido ‒ intitulou o livro memorialista com o sugestivo nome de Malta Brava). Exemplifico.

 

Quem, do meu tempo, não se lembra de conseguir a chave da cozinha ou do depósito de géneros e ir, fora de horas, quando tudo já estava em pleno sossego, assaltar esses lugares cheios de aventura, mistério e ousadia para se banquetear com belos nacos de chouriço ou queijo ou fosse o que fosse? Quem esqueceu as entradas em zonas proibidas e perigosas (por exemplo, o coro da igreja anexa, caminhando pelo saliente junto ao começo da abóbada) só pelo prazer de contraditar a ordem estabelecida? E, mais simples, muito mais simples, profanar a capela dos ossos? Ou, coisa quase inocente, sair pela mina que dava acesso ao sopé da serra de Monsanto? Ou saltar o muro, lá no canto direito, atravessando a ribeira com risco de meter as botas na água imunda, só para ir ao cinema, em Benfica? Ou, todas as manhãs, levantar-se quando faltavam só cinco minutos para dar entrada na sala de estudo? Ou fumar o cigarrito na zona das retretes?

Eram infracções à disciplina imposta e estabelecida; eram motivos para ser punido, do mesmo modo que o era chegar tarde a uma formatura ou faltar a uma aula sem justificação muito justificada.

Foi-nos ensinado que a vida se vive com regras e normas e directivas; nós aprendemos que as regras, as normas e as directivas podem não ser cumpridas desde que se esteja disposto a correr um de dois riscos: ser punido e ser apanhado em mentira.

 

Seríamos, afinal, tão malcomportados?

Não. Nem pouco mais ou menos! Tínhamos de ter escapes para suportar uma educação impessoal; tínhamos de transgredir em alguma coisa para afirmarmos a nossa individualidade, a personalidade que nos dominava. E, para tal, tínhamos de ter padrões, modelos ou paradigmas que nos ajudavam a formar a personalidade.

Este processo era/foi muito complicado. Para mim, acabou por se tornar simples, pois a idade de entrada possibilitou-me queimar etapas. A explicação passa pela análise dos regulamentos informais, referidos no início.

Mas isso fica para o próximo apontamento.

12.04.20

Fases da minha vida – 2

(Primeiros passos nos Pupilos)


Luís Alves de Fraga

 

Entrei para o Instituto dos Pupilos do Exército nos primeiros dias de Outubro de 1954, para o, então chamado 2.º ano do ciclo preparatório, porque, no ano anterior, não houve vagas suficientes e, por pouco, fiquei de fora.

A minha irmã havia casado em Setembro e os meus pais foram passar férias para o Monte no mesmo mês em que eu mudei de vida.

 

Não tinha consciência de terem decorrido menos de dez anos sobre o fim da 2.ª Guerra Mundial (para nós, em jovens, dois ou três anos é uma eternidade!) e, por conseguinte, das dificuldades que se faziam sentir na sociedade portuguesa. Isso, contudo, reflectia-se nos Pupilos: ainda havia austeridade especialmente notada na alimentação. Mas lá chegaremos…

 

Olhando à distância de mais de sessenta anos para aquele estabelecimento de ensino, a grande crítica a fazer aponta para o facto de estarmos, realmente, muito sozinhos, muito entregues a nós mesmos.

Vou tentar ser mais explícito.

Os professores, na maioria esmagadora, eram oficiais do Exército que davam aulas ‒ às vezes, sabe Deus e Deus sabe, sem a menor vocação para o ensino ‒ de todas as disciplinas. Nos chamados Trabalhos Manuais havia um mestre, normalmente homem de poucas letras mas muita prática, que tentava fazer dos mais desajeitados ‒ como eu ‒ tipos capazes de saber pegar numa lima, numa plaina, num esquadro para fazer qualquer coisa, em madeira, com forma e feitio.

 

Não havia, nessa altura, uma relação com os docentes que fosse para além de explicar e aprender as matérias. Não havia um conselho; às vezes ‒ e não poucas ‒, ouviam-se reprimendas. Notavam-se tiques (havia aquele major que, todos os anos, para explicar o movimento do pêndulo, dava, com o ponteiro, uma cacetada no candeeiro do tecto… esperávamos que o globo se partisse ou tudo aquilo saltasse e viesse cair em cima de algum de nós!).

Para além dos professores e mestres éramos enquadrados por oficiais com funções específicas: comandante do corpo-de-alunos, comandantes de companhias de alunos e outros oficiais que, por serem instrutores de educação militar e educação física ou desempenharem funções administrativas, faziam serviço de dia (vulgo oficial de dia). Ora, acontecia que nem mesmo os comandantes de companhia ‒ estou a lembrar-me do capitão Uva, por exemplo ‒ exerciam, quando entrei, qualquer tipo de acção pedagógica sobre os novos alunos. Havia, depois, uns sargentos com cargos nas companhias de alunos ou noutros departamentos que, também eles, não transmitiam mais do que o receio de uma participação no caso de estarmos a cometer qualquer tipo de falta.

 

Em face disto ‒ que foi exactamente assim durante, pelo menos os três primeiros anos de sete que por lá andei (note-se, entrei com treze anos para aquilo que hoje é designado por sexto ano de escolaridade) ‒ cabe aqui a pergunta:

‒ Que educação me foi transmitida no Instituto dos Pupilos do Exército, por quem e como?

 

Julgo, é a primeira vez, que vou tão fundo na análise dos tempos iniciais de internato. Assim, resta-me dizer que havia recebido, em casa, suficientes princípios educativos, mas ia entrar na adolescência e era ainda tempo para aprender muito sobre como viver. Como é que o fiz?

Explicarei no próximo apontamento.

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