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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

26.06.19

Amigos


Luís Alves de Fraga

 

Ontem, de uma assentada, tive oportunidade de ver, abraçar e cumprimentar um significativo “punhado” de amigos de juventude e esse facto deu-me para, depois, ficar a pensar sobre o assunto.

 

Desses companheiros de sete anos de convívio diário ficaram-me excelentes amizades, daquelas que são para toda a vida; outras que foram magníficas e, em dado momento, por este ou aquele motivo, esmoreceram e passaram a um limbo asséptico, comparável a um frasco de formol, onde repousam com as mesmas características que tiveram há mais de cinquenta anos; outras, ainda, como certos vinhos, “viraram” vinagre e só resta a “garrafa”, ou seja, a aparência de uma amizade, alterada numa incompatibilidade de entendimentos; por fim, outras transformadas, com o passar dos anos, em meros conhecimentos, sem possibilidade de “recuperação” para além de aperto de mão, do “estás mais velho”, ou do “estás mais barrigudo”, ou de “o que tens feito?”.

 

As amizades regam-se, cultivam-se, alimentam-se e só assim se conservam ou crescem. Mas, tudo isto, dentro e respeitando as características comportamentais de cada um. Há momentos nos quais se percebe que, por muitos esforços feitos, a vida, as mudanças sociais, profissionais ou familiares interferem no crescimento e aprofundamento da amizade. Recordo dois companheiros desse tempo juvenil que, mantendo a amizade até quase aos trinta anos de idade, depois de casarem, talvez influenciados pelas respectivas consortes, se afastaram de todos os convívios, acabando por transformar a nossa amizade numa simples lembrança deslaçada de toda a realidade actual. E rememoro o caso de alguém que, por se centrar excessivamente à volta do seu umbigo, gerou incompatibilidades quase impensáveis e uma delas foi comigo.

 

Felizmente, houve amigos que, ano após ano, souberam manter os laços de união e acabámos por os aprofundar a um ponto tal que “subiram” do patamar da amizade para o da familiaridade. E, a um desses, apresentava eu, hoje, telefonicamente, o meu pedido de desculpas por algo que se passou ontem – coisa sem importância de maior, mas suficiente para gerar pequeno melindre – e recebi de resposta a condenação das minhas desculpas, porque eu apresentar-lhas é que o magoava. Generoso, como sempre, esse meu amigo teve de concordar comigo quando lhe respondi que o meu cuidado era ditado pela amizade, porque esta alimenta-se de pequenos gestos. Não se trata de boa-educação; trata-se cuidados.

 

Felizmente, tenho bons amigos.

25.06.19

A repensar


Luís Alves de Fraga

 

Desde que se formou o entendimento parlamentar entre o PS, o PCP e o BE tenho sido um fiel defensor deste procedimento, porque, declaradamente, Portugal ganhou com tal táctica política.

Nunca me interessou se ganhava um dos partidos referidos; interessou-me o que nós todos podíamos ganhar. Por conseguinte, fica bem claro que não estou a defender nenhum dos três agrupamentos políticos. Estou interessado na continuidade da solução encontrada. Mas isso pressupõe cedências entre os três. Cedências que não se verificaram – algumas – no passado e não se estão a verificar no presente.

 

Sei o suficiente de macroeconomia para perceber a importância das medidas adoptadas para garantir a manutenção dos grandes indicadores de uma saudável gestão nacional. Mas também sei da existência de uma coisa chamada inflação – fenómeno resultante de atitudes internas e de acções externas – que faz reduzir, em cada mês, o poder de compra de todos nós. E sei que, entre outros processos, a inflação pode ser combatida de uma de duas maneiras: aumentando os salários – método galopante, solucionando o problema no momento, mas arrastando-o para o futuro com mais gravidade – ou redução dos impostos, em especial, os indirectos – processo capaz de fazer aumentar o consumo e, consequentemente, melhorar a economia, pois as famílias passarão a poder gastar mais.

A última solução, parece-me, seria a mais indicada para Portugal, dada a elevada carga fiscal que recai, cegamente, sobre todos os consumidores, prejudicando, em especial, os que têm menores rendimentos.

 

Os sinais dados pelo Governo vão no sentido de aumentar a função pública para, por arrasto, obrigar ao aumento dos salários no sector privado, mas mantendo a mesma carga fiscal. Ou seja, a inflação não é travada, mas convidam-se os agentes económicos a aumentá-la, por via do aumento salarial.

Vamos a um exemplo.

Quando foi decidido baixar o custo dos passes sociais as famílias fizeram um “encaixe” financeiro que lhes deu margem para outros gastos; repare-se no valor do “encaixe” se se baixassem ou os escalões de IRS e os escalões de IVA; as famílias iriam sentir mais disponibilidade e, consequentemente, mais capacidade para todo o tipo de consumo.

 

Não adoptando estas medidas, ou semelhantes nos seus efeitos, o Governo começa a obrigar-me a repensar a minha posição de simpatia, levando-me a ter de ponderar a possibilidade de o criticar mais sistematicamente, porque há uma coisa que se nota todos os dias: o aumento do valor deixado no supermercado, nos chamados serviços mínimos, na saúde e na educação. E não me obriguem a criticar o aumento de turismo, porque, parece-me, a inflação está a crescer, em consequência de certos agentes económicos verem no aumento dos produtos mais uma forma de satisfazer a sua gula lucrativa.

A continuar assim, parece-me, António Costa, Centeno e os restantes membros do Governo perdem um simpatizante. Ai perdem, perdem!

23.06.19

Museu Militar de Lisboa


Luís Alves de Fraga

 

Ontem voltei, uma vez mais, entre duas dezenas, ao Museu Militar de Lisboa, em particular à sala reservada à Grande Guerra.

Recordo-me de, em garoto, visitar o mesmo espaço e aquilo ser, realmente, um repositório bem organizado de artefactos e fotografias relacionados com a nossa participação na Grande Guerra. Talvez um pouco cheio, mas, agora, em oposição, está demasiado nu.

 

Olhando com atenção o material exposto, não se percebe o que foi o esforço nacional em França, Angola e Moçambique. Uma pobreza franciscana.

Exageradamente, duas peças de artilharia 7,5, uma metralhadora ligeira Lewis, uma metralhadora pesada Vickers, um manequim fardado, e com o célebre pelico alentejano para enfrentar o frio, e pouco mais, em vitrinas quase vazias. Em excesso estão as espadas de generais, as condecorações. A sala vale muito pelos imensos quadros de Sousa Lopes, de um realismo impressionante e por uma pequena escultura metálica representando a bravura de colocar em bateria, de baixo de fogo, uma peça 7,5 puxada por muares.

 

Cem anos depois do esforço político e militar da beligerância portuguesa no grande conflito mundial de 1914-1918 são as autoridades nacionais que apoucam o esforço dos nossos “serranos” em França e nas colónias de Angola e de Moçambique. Pelo menos, até ao começo da década de 60 do século passado, ainda havia memória museológica do empenhamento no conflito, mas, parece, a guerra colonial, à boa maneira fascista, veio “apagar” a História republicana da beligerância portuguesa e, sem darem por isso, os responsáveis de agora continuam essa desmemória, que não nos dignifica.

 

É tempo de fazer alguma coisa.

Museu Militar sala Grande Guerra.jpg

(Fotografia retirada da Internet, crédito do "Adriano´s Blog")

21.06.19

Ritos


Luís Alves de Fraga

Cada vez que assisto a uma cerimónia católica - fui católico praticante na minha juventude - percebo que todo o ritual, incluindo as preces, se assemelha ao praticado pelos povos primitivos de que nos chegaram notícia histórica. Ao praticado pelos anglicanos, ortodoxos, islâmicos, budistas, animistas e quejandos.

A única "Fé" que brota dentro de mim - tão diferente da da minha juventude - é a de que deve haver quem reja a harmonia universal e que tudo ISTO não resulta simplesmente de fenómenos químicos, físicos e astrofísicos. E esse quem não deve carecer de sacerdotes e de crentes que o amarrem, o aprisionem em ritos e em religiões. Esse quem merece que o contemplem e admirem de uma maneira oposta à harmonia que ele nos mostra. Ele não se deve importar com a anarquia da nossa veneração... se calhar, essa anarquia é profundamente harmoniosa para ele.

Nos templos católicos - os únicos onde tenho entrado ultimamente - deixem-me não dizer aquelas palavras e não fazer aqueles gesto, para ter oportunidade de gerir as minhas dúvidas e a minha sensação de pequenez.

19.06.19

Aumento da Função Pública versus redução de impostos


Luís Alves de Fraga

 

Ontem vi e ouvi o causídico, virado comentador televisivo, José Miguel Júdice fazer os seus habituais “comentários”. Não vou perder tempo – até porque era, de facto, uma perda de tempo – a caracterizar politicamente o “falador” – perdão, comentador – pois toda a gente sabe tratar-se de um homem de direita, a defender ideias de direita. Esconde mal as suas tendências políticas. Vou, simplesmente, apegar-me a uma afirmação por ele classificada como uma “recuperação” do desastre que foi a votação no CDS, feita por Assunção Cristas.

 

Disse Miguel Júdice que o partido da direita parlamentar se posicionou, novamente bem, perante o eleitorado, quando, em oposição ao anúncio de António Costa mandar aumentar os funcionários públicos, Assunção Cristas propõe, em alternativa, a baixa dos impostos. Júdice, como causídico experimentado, está, como sempre se faz em tribunal em face de uma causa perdida, a tentar “tapar o sol com uma peneira”! Está a colocar “vaselina” na ideia de Assunção Cristas para que escorregue melhor na onda de populismo que resta à direita. Vejamos.

 

Qual foi a receita de António Costa para, contrariando a política Passos Coelho, conseguir uma recuperação da economia nacional? Foi somente, aumentar o poder de compra dos Portugueses, ainda que aumentando alguns impostos indirectos.  Isso resultou!

Resultou, porque o que faz renascer a economia é o aumento do consumo, mesmo que haja um aumento de alguns impostos, porque há que contar com o efeito psicológico de o consumidor sentir, no início do mês, que tem mais dinheiro na mão. Mais dinheiro é igual a mais gastos e, mais gastos, é igual a maior consumo e, maior consumo, é igual a maior estímulo na economia e, maior estímulo na economia é igual a mais impostos que o Estado arrecada, donde, mais possibilidade de reduzir o deficit e mais facilidade de pagar empréstimos e, mais pagamento de empréstimos é igual a menor quantidade de juros a pagar aos credores do Estado. Por arrasto, a um aumento dos funcionários públicos corresponde um aumento dos salários nas empresas privadas, que os podem pagar, pois a produção começa a aumentar em função do aumento da venda.

Isto é o B A-BA da macroeconomia!

 

Vejamos a proposta de Assunção Cristas tão aplaudida por Miguel Júdice.

A uma redução dos impostos o dinheiro “cresce” ou “sobra”, no final do mês, nas mãos de quem ganha para poder pagar impostos… nas mãos de quem não paga ou paga uma taxa reduzida de impostos ele não cresce! E uma redução de impostos beneficia os produtores e os grandes pagadores de impostos que, esses sim, passam a poder comprar mais, mas prejudica o Estado, porque, recebendo menos impostos, as consequências a médio e longo prazo, impedem os benefícios por mim já referidos anteriormente.

Como se vê, a proposta vinda do CDS é populista e lesiva da comunidade nacional. Representa a criação de excelentes oportunidades para, conquistado o poder, reduzir ainda mais os salários dos trabalhadores e aumentar os benefícios dos empresários.

 

Com comentadores do calibre de José Miguel Júdice bem podemos “limpar as mãos à parede”, porque, não explicando nada, caminharemos alegremente para o abismo.

18.06.19

A técnica e a cultura


Luís Alves de Fraga

 

Cada vez mais vou sentindo que os jovens técnicos se apresentam melhor preparados para enfrentar os desafios da modernidade, seja na área das chamadas “ciências exactas” como na das “ciências sociais e humanas”. Em abono da verdade, os primeiros enfatizam a importância dos seus saberes numa disputa entre o raciocínio preciso e o espírito especulativo dos segundos, mas tudo isso se vai esbater quando perceberem a interdependência de conhecimentos… Contudo, a dificuldade está no percurso a fazer até lá, porque esse “caminho” é trilhado através de algo que se chama vida e cultura!

 

E o que é, neste caso, “cultura”?

É a percepção de que a Ciência é una e única, pois, só por conveniência, ela se separa em “ramos”. Trata-se de uma conveniência assente no utilitarismo da aprendizagem, porque cada vez é maior a complexidade das “especialidades” da Ciência. Vai muito longe o tempo do “trivium” (lógica, gramática e retórica) e do “quadrivium” (aritmética, música, geometria e astronomia), abarcando “todos” os saberes de então. O século XVIII aniquilou de vez este limitado conhecimento, caindo no exagero do enciclopedismo, para definir e compartimentar, depois, uma vez por todas, as matérias condutoras à modernidade e à Revolução Industrial. A “Revolução Cibernética” acabou por gerar a tal sensação de que, para além do que se estuda com exactidão, não “há mais mundo” científico, só se apercebendo do irrealismo desta postura intelectual aqueles que se dedicam à investigação especulativa.

 

Por felicidade minha – às vezes sentida como uma infelicidade – fui obrigado a estudar, quase em simultâneo, desde literatura, a língua inglesa, francês, matemática, contabilidade, cálculo comercial e financeiro, direito comercial, economia política, filosofia, lógica, geografia, história, física, química, física geral, geometria descritiva, matemáticas gerais, armamento, táctica, estratégia, transmissões, química dos explosivos, fortificações militares, matérias-primas, técnicas de venda, topografia, motores de explosão, finanças públicas, estatística; depois, já voluntário, estudei ciência política, sociologia, antropologia, geopolítica, geoestratégia, história militar, relações internacionais, direito internacional e mais uma multiplicidade de “histórias” e de outros saberes. Foi isto que me deu a completa percepção de que a Ciência é una e que as rivalidades entre sectores do conhecimento não têm sentido, porque o fundamental é ampliar horizontes, articulando o saber de uma forma lógica para perceber a plasticidade da vida em sociedade.

 

Se é verdade que, agora, mal me recordo do que são as derivadas, o cálculo vectorial, os limites de uma função, o número imaginário, as matrizes, os integrais, o seno, a co-tangente, o triângulo esférico, o foco, a corrente alterna ou a lei da atracção universal, não é menos verdade que tudo isto e muito mais converge, na minha mente, para possibilitar raciocínios amplos e lógicos tendentes a perceber a razão de determinados fenómenos sociais acontecerem com maior ou menor frequência e merecerem, ou não, ficar explicados na História para os vindouros enxergarem um passado que, no mínimo, os moldou e ajudou a ser como são.

 

Eis a razão, porque não gosto do elogio de um só saber ensinado em um só lugar. A emulação é boa quando usada dentro de certos limites.

17.06.19

O saber parasitário


Luís Alves de Fraga

 

Da minha longa experiência docente tenho recolhido ensinamentos, no mínimo, curiosos, mas bastante úteis. Hoje dissertarei sobre um deles: a aquisição do saber.

 

Sem entrar em pormenores científicos, para não cansar os leitores, julgo poder dividir essa coisa que se chama “aquisição do saber” em quatro formas distintas, mas complementares: a que se faz através da socialização, a que se faz por autodidactismo, a que se consegue por acção escolar e a que se adquire por parasitismo.

 

O Homem, ao nascer, não sabe nada, ao contrário de todos os outros animais. O ser humano aprende quase tudo o que lhe é necessário para sobreviver com a sociedade, seja na célula mais minúscula – a família – seja nos mais complexos ambientes; vai-se conformando com as regras ou rebelando com algumas – neste caso, fica sujeito às sanções de ordem jurídica ou de ordem moral – mas sempre aprendendo. A sociedade, sendo absolutamente indispensável ao Homem, condiciona-o e, por conseguinte, “educa-o”, porque a educação é, na verdade, um processo de condicionalismo comportamental (a conduta exterior passa pela “ordem” em que se põe o conduta mental).

Esta aquisição de saberes imposta pela sociedade é aquela que acompanha o Homem por toda a vida. E que ninguém se diga capaz de lhe fugir.

 

A aquisição de saberes por autodidactismo não é só aquela que passa pelo estudo voluntário de determinadas matérias, como muita gente julga. É autodidacta aquele que lê o jornal, vê a televisão, vai ao cinema, lê romances, frequenta museus e exposições de pintura, fotografia, escultura e outras manifestações ditas artísticas, vai a concertos musicais. Isto é autodidactismo, porque todos temos a oportunidade de escolher ver, estar e ouvir, mas só alguns fazem um esforço no sentido de adquirir mais conhecimento, ou seja, adquirir mais saber. Erradamente, ou por mera conveniência, julga-se somente autodidacta aquele que estuda uma determinada matéria. Não é autodidacta quem se fecha a qualquer tipo de aprendizagem para além daquela que lhe foi transmitida socialmente.

 

A aquisição de saber através da via escolar é, nos dias de hoje, a par da socialização, a mais comum. A obrigação de alfabetização leva a que as crianças sejam entregues à acção dos professores para aprenderem – às vezes de formas incorrectas ou incompletas – os elementos essenciais para a aquisição de outros saberes. Claro que a escolaridade também faz parte da socialização, mas visa orientar os jovens para patamares mais complexos do conhecimento. Está na mão deles aceitarem e quererem progredir. A escolarização prepara os jovens para uma integração na vida social e laboral. Não os pode obrigar, mas pode despertar-lhes o gosto para a via do autodidactismo.

 

Chegado a este ponto, apetece-me perguntar: «Qual a razão de se adquirir saber?».

A resposta, julgo, situa-se em dois planos: o primeiro, para se sentir melhor na sociedade, para saciar a vontade de compreender o que se passa à volta – e a isto chamo realização pessoal –; o segundo, para, realizado socialmente, transmitir aos outros – sejam amigos, familiares ou desconhecidos – novos saberes, novos conhecimentos. É, por via desta última razão, que me surge a aquisição de saber parasitária. Vejamo-la.

 

Quando alguém, pouco sabedor de determinado conhecimento, procura quem saiba muito mais sobre o assunto e lhe suga – com simpatia ou não – a informação para ir, logo de seguida, “desfazer-se” dela junto de gente ignorante, passando a ser identificado como um “especialista”, esse alguém é simplesmente um parasita do saber de quem pediu ajuda. Parasita, porque não se esforçou para adquirir a erudição, mas surge como detentor dela. E será tanto mais explorador do saber alheio quanto mais esconder a origem da sua ilustração. Trata-se, claramente, de uma forma de plágio tão condenável como a cópia, palavra a palavra, de um texto escrito.

 

Ora, digam-me se é ou não complexo este tema do saber!

14.06.19

Cobrança de impostos e tribunais


Luís Alves de Fraga

 

A notícia, já quase esquecida, da “cobrança à mão armada” feita pela autoridade fiscal, numa estrada lá do Norte, serve-me de mote para o apontamento de hoje.

 

No plano jurídico, como temos visto, são dadas garantias de defesa aos réus, podendo verificar-se a nulidade do processo por ultrapassagem do tempo previsto para sentenciar em definitivo. É a política do “quanto mais tarde, melhor”! Uma sentença definitiva adiada acaba por adiar muita coisa e muita justiça. Mas a cobrança adiada de uma dívida ao Estado, essa, não pode nem deve verificar-se. Tem de se cobrar, nem que seja um cêntimo!

 

Há aqui, como se percebe sem grandes explicações, uma descarada dicotomia: os tribunais estão peados porque, “in dubio pro reo”, mas as Finanças têm mão livre, sem dúvidas, para penhorar em caso de dívida.

Ah, mas da dívida não restam dúvidas! Há a prova: a falta de pagamento de uma obrigação fiscal.

Pois é, mas a entidade que é tão lesta para cobrar dívidas é a mesma que admite toda a morosidade em condenar o réu. Essa entidade chama-se Estado.

Pode perguntar-se: «Mas não está certo?».

Claro que não está! Não está, porque o Estado, no caso da dívida, age em nome do colectivo, isto é, em consequência de uma fuga à contribuição individual para o sustento da comunidade; todavia, no caso do crime, deixa arrastar a sentença em nome da defesa individual, não levando em conta que o réu é-o por “ofensa” às normas do comportamento colectivo. Ou seja, numa vez prevalece a “ofensa” ao colectivo e na outro não. Isto não é justiça social, mas justiça de interesses e conveniências!

 

Da mesma forma que o Estado é rápido a cobrar dívidas deveria sê-lo a sentenciar o réu. Ambos começavam por pagar o que deviam à sociedade e, só depois, haveria lugar a recurso nas respectivas situações (no caso de o sentenciado juridicamente se achar injustiçado ou do devedor sentir que não devia).

 

Pode parecer um preciosismo a discussão deste assunto, mas não é, pois, se o Estado optasse por agir de igual modo, dava de si uma imagem de verdadeira equidade. E a democracia, cada vez mais, carece de se credibilizar em Portugal.

13.06.19

O discurso


Luís Alves de Fraga

 

Por norma, sou prudente e moderado nas análises políticas que faço e torno públicas. Eis a razão para não me ter pronunciado, logo a correr, sobre o discurso de João Miguel Tavares, feito no dia 10 de Junho.

 

Comecemos pela nomeação.

O Presidente da República escolheu alguém sobre quem recaíam “suspeitas” da esquerda por se tratar de um jornalista com posições conotadas com a direita. Isto já o colocava na “rampa inclinada” da apreciação.

 

O conteúdo.

Li, com cautela, o discurso e, em uma primeira apreciação, não lhe achei “pecado” notável; é emotivo, tenta gerar um clima de identidade com toda a gente, é crítico com os políticos – estabelece as distâncias comummente criadas pelos cidadãos vulgares quando falam de quem nos governa ou está dentro da esfera dos poderes do Estado –; tenta apelar para um “caminho” comum; condena a corrupção; fala da interioridade; refere os desejos vulgares de qualquer pai; traça de maneira tosca as diferenças estabelecidas pelo rodar dos tempos; refere esperanças que andam um pouco na boca de toda a gente; enfim, é o discurso da trivialidade. É o discurso do “homem da rua”; não é o discurso do intelectual, seja sociólogo, historiador ou filósofo.

 

As críticas

Li críticas e ouvi-as. Das escritas, realcei duas ou três de gente que me merece crédito; das ouvidas, tomei boa nota do que se disse na televisão, no tal programa que era a “Quadratura do Círculo”. Aqui geraram-se-me fortes dúvidas. Explico.

O João Soares – que não é parvo e tem posicionamentos correctos no entendimento com a restante esquerda – fez uma leitura sem preconceitos nem juízos de exagerada condenação; o José Pacheco Pereira – um crítico e intelectual que admiro – fez uma leitura rebuscada, mas assente em bons princípios do que é a enviesada política praticada por alguns dos nossos mais destacados estadistas. Ele admite que a escolha de João Miguel Tavares foi uma “jogada” do Presidente e que todo o discurso “cheira” a “bafio” de um passado com mais de quarenta e cinco anos; um discurso a desligar os políticos dos eleitores e a apontar para um rumo, quando a democracia não tem rumo, porque se constrói momento a momento.

 

A minha posição.

Estabelecendo o cômputo de como interpretei o discurso, das críticas lidas e ouvidas, sinto-me tentado a admitir que houve, realmente, “manha” na escolha do orador, mas que este gorou completamente as expectativas do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, pois não teve a arte de fazer passar mensagem nenhuma, por muito subliminar que ela fosse. A única crítica válida, para mim, é a que se faz quanto à escolha do jovem orador, porque tudo o que foi dito sobre o discurso é fruto das distorções ditadas pelas posições do ou dos críticos. Faltou “golpe de asa” a João Miguel Tavares, voou rasteiro e pelo meio do diz-se diz-se vulgar; não há, de facto, mensagem nenhuma nas suas palavras, porque só há vulgaridades incapazes de criar uma plataforma donde a direita se possa lançar ou construir uma rampa para novas “aventuras”.

12.06.19

Responsabilidades do Estado


Luís Alves de Fraga

 

Muitas vezes, vimos na televisão ou ouvimos na rádio, cidadãos comuns ou gente muito esclarecida reclamar contra o facto de o Governo não tomar medidas tendentes a resolver esta ou aquela situação criada dentro de um organismo estatal. Como consequência, há quem mova processos judiciais contra essas entidades, sendo que a resolução dos tribunais demora anos a ser tomada.

Vamos lá analisar o sistema de “culpas”.

 

Se é do domínio público o mau funcionamento de um organismo estatal, a primeira entidade a ter de tomar decisões – sejam sob a forma de inquérito sejam sob a forma de normas jurídicas – é, sem sombra de dúvida, o Parlamento. Dentro deste, a iniciativa terá de caber ao grupo ou grupos parlamentares que apresentam a solução mais capaz de gerar um melhor funcionamento. E deve ser o Parlamento a exigir a imediata execução por parte do Governo. É assim que a democracia tem  de funcionar. Mas não funciona. E porquê?

 

Porque entre o Governo e o Parlamento há um “código de bloqueio”, pois os partidos da família política governamental estão no hemiciclo para dar cobertura ao Governo e nunca para o porem em causa. Este é o primeiro erro da nossa democracia.

Depois, por iniciativa governamental ou parlamentar, a legislação existente procura dar, até ao extremo dos extremos, todas as garantias de prova de inocência a todos os réus sujeitos a julgamento. Este sistema conduz, invariavelmente, ao arrastar da decisão jurídica por anos e anos, facto que leva a “atafulhar” os tribunais com processos conduzindo-os à paralisia.

Vê-se, assim, claramente, que os três poderes do Estado se conluiam para gerar “apoios” entre si, escondendo-se atrás da necessidade de oferecer “garantias” aos demandados judicialmente, quando, em última instância, o que o Estado está a fazer é “lixá-los” de toda a forma e feitio!

Isto não é democracia… isto é autocracia estatal!

 

Queremos democracia? Então exijamos o fim da disciplina partidária e a liberdade de votação dos deputados no Parlamento, pois cabe-lhes representar-nos, defendendo-nos, e não, como se faz agora, defender o Governo, através de maiorias e de votações maioritárias! Isto é uma grave distorção da democracia que, se bem analisada, corresponde, afinal, a um sistema ditatorial semelhante a qualquer um que dependa de um partido único!

Na verdade, os deputados, no Parlamento, não nos representam! Representam e defendem os interesses declarados e os interesses secretos dos partidos! Tal como está o Estado raras vezes tem responsabilidades.

 

Saibamos exigir o fim da disciplina de voto no Parlamento!