Cá e lá: eleitores e abstencionistas
Mais uma vez, em Portugal, o eleitorado demonstrou, de modo inequívoco, que se está nas tintas para a Europa e para a União Europeia. O aumento do nível de abstenção prova-o. Claro, também se pode dizer ser este acréscimo de não votantes uma resposta à política levada a cabo pelo Governo, mas quando grande parte da campanha foi “nacionalizada”, girando menos à volta da Europa e mais em torno da política portuguesa, a justificação aponta para o desinteresse pelas questões da União. A oportunidade para “castigar” o governo existia, votando nos partidos da direita (PSD e CDS) ou dispersando o voto pelos pequenos agrupamentos. Mas não foi isso que aconteceu.
O maior dos espantos foi a votação no PAN, segundo as televisões e os comentadores de serviço. Julgo, contudo, esse resultado deve-se exclusivamente ao voto de descontentamento nos restantes agrupamentos políticos, já que o PAN se apresenta sem um verdadeiro plano político nacional.
Outra surpresa foi a descida considerável do PCP, mas tenho, para mim, uma explicação: a falta de “plasticidade” daquele partido. Com efeito, a sua ortodoxia ideológica não lhe tem favorecido o discurso. Por mais que alguns teóricos marxistas digam o contrário, o tempo do “comunismo”, traçado segundo o modelo soviético, já passou e o PCP não se actualizou, não se desligou do velho modelo. Não o fez para não perder eleitorado, mas, não o fazendo não renova, substancialmente, o número de simpatizantes e de aderentes, restando-lhe os “velhos fiéis” de outros tempos, gente já no fim da vida. Parece-me, o PCP tem de se repensar, pois quanto mais próximo se mantiver do PS em rivalidade com o BE – marxista, também, mas sem apregoar ortodoxia – mais tenderá a perder adeptos, os quais se deslocarão para os bloquistas por simpatia ideológica ou por concordância com uma metodologia muito mais “plástica” e “elástica”. O PCP, tal como o BE já está a fazer, terá, julgo, de se demarcar da imagem antieuropeia, pois uma coisa é condenar a forma como Portugal entrou na CEE e outra é, aceitando o irreversível, tentar atenuar as tendências capitalistas no seio da União, nomeadamente a globalização.
Nas eleições de Outubro, o CDS e o PSD estarão – se até lá o Governo não fizer grandes asneiras – na sua fase mais baixa. O PSD cairá naquilo que sempre foi: uma ambiguidade de direita; o CDS ou caminha para um descarado populismo muito contrário à sua matriz ideológica democrata-cristã ou reduzir-se-á a uma afirmação de direita descontextualizada.
O PS obteve uma vitória, mas sem dúvidas, não vai aproximar-se, em Outubro, da maioria absoluta. Isso será bom e poderá ser mau. Bom se, de novo, optar por fazer entendimentos à sua esquerda; mau se der a mão ao PSD ou, em alternativa, por estar próximo da maioria, estabelecer a possibilidade de aliança parlamentar com um pequeno partido sem projecto nacional, como o PAN, se os eleitores persistirem na teimosa eleição de deputados dessa área política.
Parecendo que estas eleições clarificaram a conjuntura política nacional, o que, em meu entender, elas fizeram foi mostrar a imensa fragilidade da democracia portuguesa e a perda de “aceleração” dos partidos do designado “arco do poder”.
Veremos se o tempo me dá razão.