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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

29.04.19

Saudosismos


Luís Alves de Fraga

 

Escusei-me a fazer qualquer referência às eleições em Espanha, porque havia demasiada “poeira” no ar, ou seja, dizia-se muita coisa com pouca certeza. Todos os dias recebi resumos dos assuntos mais importantes publicados pelo jornal “El Pais”, mas não me foram suficientes para auscultar a opinião do pensamento dos votantes espanhóis. Já se sabem os resultados e sabe-se que, tendo-se registado uma das maiores afluências às urnas, ganhou, sem maioria, o PSOE, que se coloca à esquerda no hemiciclo.

 

Não é desta vitória que me apetece falar, mas da estranha subida de um tal VOX, partido de extrema-direita, com matriz franquista, passadista e saudosista. E quero debruçar-me sobre esta vitória para lembrar aos esquecidos e dar a conhecer, ainda que vagamente, o que foi a ditadura fascista “aqui ao lado”.

 

A Espanha, como unidade política, surgiu somente em 1498, depois da conquista do reino de Granada pelos reis católicos, Isabel I, de Castela e, Fernando, de Aragão. Por aqui se percebe, vagamente, a “manta de retalhos” política e cultural existente no território do lado de lá da fronteira portuguesa. Realmente, a Espanha de ontem resultou da junção dos reinos de Castela, Leão, Navarra e Aragão, sendo que o primeiro, autor da hegemonia, teve fronteira variável até à total vitória sobre os islâmicos.

 

A diversidade cultural sempre existiu na vasta Espanha, ao contrário do que aconteceu no reino de Portugal, porque, cá, depois da segunda metade do século XIII, o monarca deslocou-se da sua “área de conforto” – no Norte e Centro (Coimbra) – para se instalar, de modo temporário, em centros urbanos, que iam de Santarém a Sintra e de Lisboa a Évora, quando não até Silves. Deste modo gerou-se a unidade nacional, com prevalência do Sul sobre o Norte e, por isso, não trocamos os vês pelos bês nem fazemos grande acentuação como xis no cê agá.

 

Não é errado, ainda que seja exagerado, afirmar que a Espanha é uma imposição política, vinda de longe. Mas essa injunção aumentou exponencialmente quase no final da primeira metade do século XX, quando, para derrubar a 2.ª República – proclamada em Abril de 1931 – se deu aquilo que começou por um golpe militar, em Julho de 1936, e acabou numa sangrenta guerra civil só terminada no dia 1 de Abril de 1939, com a vitória dos “nacionalistas” comandados pelo general Francisco Franco Bahamonde.

O fim da guerra não correspondeu ao termo da mais sangrenta e fratricida repressão imaginada. Franco foi um cruel perseguidor dos seus inimigos. E, inimigo era quem discordasse dele e do regime ditatorial e corporativo implantado em Espanha. Os fuzilamentos continuaram por mais de uma década, sem registo dos mortos, sepultados em valas comuns anónimas. A denúncia foi a moeda de sobrevivência na Espanha, que o ditador queria unida e “nacional”.

 

Ainda hoje, em pequenos “pueblos”, na Espanha supostamente unida, mas separada em regiões autónomas – provando a falta de nacionalidade daquele Estado – não se recorda a guerra civil para não abrir, entre as novas gerações, as feridas mais sanguinosas deixadas pela luta que dividiu famílias e vizinhos. Ainda hoje há filhos e netos que buscam as ossadas dos seus antepassados para lhes fazer um enterro digno. O “Vale dos Caídos”, esse estúpido monumento feito a Deus e aos nacionalistas mortos, foi o campo de concentração onde faleceram, a partir e cavar a rocha, sob a opressão dos carrascos vencedores, centenas de prisioneiros republicanos. Franco foi o “animal” perante quem uma Espanha vencida se teve de ajoelhar e incensar.

 

É essa Espanha, carregada de cólera e ódios e com as mãos escorrendo sangue, que vota no VOX, que admira o passado e está plangente de uma vil ditadura criminosa.

28.04.19

Oportunismo


Luís Alves de Fraga

 

Na valência mais simples, o significado de oportunismo é “a capacidade de aproveitar situações”, contudo, vulgarmente, é um atributo negativo: “garantir para si algo sem olhar a meios nem a princípios morais ou éticos” (estes conceitos, entre aspas, são da minha autoria).

 

Olhando para trás, já que estou na recta final da minha vida, parece-me que nunca fui praticante de oportunismos no sentido pejorativo. Tudo o que fiz foi fruto de muito trabalho e de muito esforço. Todavia, não desprezei oportunidades; aproveitei-as para, à custa de mim próprio, às vezes com algum sacrifício da família, alcançar, honestamente, os meus objectivos.

Mas, neste dobrar de “esquina”, na estrada da vida, dou-me, também, a analisar os percursos de certas personagens com alguma projecção pública e reparo que, ou por lisonja fácil ou por uso de meios menos curiais, calcando aqui e além cabeças inocentes, estão alcandoradas em pedestais não merecidos, segundo um julgamento imparcial. Isso dói-me, pois, o comum dos cidadãos, incautos ou sem meios de prova, aceita-os e rende-lhes homenagem como só se rende aos honestos, íntegros e impolutos.

 

O instrumento capaz de trazer ao conhecimento geral a verdade com todos os matizes que a adornam é a História. Mas a História, entre nós, ainda é só aceite como uma investigação que se faz ao cabo de muitos anos sobre a ocorrência dos acontecimentos. Justifica-se a atitude com base na “depuração” e “decantação” que o tempo faz sobre os factos, ou seja, deixa-se que uma névoa de esquecimento cubra as cores vivas do presente para o transformar em passado distante e manuseável. Manuseável para transformar a verdade em “história apologética”, o mesmo é dizer, “história conveniente ao momento”, sendo que, por momento, se entende aquilo que politica e socialmente é aceite sem reticências.

A esta história opõe-se a História, aquela que conta e explica sem julgamentos nem simpatias, simplesmente relata TUDO para que se possa compreender sem ter necessidade de indicar “caminhos”.

 

A História – esta de que falei agora mesmo, grafada com agá grande – para ser feita exige, muitas vezes ou quase sempre, um tremendo esforço do historiador, já que, não cometendo anacronismos, tem de possuir uma sagacidade de “polícia criminal”, tentando sempre descobrir intenções e motivações na acção dos “actores” históricos. Isto implica a necessidade de separar os historiadores entre os que somente contam o que agrada ou é tradicional e os que pesquisam, investigam, até chegar ao miolo, ao núcleo, do acontecimento, porque esses, quando vão escrever, para além de contar, relatam, também, os elementos necessários à compreensão dos porquês.

 

A vida dos historiadores de amanhã estaria muito mais facilitada se entre nós fosse completamente aceite e praticável, por gente habilitada, honesta e impoluta, a chamada “História do Presente”, que nada tem a ver com jornalismo, mas com o relato retalhado, escalpelizado, contextualizado do passado de “ontem”, sendo que este “ontem” pode ter sido aquilo que se passou há um ano ou há dez. Este historiador tem de continuar a ser o “polícia criminal” que se não deixa manipular nem pelos seus sentimentos nem pelas suas simpatias, nem pelas suas tendências políticas e, muito menos, pelos receios da crítica social. Não é um juiz, porque não julga nem tem que julgar, mas procura com afinco a nudez da verdade, quase sempre coberta por um véu diáfano.

25.04.19

Tempo que passou


Luís Alves de Fraga

 

O meu pai adormecia, à noite, na cama, sempre com um livro aberto nas mãos. Escorregava para o chão ou ficava-lhe sobre o peito.

Esta é a mais remota lembrança guardada por mim quando ainda mal falava. Lá em casa, o grande leitor era o meu pai: à tarde trazia sempre na mão o já esquecido vespertino “Diário de Lisboa”, creio, semanalmente, via-lhe o periódico humorístico “Sempre Fixe”, quinzenalmente, se a memória não me atraiçoa, comprava e devorava, ainda em formato tablóide, “A Vida Mundial” e, mensalmente, adquiria as “Selecções da Reader’s Digest” edição brasileira. Era um homem informado e dado ao conhecimento humanístico. Com ele aprendi que se pode viajar por todo o lado através das páginas de um livro, um jornal e uma revista, com ele aprendi o gosto da leitura.

 

Mas o meu pai, que antes de ser enfermeiro da nossa Armada, havia sido repórter de um jornal também desaparecido – “Novidades”, – tinha o prazer da escrita e o gosto pela informação. De origem católica, quando nasci, não o tive como exemplo da prática religiosa; tive-o como dado à escrita. Voltou a colaborar com jornais regionais – açorianos e continentais – nas vésperas da passagem dos cinquenta para os sessenta anos. E foi nessa altura, seguindo o seu exemplo, que me iniciei, também, a escrever as primeiras crónicas.

 

Logo na minha estreia ensaística fui vítima do lápis azul da censura; foi no ano de 1968. Já conhecia o medo social e individual da acção da polícia política; passei a conhecer a repressão sobre a expressão livre do pensamento quando escrito.

Até 1974, Abril, desafiei de todas as formas possíveis a censura; aprendi a escrever de maneira a que a minha mensagem passasse nas malhas da ignorância ou da pressa dos censores. Era uma técnica deixada hoje de praticar, contudo, era uma forma de castrar o pensamento, pois levava-nos aos caminhos ínvios do dizer, à falta de frontalidade, ao cinismo, à astúcia.

Poderia deixar de escrever, mas quem escreve sem ser por profissão, em órgãos de comunicação social, fá-lo em resultado de uma compulsão interior, por desejo de abrir perspectivas sobre o que sabe ou sobre o modo como interpreta o que vê e sabe! Nunca desisti. Lá pelos anos 70 do século passado, presumi – e, parece-me, bem – que estava sob o olhar atento da PIDE/DGS; dos serviços de informação militar devo também ter estado, não por constituir um perigo, mas, por não representar um servilismo acéfalo.

 

O 25 de Abril, para mim, não foi só o começo da democracia, da liberdade, representou a possibilidade de dar largas à minha ânsia de dizer o que penso e como penso. Foi o verdadeiro salto, entre a opressão vivida e sentida, para a descompressão responsável da emancipação.

 

Neste tempo que passou, independentemente de diferenças políticas, de simpatias partidárias, o mais marcante para mim, o mais satisfatório, o mais precioso, foi a liberdade de expressão do pensamento, porque me permitiu exercer o magistério em sala de aulas e, de certa forma, um pouco em todo o lado onde deixei as minhas palavras escritas ou faladas.

 

Todos os dias, quando digo o que penso, sem restrições para além das que me imponho, celebro o 25 de Abril de 1974, que vivi em Moçambique e para o qual, em pequena quota-parte, contribui. Hoje, especialmente hoje, recordo a alegria e as expectativas sentidas nessa alvorada redentora.

Abril cumpre-se sempre que a luta pela justiça social, económica e cívica se desenrola perante os olhos de todos nós através da liberdade de dizer.

24.04.19

A entrevista do Presidente


Luís Alves de Fraga

 

Ontem foi dia de entrada no palácio de Belém para incluir o Presidente da República no programa “O Outro Lado”, painel habitual de debate político. Vi até ao fim e ficaram-me alguns engulhos atravessados na garganta. Vamos lá expô-los.

 

Não gostei do à-vontade do apresentador quando, por várias vezes, se dirigiu ao Professor Marcelo Rebelo de Sousa com um simples “Presidente” (e a maiúscula sou eu quem a coloca) familiar e pouco educado, a meu ver. Mas disto tem culpa o próprio Presidente da República, pois banalizou o cargo e a pessoa.

É aqui que me interrogo se ele tem sido cauteloso, na gestão da sua imagem e no respeito popular da mesma. A minha dúvida não reside numa simples questão formal de delicadeza social, mas no resguardo que deve haver, julgo, do cargo do mais alto magistrado da Nação.

Esta minha observação resulta de discordar de uma certa forma trivializada de se falar do cidadão Presidente – pelo respeito que me merece o seu comportamento interventivo no dia-a-dia da sociedade portuguesa ao contrário do majestático afastamento dos seus antecessores – o qual, por vezes, se coloca a jeito para que assim aconteça. Ele não pode nem deve adoptar ou aceitar comportamentos familiares seja de quem for, porque não é o cargo que impõe o respeito, é aquele que o ocupa quem estabelece os limites do comportamento. E a Presidência da República obriga.

 

Outro aspecto que me deixou frustrado foi terem-se levado para discussão assuntos sobre os quais o Presidente não se ia comprometer, porque não governa. Marcelo Rebelo de Sousa mostrou, à saciedade, a sua extraordinária experiência docente, pois teorizou, até ao limite, tudo o que era possível para se colocar no plano das ideias e, consequentemente, fora do plano prático da governação.

No meu entender, perdeu-se uma excelente oportunidade para ouvir o Presidente da República sobre assuntos do domínio internacional, dos quais tem opinião e pode expressá-la sem se comprometer. Perceber o que ele pensa sobre a modificação do modelo democrático no mundo e, quiçá, na Europa, teria sido excelente para chegar à análise das grandes linhas para onde pode tender o tipo de governação em Portugal.

 

A prova evidente do que acabo de dizer ficou registada no momento em que o entrevistador/moderador saltou para a questão dos movimentos sindicais inorgânicos e o Presidente, com toda a tranquilidade e com verdadeiro conhecimento do panorama internacional, se referiu ao que se passa tanto na Europa como no resto do mundo. Deu uma lição e, ao invés de tentar “entalá-lo” com perguntas, visando o seu comprometimento político, o entrevistador e o público teriam ganho muito mais ouvindo lições de quem está atento e lida com dossiês nacionais e internacionais todos os dias, por força das funções desempenhadas.

É tempo de deixar de olhar para o Professor Marcelo Rebelo de Sousa como comentador televisivo, passando a vê-lo como Presidente da República. Trata-se de um exercício que todos devemos fazer.

23.04.19

25 de Abril, ontem e amanhã


Luís Alves de Fraga

 

Estive a ver o programa da RTP-1 “Prós e Contras” transmitido ontem da Praça do Município, em Lisboa.

Lá estavam seis capitães de Abril e uma pequena – comparada com as habituais – plateia de jovens (a maioria, simples espectadores).

 

Em síntese, muito magra de palavras, direi que os meus camaradas militares se limitaram, salvo um ou outro momento, ao “discurso politicamente correcto” e os jovens à “crítica sonhadora” própria da idade e, aqui e além, à manifestação de um desejo de partilha na vida política e ou em eventos de destaque social.

 

Ainda que com cautelas, os coronéis Vasco Lourenço, Sousa e Castro e Matos Gomes, fugiram à crítica aberta e declarada dos governos que geriram os destinos de Portugal contra as linhas programáticas e as directivas norteadoras do Movimento das Forças Armadas: democratizar, desenvolver e descolonizar.

 

Na verdade, se por democratizar se entende a existência de partidos políticos, então, houve e há democracia em Portugal. Mas, democracia será isto? Se não é, como julgo que não é, então alguém falhou, lá muito atrás, pouco tempo depois do Abril de 1974.

Isto mesmo devia ter sido denunciado, ontem, pelos meus camaradas. O “regresso aos quartéis”, imposto pelo Conselho da Revolução, deixando terreno livre para a manobra partidária, impossibilitou dois objectivos nunca equacionados: a “dessalarização” da sociedade portuguesa e a aprendizagem da democracia de base.

Países como a Alemanha, com poucos anos de nazismo, tiveram programas de reaprendizagem da vida em democracia; nós precisaríamos de, pelo menos, uma década para aprender o que é, realmente, viver livre, com direitos e, acima de tudo, com muitas obrigações e responsabilidades.

A ânsia de entrada na CEE protagonizada, em especial, por Mário Soares e, em parte, pelos líderes do PSD, foi o veículo para uma democratização “coxa”, pois, logo à partida, foi-nos imposta a adesão sem qualquer consulta popular, nem qualquer respeito pelos eleitores, conduzidos para a Comunidade como carneiros para o matadouro.

O futuro do 25 de Abril de 1974, como se vê, começou a ser atraiçoado logo em 1977 e concluiu-se em 1985.

Em 1982 o Conselho da Revolução deu por cumprida a sua missão. Um erro que devia ser denunciado neste quadragésimo aniversário da data libertadora.

 

Sousa e Castro recordou, e bem, a distorção social provocada pelas entorses salariais existentes entre nós e em constante crescimento. Esqueceu, contudo, com a autoridade que lhe advém de um protagonismo revolucionário, de evidenciar o papel desempenhado pela política “desvairada” de Cavaco Silva, enquanto Primeiro-Ministro, durante o regabofe dos recebimentos provenientes da CEE a fundo perdido ou quase! Foi nessa época que os abismos salariais ganharam raízes, abriram os caboucos, para despontar, com toda a força, nestes tempos de agora.

 

Era isto que eu esperava dos meus camaradas presentes no programa. Tinham, têm, autoridade para serem juízes dos tempos passados, abrindo perspectivas para os tempos futuros.

Os jovens, na sua inocência de vida e com a inexperiência própria de quem se está a preparar para o futuro, apresentaram algumas ideias e sugestões críticas, mas eu, no lugar deles, esperaria que os “pais da Revolução Democrática” fossem os primeiros, porque distanciados dos maiores erros e dos mais significativos desvios políticos, críticos do passado e do presente.

Perdeu-se uma excelente oportunidade para, abandonando a atitude paternalista de quem já nada tem a ver com os pretéritos erros, alcandorar-se ao lugar de magistrado supremo e condenar quem deve ser sentenciado.

22.04.19

Joker


Luís Alves de Fraga

 

Com relativa frequência vejo, no canal 1 da RTP, o programa “Joker”. É uma forma de me entreter e me desafiar. Todavia, consigo concluir alguma coisa, julgo que útil, ao cabo de várias sessões.

 

Sou um ignorante completo em matérias relacionadas com quase todos os desportos, com músicas, canções, cantores, com filmes, realizadores e actores. Fico espantado com as certezas de bastantes concorrentes nestes temas. Mas espanta-me muito a ignorância de um vasto leque de pessoas que nada sabem de História, Geografia, Ciências Naturais, Literatura, Política, ou “fait-divers” de âmbito social. Espanta-me mais porque as perguntas dão quatro alternativas de resposta.

 

Já sei que os meus leitores dados ao desporto, cinema e música estão a pensar que, também eu, sou um zero à esquerda, mesmo com quatro hipóteses de resposta quando a pergunta é sobre estes tópicos. E têm toda a razão! Só lhes oponho um argumento: nenhum desses conhecimentos se adquire pela frequência de aulas nas nossas escolas; podem aprender-se nos jornais, nas revistas, na rádio e na televisão. Mas, não sou fã dessas temáticas… que fazer?

 

Terei de admitir, outras pessoas não são fãs do que se aprende na escola! É verdade, contudo, a frequência escolar é obrigatória; a dos jornais, revistas e outros meios de comunicação desportivos, cinéfilos e musicais, não é!

 

Julgo, está evidente onde pretendo chegar: à comprovação de uma certa incultura no que respeita ao conhecimento tido como medianamente erudito. É isso que me deixa inquieto, pois não são necessários concursos televisivos para determinar um grande desinteresse por tudo aquilo que, até há uns anos atrás, era sabido por grupos sociais adultos, que haviam frequentado o, então, chamado liceu.

 

Claro, há quem contraponha à razão anterior a actual facilidade de acesso rápido a todo o conhecimento, usando a vastidão de dados armazenados na Internet. É verdade! Mas, para mim, é lastimoso que assim seja, porque nos coloca como uma extensão do “saber” arquivado na “máquina”, carecendo-se, somente, de conhecer como aceder aos dados!

⸺ O que se perde?

⸺ Perde-se toda a “ginástica” de raciocínio para articular conhecimentos, para tirar novas conclusões não testadas; esvai-se o desejo, aparentemente inútil, de especular, de discutir, equacionar hipóteses; quase morre o que é complexo para dar lugar ao conhecimento medíocre, banal. O Homem começa a perder a sua dimensão altaneira, que o impulsiona para o desconhecido, ficando preso ao que está armazenado algures, incapaz de pôr em causa esse “saber”, pois, cada vez mais, o pressinto vassalo, por cómodo, ao serviço das preguiças mentais: - saber para quê, se posso “perguntar” à máquina que me liga ao “armazém”?

 

Estamos no átrio da mediocridade – se calhar, mediocridade “clássica”, porque a “erudição” tenderá a ser a capacidade de busca do conhecimento! – à espera de um futuro no qual não vou participar e perante o qual me recuso a prestar homenagem.

21.04.19

O dinheiro e a vigarice


Luís Alves de Fraga

 

De facto, estranhei, quando foi divulgado, que o vice-presidente do sindicato dos motoristas de veículos transportadores de materiais perigosos era um advogado, se fosse simples conselheiro jurídico, ainda vá lá!

 

O homem, parece, tem perfil de vigarista. Não digo que seja, mas corre a notícia, confirmando essa sua “qualidade” pouco edificante para os motoristas, para o sindicato e, acima de tudo, para ele. Mas, cada um faz do seu presente e futuro aquilo que entende!

 

O facto de ser jurista chamou, de imediato, a atenção pública para qualquer coisa errada naquele recente sindicato. Normalmente, estas associações laborais socorrem-se dos serviços dos entendidos em leis para defender quem incorreu em qualquer falta ou para receber conselho avisado e cauteloso sobre acções a desenvolver. O advogado, quase sempre, é uma eminência parda por trás dos dirigentes sindicais. Este, o dr. Pardal, mais do que pardo, virou brilhante na causa dos camionistas!

 

Não estou a condenar as reivindicações destes profissionais do volante; nunca o faria, partindo do princípio da sua justiça. O que condenei e condeno é o momento para dar largas à exigência. Por que não reclamaram em tempos do governo Passos Coelho? Ou há dois anos? Ou há um ano? Certamente, as más condições de vida não surgiram nesta legislatura! A minha crítica vai para as reivindicações surgirem a pouco tempo de eleições, de virem encadeadas numa série de outras apresentadas por outros sindicatos desarticulados das estruturas sindicais do país. É de todo este conjunto de oportunos “acasos” que eu discordo.

 

Depois, as reivindicações apresentadas são estranhamente desconexas, porque, se nos basearmos no salário declarado para efeitos de Segurança Social, verifico razões para concordar com a greve; mas, olhando para a totalidade média dos pagamentos mensais efectivos, acho-os bastante significativos e compensadores se comparados com os de outras profissões para as quais são precisas habilitações muito mais complexas. Mais espanto me causa o elenco de “responsabilidades” apresentado como justificação da greve, pois parece que o necessário para fazer distribuição de combustíveis, para além de uma cautela especial na condução, se situa no saber como proceder ao enchimento de depósitos com os cuidados de quem manuseia matérias incendiáveis e explosivas. Quanto teria de ganhar um militar, que todos os dias trabalha com armas, munições, explosivos e disponibiliza a vida, sem direito a horas extraordinárias, a greves, a reivindicações, a sindicatos, a inscrição em partidos políticos, a local de trabalho fixo ou a condições geográficas ou climatéricas?

 

Criticáveis são todos os governos que não estudaram, nem mandaram estudar, as condições e medidas indispensáveis para fazer face a situações de catástrofe ou de ruptura da segurança e da defesa nacional. Criticável será o imobilismo dos actuais governantes se, face ao que aconteceu, não tomarem imediatas medidas cautelares para assegurarem a existência de stocks estratégicos de todos os materiais indispensáveis à vida nacional durante um tempo razoável sem afectar o normal desenrolar do dia-a-dia. Essa é a minha maior preocupação, depois desta greve onde se exibiram exigências consideráveis, ou não, e que teve na ribalta um advogado, segundo consta, vigarista.

18.04.19

Mais uma!


Luís Alves de Fraga

 

O país está em crise de locomoção. Faltou combustível nos pontos de abastecimento público, no aeroporto de Faro, esteve prestes a faltar no de Lisboa, pararam autocarros de passageiros na margem sul do Tejo e andou toda a gente à procura de lugar onde pudesse meter uns litros de gasolina ou gasóleo no automóvel particular.

Mais uma greve que deixou Portugal de calças na mão!

 

Uma greve absolutamente selvagem aprendida com as outras, que venho a denunciar há meses. Uma greve onde não houve negociações prévias. Uma greve em um sector mais do que estratégico para o país.

Não basta assegurar serviços mínimos em consequência de uma requisição civil. Há que garantir que o sustento económico do país não pode ficar entregue nas mãos de meia dúzia de profissões capazes de paralisar actividades fundamentais à sociedade. Não basta a requisição civil. Tem de se mobilizar, de imediato, todos os veículos autotanques das Forças Armadas e mais os seus condutores para providenciar ao abastecimento essencial. Tem de se agir com mão pesada sobre grevistas que, irresponsavelmente, colocam o país à beira de rupturas várias.

 

Temos de perceber que estas greves são verdadeiras agressões à democracia. Não são democráticas; são reaccionárias, porque corroem a democracia.

A maioria, se calhar, dos meus leitores, não se recorda como caiu o governo de Salvador Allende – em nada semelhante ao de António Costa – no Chile. Lembram-se do golpe militar de Pinochet, mas já esqueceram as greves de camionistas, das donas de casa, e de tantos outros sectores não organizados sindicalmente.

O que eu quero dizer é que as mudanças, tanto para a direita como para a esquerda, têm de ter um “caldo de cultura” justificativo da acção. Ora, o que se está a passar em França, com os coletes amarelos, como o que se passa em Portugal, com as greves – nunca vistas no governo Passos Coelho, mas visíveis agora quando estamos à beira de eleições e onde se pode vir a repetir a fórmula de governação de esquerda – convidam a soluções populistas, abrindo a porta a governos repressivos e incapazes de perceber as reais necessidades das classes médias e dos trabalhadores.

 

É tempo de o governo assumir, democraticamente, posições de força contra estas fragilidades nacionais.

17.04.19

Alberto João Jardim


Luís Alves de Fraga

 

Ontem à noite, por mero acaso, apanhei uma entrevista televisiva dada pelo antigo governante da Região Autónoma da Madeira (RAM) ao Porto Canal.

Antes de começar a discretear sobre o entrevistado e o que disse, quero declarar o quanto não nutri nunca simpatia por Alberto João Jardim.

 

Esse advogado – talvez sem grande importância ou valor na Madeira, antes de 25 de Abril de 1974 – estava, por laços familiares, ligado à elite funchalense e ao regime salazarista. Teria, se a ditadura não caísse, como caiu, um lugar assegurado na Acção Nacional Popular, a herdeira da União Nacional, de Salazar, para conseguir singrar na sua cidade natal ou, talvez, até no continente. Ao que consta, nunca se lhe conheceu qualquer ímpeto democrático ou liberal antes da revolta dos capitães em 1974. Aluno de baixa craveira – o que não é motivo para o desprezar como político, pois não é, nem foi, caso único – depois de ser Presidente do Governo Regional, distinguiu-se por conceitos de democracia assaz estranhos, porque, além de cultivar a demagogia, detestava tudo o que, de algum modo, pudesse aproximar-se do pensamento socialista, nas suas várias interpretações.

 

Parece que no desempenho do cargo de décadas não aumentou o património pessoal, mas, ao que consta, terá sofrido de grande miopia quanto aos patrimónios de quem trabalhou com ou ele ou próximo dos que dele dependiam. Provavelmente, sempre lhe faltaram provas para concluir da veracidade dos rumores!

 

Ontem, na entrevista, disse coisas que me deixaram a pensar. Não lhe vou fazer discurso laudatório, todavia, reconheço que tem razão ao afirmar que tem havido decisões políticas tomadas pela maioria parlamentar merecedoras de ser escrutinadas pelos eleitores. Não mandou dizer por ninguém, mas disse-o, estranhava que certos políticos que iniciam carreiras governamentais sem grande património as acabem detentores de muitos milhares de euros. Afirmou que tal não se consegue com o recebimento de três ou quatro mil euros por mês.

Não imagine o leitor que Alberto João Jardim tinha só em mente José Sócrates! Se foi esse o caso, então, não passa de um tonto… e ele provou, mutos anos, que de tonto não tem nada.

 

Não pude deixar de admirar, com bastante ironia, a franqueza – que vai direita à vaidade do antigo governante madeirense – com que se referiu à sociedade local antes de 25 de Abril de 1974, (cito de memória): «era quase feudal; havia os senhores e o povo». E para identificar o “povo” deu a imagem da mulher com o lenço na cabeça, «como se fosse árabe».

Pelos vistos, hoje continua a haver povo, por lá, pela Madeira, só que já não andam as mulheres com lenços na cabeça e, por isso, não são árabes!

 

Alberto João Jardim, pese a idade que tem, continua a ser um “político de ontem” com o populismo próprio de quem domina em áreas de grande obscurantismo cultural e político.

13.04.19

Joe Berardo


Luís Alves de Fraga

 

Diz-se, e é verdade, somos um país de “Chico-Espertos”, ou seja, uma terra onde enganar o próximo é, socialmente, uma “virtude” e não uma deslealdade. Por cá, a corrupção é aceite a todos os níveis, começando na fila do supermercado – tentar passar à frente de quem está primeiro – e acabando nas grandes falcatruas bancárias – onde acções não cotadas em bolsa rendem, sem se saber como ou não, chorudos lucros!

 

O inefável comendador – ainda não sei, nem estou para procurar, qual foi a comenda que lhe deram e quem lha deu – há semelhança de um outro – este com comenda baseada no café – madeirense, mas com o nome próprio mudado em Joe, para além de ter tido sorte – e que tipo de sorte? caso ainda para se averiguar bem! – com a compra da mina desactivada, afinal rica em ouro, tem-na, também, com os deslumbrados e lorpas banqueiros continentais e, bem assim, com os tecnocratas ao serviço destes, que se vergam solícitos aos “rands” do mineiro teso, que ficou milionário, porque, no fundo (por sinal bastante à superfície!), gostariam de estar no lugar do “desgraçado” emigrante “vilhão” da Madeira. O barroquismo do parágrafo é propositado para testar a paciência dos leitores: serão capazes de voltar atrás para separar as orações, como fazíamos, em tempos idos, ao ler António Vieira ou Camões, que imito com dificuldade?

 

Sem complicações de maior, Berardo trapaceou a banca ou banqueiros e administradores, de tal forma que hoje as suas dívidas quase ascendem a mil milhões de euros! E, com tanto dinheiro em jogo, há juízes que judiciam vigarices de menos de um milhar de euros, às vezes, umas magras centenas. Felizmente não sou, não fui nem jamais serei magistrado… pois, enquanto militar, tive oportunidade de algumas vezes, olhos nos olhos, contestar ordens por mim achadas impróprias ou inadequadas. Se fosse juiz teria de observar a Justiça como um todo e, enquanto guardião da cega Lei, não condenar miseráveis aldrabões a penas injustas porque a Justiça tem de ser relativa. Quando, porque têm dinheiro, crédito, amizades ou o raio que os parta, há vigaristas a passearem-se por aí e infelizes cidadãos, se calhar acicatados pela necessidade de sobreviver, cumprem penas infamantes nas prisões do Estado, um juiz não pode dormir tranquilo, porque o Estado dá garantias a quem as pode comprar e nega-as a todos os que, por miséria, as não podem ter.

Que Estado é este? E que Justiça? E que Democracia?

Este não é o Portugal de Abril ideado por todos que esperaram um dia ver a terrível ditadura derrubada.

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