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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

16.06.11

Day After


Luís Alves de Fraga

 

No dia seguinte ao da morte de D. Afonso V o futuro rei, D. João, o segundo do seu nome na História de Portugal, foi confrontado com uma triste realidade: o pai tinha-lhe deixado em herança, como reino, a estradas e os caminhos do território!

Seria talvez exagero do jovem monarca, mas a verdade é que a liberalidade de D. Afonso V, para pagar os serviços militares que a nobreza lhe havia prestado nas inúmeras aventuras de cariz medieval em que se metera, fora-se desfazendo dos bens territoriais da coroa e pouco ou nada restava que D. João II pudesse chamar seu, o mesmo é dizer, de Portugal, já que, nesses tempos recuados, o soberano se identificava com o próprio Estado.

A par da situação criada pela magnanimidade de D. Afonso V verificava-se um outro fenómeno bem pior e mais difícil de gerir pelo seu sucessor: a nobreza enriquecida começava a dar mostras de desobediência ao poder real. E isso acontecia, porque, afinal, o poder do rei era meramente formal ou, como se diria em linguagem de hoje, virtual. Virtual, pois nada mais havia para distribuir pelos poderosos. Restava ao rei mandar trucidar os fracos, porque estes fraca resistência lhe poderiam opor. Mas D. João II optou por usar da única arma que lhe restava para restaurar o prestígio real: abater os mais poderosos senhores do reino, usando de razões sérias e verdadeiras ou falsas e forjadas. Era indiferente, porque o fim justificava o meio. E fê-lo. Fê-lo sem piedade e com grande astúcia. Trouxe para si os bens territoriais dos mais poderosos nobres do reino, entre os quais estava o seu próprio sogro. Usando uma linguagem de hoje, D. João II nacionalizou os bens de certos nobres e com isso, porque agiu estrategicamente, passou a centralizar o poder nas suas próprias mãos e a conseguir impor o ritmo político no seu reino. Gerou aquilo que actualmente poderíamos designar por temor preventivo.

 

Pois bem, vem esta lembrança histórica a propósito da notícia que há pouco ouvi na rádio: Passos Coelho já fez saber no estrangeiro que vai privatizar parte das Águas de Portugal e a RTP. Não vai deixar para o seu herdeiro nem as estradas de Portugal, porque essas já são de privados. Isto é ainda o começo da louca cavalgada medieval deste novo D. Afonso V! Mas a um Afonso seguir-se-á, quando já nada restar de nacional, um D. João… É inevitável, ou inviável se tornará Portugal por ficar a pertencer à nova nobreza financeira que vem tomando conta de tudo o que é estratégico no país.

 

A História não se repete. Mas a lógica do Poder repete-se. Repete-se, porque haverá um momento em que para Portugal poder ser um Estado com capacidade de manobra terá de nacionalizar o que se foi alienando. Isso aconteceu em 1385, em 1834, em 1910 e em 1974. Nestes momentos históricos, para abater poderes que se sobrepunham ao poder do Estado – seja ele representado pelo rei ou pelo povo – houve que centralizar nas mãos do mesmo Estado os bens que entretanto havia alienado.

Certamente vai haver um Day After! Quando, não sei! Mas tem de haver. É inevitável.