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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

16.06.06

Graduação e pagamento dos militares


Luís Alves de Fraga

Têm sido notícia nos órgãos de comunicação social as informações relativas à redução do número de unidades e de certos cargos no Exército. Isto corresponde a uma reforma de conceitos quanto ao uso da força terrestre. Assim, está-se a alterar a ideia de cobertura de quadrícula do território, tomando em consideração os novos armamentos e suas possibilidades.
Se me pedissem um juízo valorativo diria que se está a actuar de maneira correcta; a «cirurgia» das panóplias hoje ao dispor dos decisores militares é de tal ordem que se podem dispensar as grandes unidades, com muitos homens, para as substituir por contingentes mais pequenos, mas com muitíssimo maior poder de fogo e de destruição.
No plano teórico, as decisões político-militares adoptadas em Portugal estão certas. Nada há, por conseguinte a dizer. Todavia, levanta-se, desde já, uma outra questão: estarão as nossas Forças Armadas equipadas com as tais panóplias geradoras da mudança de conceitos? Tenho sérias dúvidas quanto à honestidade da resposta! O nosso armamento e equipamento, tomando como princípio básico que às Forças Armadas compete primariamente criar condições que garantam a manutenção da independência e da soberania — mesmo levando em conta que hoje estes objectivos se alcançam com recurso a alianças —, o nosso armamento e equipamento, dizia, é insuficiente para oferecer garantias mínimas do cumprimento da missão primária. Assim, por imperativos de carácter económico, o nosso sistema defensivo nacional é insuficiente! O quanto é insuficiente já ultrapassa o âmbito deste apontamento.
Perspectivando a situação tal qual acabo de fazer, parece que a adequação dos efectivos à dimensão territorial não está a obedecer a um princípio de carácter estratégico militar, mas a um imperativo de ordem económica imposto pelo Poder político. Assim, subverte-se a reforma em curso. E subverte-se da pior maneira, porque se está a enganar o cidadão desconhecedor das coisas de defesa nacional o qual presume que, reduzindo três tenentes-generais aos efectivos do Exército, se consegue uma extraordinária poupança financeira, o que não corresponde à verdade.
Um tenente-general vence, sensivelmente, o mesmo pagamento que um director-geral da Função Pública. Ora, faça o leitor as contas a quantos directores-gerais existem e compare com o número de tenentes-generais do Exército, Força Aérea e Marinha. Ficará simplesmente horrorizado! Na Função Pública distribuem-se cargos de director-geral como quem dá rebuçados a crianças. Claro que é muito menos visível um destes funcionários do que um luzido tenente-general na sua farda. Este dá mais nas vistas do que aquele; contudo, o militar teve uma carreira de tropeções e trabalhos que o outro nunca imaginou no ripanço da sua vidinha a fazer favores a políticos desta e daquela cor; o militar para chegar ao topo da hierarquia percorreu-a toda e o outro, por escolha e simpatia está lá num abrir e fechar de olhos.
A falta de honestidade intelectual dos nossos políticos — de todos sem excepção — assenta no facto de não terem a coragem de fazer publicar no Diário da República uma lista dos mais altos cargos da Função Pública e dos respectivos salários acompanhada do número de elementos que ocupam esses lugares e, em simultâneo, adoptarem igual critério para as Forças Armadas. Se assim procedessem ver-se-ia quem, proporcionalmente, gasta mal, melhor dizendo, desbarata os dinheiros do contribuinte.
Tenham coragem, Senhores políticos!
06.06.06

A bandeira nacional


Luís Alves de Fraga

Nasci na capital portuguesa há pouco mais de sessenta e cinco anos. A Lisboa da minha meninice nada tem a ver com a de hoje. Era uma pequena cidade — grande para nós que cá vivíamos — descoberta por todos os refugiados que fugiam ao terror nazi. Foram eles que trouxeram um toque de modernismo à velha e pachorrenta cidade de Lisboa. Até então, éramos uma capital quase fora do tempo. Claro que a ditadura que se abatera sobre os Portugueses — mas que eles aceitavam com elevada passividade, porque não há ditadores contra a vontade do Povo, ainda que às vezes seja muito conveniente fazer de vítima! — ajudava a compor este quadro provinciano de uma cidade europeia nada cosmopolita. Contudo, e pese embora esta descrição pouco abonatória, o certo é que também nenhuma das outras capitais da Europa havia atingido a grandeza de hoje... A relatividade manteve-se, ou quase.
Sendo Lisboa a cidadezinha provinciana do Velho Continente, por cá mantinham-se certos hábitos, em meu entender, saudáveis que o tempo, a ânsia de viver, e a adopção de costumes alheios fizeram desaparecer por completo. Não me julgue o leitor um sexagenário retrógrado, saudoso do passado, apostrofando contra a modernidade. Não! Nada disso! Quero ser um cidadão do meu tempo, ainda que reconhecendo os bons valores que se perderam na voragem desse caminhar para o moderno.
Um desses valores consumidos no altar do progresso, foi o respeito.
Hoje respeita-se pouco e quase nada. No que toca às pessoas, é mais importante ser-se famoso do que respeitado. Aliás, entre nós, troca-se, com o maior desplante, fama efémera por respeito — todos os reality shows vão nesse caminho.
Na Lisboa da minha infância havia manifestações públicas de respeito; respeito perante pessoas, acontecimentos e coisas.
Ao passar a carreta transportando o féretro de um cidadão os cavalheiros tiravam o chapéu e todos os homens se descobriam, se usassem qualquer tipo de gorro. Respeitava-se a morte, o morto e a dor dos que o levavam a enterrar. Os soldados, independentemente da sua graduação, à passagem do funeral, tinham prescrito no Regulamento de Continências e Honras Militares, que deveriam parar a marcha, voltar-se para o flanco por onde rodava o carro fúnebre e fazer a saudação castrense. Assim fui educado!
À passagem de uma força militar, transportando o estandarte nacional, os homens paravam, viravam-se para o lado por onde se desfilava e descobriam-se, tirando chapéu ou outra qualquer peça que lhes tapasse a cabeça. Não eram soldados quem passava. Não transportavam um pano num pedaço de pau. Era o símbolo da Pátria quem por eles passava guardado por quantos juraram defendê-la mesmo com sacrifício da própria vida.
Há quase cem anos, morrem homens e mulheres para dar glória a esse trapo verde e vermelho com a esfera armilar e o escudo das cinco quinas. Há quase cem anos que vão a enterrar cobertos com esse pano homens e mulheres que puseram a sua vida ao serviço de Portugal. Há quase cem anos que esse pano representa a comunidade que nós somos.
E vem a propósito contar que, antes de 1974, na longínqua ilha de Timor, no lado português, quando se içava a bandeira verde rubra em qualquer pau de repartição pública ou quartel corria sério risco o incauto cidadão que não parasse e não assumisse uma posição respeitosa. Os Timorenses, os velhos Timorenses que haviam sofrido a invasão australiana e japonesa durante a 2.ª Guerra Mundial, exigiam respeito por esse pano para eles quase sagrado. Estranho, não é?!
Há dois anos, quando por cá decorreu o final do campeonato europeu de futebol, alguém lançou a ideia de se cobrirem as janelas dos prédios deste país com bandeiras nacionais. Manifestação de um nacionalismo bacoco, balofo e espúrio.
A banalização de um símbolo retira-lhe o conteúdo simbólico. Embora não sendo católico, sou tão contra a exposição das bandeiras nacionais por tudo quanto é sítio, como sou contra a venda de imagens de Nossa Senhora de Fátima — alguma delas, até, fosforescentes! — em todas as bancas e lojecas da Cova da Iria. Não se podem abastardar símbolos que são elementos de culto.
Num tempo de anti-valores alguém, de novo, veio apelar para a exposição das bandeiras nacionais e muitos de nós, pacóvios, sem qualquer noção de patriotismo, sem valores nem respeito por símbolos, penduramos das janelas a bandeira de Portugal numa manifestação de carneirada mais capaz de ir para o matadouro da estupidez do que compreender que não é o relvado de um campo de futebol o local próprio para exibir o saudável nacionalismo que devemos guardar no relicário das coisas sagradas.
E o Governo aprova. E o Presidente da República aplaude. E ninguém vê que por este caminho se perde Portugal e os seus valores, porque é o caminho mais fácil para o desrespeito que há-de atingir quantos se regozijam agora com tanta tontice.
Que alguém tenha coragem de pôr cobro a esta palermice, a esta idiotice e tão petulante demagogia, para bem de Portugal e dos Portugueses.
05.06.06

A Escola de Sargentos do Exército


Luís Alves de Fraga

 

Em boa hora os comentários do meu camarada Fernando Vouga e o do meu amigo Camoesas foram feitos à crónica que intitulei «A vocação militar dos sargentos», porque me permitem esclarecer aspectos não suficientemente explícitos naquele escrito.
É certo que existe, no Exército, a Escola de Sargentos, a funcionar nas Caldas da Rainha. Ela poderia ser quase uma Academia de Sargentos, mas não é, visto enfermar de um defeito comum aos três ramos das Forças Armadas: só admitir na sua frequência alunos que já sejam militares, mesmo que oriundos da Armada ou da Força Aérea.
Esta condição faz toda a diferença entre o recrutamento de sargentos e de oficiais do quadro permanente. É uma nuane que quase passa despercebida, mas que, na minha opinião, é fundamental. De resto, o mesmo acontece na frequência do ensino politécnico militar — que permite o ingresso nos quadros técnicos de oficiais a sargentos do quadro permanente e outros militares contratados. São formas de adulterar ou de possibilitar a adulteração da vocação castrense, vendo-a, ainda segundo a perspectiva elitista que marcou o século XIX. Esse o motivo do meu desacordo frontal e absoluto! Vejamos, porquê.
Se a abertura à carreira de sargento se faz só para quem já é militar o leque de opção fica restringido ao universo castrense e, dentro deste, a praças e sargentos em regime de contrato. Seria impensável um oficial neste último regime concorrer à frequência do curso de formação de sargentos! Julgo que nunca tal aconteceu, embora a legislação não o proíba explicitamente. Assim, de fora ficam todos os jovens que, sendo civis, poderiam desejar ingressar nas fileiras imediatamente como sub-oficiais , desde que para tal tivessem aptidões intelectuais, físicas e técnico-militares (estas últimas a fornecer e comprovar durante os cursos respectivos). A proceder-se deste modo dava-se lugar à existência de genuínas vocações de sargentos! De contrário, fica-me sempre a dúvida de quando é que a opção pela vida militar foi um mero recurso ou um efectivo chamamento interior!
Claro que o actual sistema de recrutamento interno oferece algumas garantias de êxito na formação dos sargentos, mas constitui uma forma enviesada de seleccionar os antigos lateiros, agora mais envernizados do que no passado. Numa palavra, é um sistema elitista, porque, por um lado, não dá as mesmas oportunidades aos jovens civis e, por outro, marca, de forma sub-reptícia, um distanciamento entre oficiais oriundos das Academias e outros graduados das Forças Armadas. É, no mínimo, um sistema onde ainda se faz sentir o princípio monárquico das diferenças de nascimento; é um sistema pouco republicano e quase nada democrático.
A abertura de Academias de Sub-oficiais à frequência, por concurso, em paridade com as Academias militares para Oficiais, a todos os jovens civis — sem exclusão da possibilidade de também concorrerem todos os que já fossem militares — era um sistema democrático e dignificante da carreira de sargentos, pois a escolha resultava de uma perfeita opção entre ser oficial ou ser sargento sem invalidar que, pertencendo a esta última classe, pudesse vir a ser oficial se satisfizesse às condições de admissão à respectiva Academia.
Para os leitores que pretenderem informar-se com mais algum pormenor sobre o tema aqui tratado, deixo as respectivas ligações à Internet. Assim, poderão aceder à informação sobre a Escola de Sargentos do Exército, clicando sobre o respectivo nome, tal como para o Curso de Formação de Sargentos da Armada e Curso de Formação de Sargentos da Força Aérea.
Edifício do Comando da Escola de Sargentos do Exército
 
O navio-escola «Sagres» a navegar a todo o pano
Brasão de armas do Centro de Formação Militar e Técnica da Força Aérea
04.06.06

A vocação militar dos sargentos


Luís Alves de Fraga
Tenho, algumas vezes, abordado o problema das carreiras militares e, em particular, o da vocação dos jovens para alcançarem o oficialato. Realmente — e por exclusiva culpa minha — nunca me debrucei sobre a forma como os sargentos escolhem a vida castrense. Tentarei hoje colmatar essa falha.
Não existe, entre nós, a tradição das Academias para diplomar sargentos, também designados sub-oficiais , noutros países. Existem escolas viradas para formação militar específica em certas Armas e Serviços onde se ministram cursos que habilitam para o desempenho de funções. São, no Exército, as chamadas Escolas Práticas onde, afinal, também os oficiais e as praças adquirem valências específicas. Este modelo não é seguido na Força Aérea nem na Armada; optou-se por um estabelecimento único, em cada um daqueles ramos, para por lá passarem os especialistas, aprendendo o que se reconhece como fundamental para o exercício das funções a que se destinam.
A transição de mero sargento em regime de contrato para sargento do quadro permanente faz-se por opção do candidato, existência de vagas, satisfação de requisitos e informações satisfatórias. Não vou pormenorizar aqui — até porque não viria a propósito — toda a metodologia de ingresso. Interessa, na minha perspectiva, é perceber a importância dos sargentos nas Forças Armadas de ontem e de hoje.
Eles foram, ao longo dos tempos, vistos, quase sempre, como profissionais militares oriundos de praça, com uma fraca preparação intelectual e cultural. Não vou dizer que este esteriótipo está errado. Realmente, no nosso país, até ao fim da 2.ª Guerra Mundial, raros foram os casos de sargentos que fugiam ao padrão referido; eram os chamados tarimbeiros ou lateiros, consequência da sua origem.
Logo no pós-guerra houve necessidade de alterar, pelo menos em parte, este tipo de sargento, como resultado da admissão de Portugal na OTAN; teve de se admitir gente com formação técnica para satisfazer a imperativos ditados pelas novas formas de desenvolver operações militares; a electrónica dava os primeiros passos e impunha os radares, os sistemas de pontaria sofisticados, as telecomunicações modernas. A partir de então o recrutamento centrou-se em jovens com cursos industriais ou, no mínimo, com frequência dos mesmos. O nível técnico e cultural subiu entre a classe de sargentos. O seu vencimento passou a estar equiparado ao de um professor de instrução primária o que não constituía favor nenhum. Este salto recolocou os sub-oficiais na posição intermédia que haviam tido no século XIX; eram os especialistas que enquadravam os praças permitindo ao oficial uma maior mobilidade para se dedicar à nova evolução do modo de fazer a guerra.
A partir de 1961, com o começo do conflito nas colónias e a sua longa duração de 13 anos, acrescida do baixo nível técnico que se exigia dos homens para as operações militares, a classe de sargentos, embora sacrificada no desempenho de sucessivas comissões de serviço em África, tornou a baixar no tipo de recrutamento; importante era saber fazer a guerra no mato e enquadrar os praças. Houve um significativo recuo. Ele foi de tal ordem que chegou a reflectir-se na classe de oficiais por haver absoluta carência destes, admitindo-se a ascensão de sargentos ao oficialato sem grande rigor selectivo.
Acabada a guerra, no intuito de, por um lado, estancar as promoções à classe de oficiais e, por outro, remediar a carreira, não truncando perspectivas criadas no tempo do conflito, foram adicionados mais dois postos à classe de sargentos: os sargentos-chefes e os sargentos-mores. Estes últimos viriam a auferir um vencimento inferior em pouco ao de um capitão.
Nos 32 anos que decorreram desde 25 de Abril até hoje, posso garantir que novamente houve profundas alterações no modo de recrutar os sargentos. Alterações que foram consequência de um maior tecnicismo dos armamentos e de um mais elevado padrão cultural de todos aqueles que optam por seguir a carreira. Actualmente, é com alguma frequência que se encontram sargentos licenciados por universidades estatais e privadas nas fileiras dos quadros permanentes.
Hoje, ser sargento das Forças Armadas é uma opção tão importante como a de ser oficial, porque a valia operacional de um e de outro são subsequentes e complementares. Na minha opinião, é pena que não se dê o salto para a criação de uma Academia de Sub-oficiais onde se ministrassem os fundamentos culturais e militares de uma carreira, deixando-se para fase posterior a aprendizagem técnica que cada ramo deve desenvolver dentro das diferentes especialidades. Ao mesmo tempo acabava-se, de uma vez por todas, com a escolha de uma carreira já depois do desempenho de funções a ela inerentes. Porque não começar do zero, como se faz com os oficiais do quadro permanente? Quanto melhores forem os sargentos mais aptos e competentes terão de ser os oficiais que os comandam.