História de um falhanço
Chegámos ao início de Julho – um Julho excepcionalmente quente – de 2013 conduzidos politicamente por gente que nada sabia ou sabe de Portugal. Nada! E nada é mesmo nada! E esta gente vem, em linha recta, desde os que se sentaram nas cadeiras ainda quentes dos rabos fascistas, logo após o 25 de Abril de 1974, até aos que não sabem se se hão-de sentar ou ir embora neste momento de impasse.
O grande problema foi que a Ditadura, o Fascismo em Portugal, não permitiu, entre muitas coisas, que os “homens de amanhã” – os que havíamos nascido dentro do regime imposto em 28 de Maio de 1926 – aprendessem a “fazer política”.
Não. Não me venham com tretas! Ninguém que tenha nascido em Portugal entre os anos de 1926 e 1974 aprendeu a fazer política. Não! Ensinaram-nos a obedecer aos “nossos chefes, nossos pais”, tal como proclamava o hino da Mocidade Portuguesa. Política, política a sério, isto é, pensar de raiz os problemas que afectam uma nação, só havia, em Portugal, um homem: António de Oliveira Salazar. Nem os seus mais chegados colaboradores podiam pensar, pois estava-lhes reservado o único papel que este criminoso lhes permitia: obedecer às suas directivas. Sim, criminoso! Um homem que impede um povo de pensar durante mais de quarenta anos só pode ser chamado criminoso, por atentar contra a liberdade da mente humana!
Nós, os militares que fizemos o 25 de Abril, que integrámos o MFA, que divulgámos o seu programa e tentámos que ele fosse uma espécie de rumo para os primeiros tempos após o derrube do fascismo, também não sabíamos fazer política. Nem era essa a nossa intenção. Deixando de ser um pilar de apoio – o mais forte – do fascismo português as Forças Armadas quiseram somente devolver ao Povo as condições para o Povo voltar a ser livre. Tão livre que pudesse fazer asneiras irremediáveis, asneiras não pensadas, asneiras impensáveis.
Ao contrário do que se quis fazer crer, o MFA nunca foi motor de nada, nem quis ser motor de nada a não ser o da devolução da Liberdade ao Povo. A aliança Povo-MFA foi uma apropriação indevida de alguns que, sabendo que o MFA queria ficar equidistante de todas as forças políticas, resolveram dar um passo em frente e “agarrar-se” ao MFA. Os militares nunca foram políticos e não fizeram o 25 de Abril para o serem. Alguns deixaram-se prender por ideologias políticas com as quais simpatizaram, mas essa posição individual tinha, teve e tem de ser separada do MFA enquanto motor do golpe militar de 25 de Abril de 1974, enquanto defensor de eleições livres e de liberdade de expressão. O MFA quis estar acima e por cima da política para possibilitar que ela se fizesse tal e qual como qualquer catalisador tem de estar presente na reacção química sem nela tomar parte.
E os homens que tomaram conta da política nacional, através dos partidos políticos que já existiam – PCP e PS – e dos outros – muitos – que se formaram nada sabiam de política nem de Portugal. Mas, ou porque vieram do estrangeiro com ideias feitas à imagem e semelhança do que lá por fora viram ou porque julgaram saber com base nos panfletos de propaganda rabiscados à pressa e por força da luta contra a opressão fascista, não confessaram ao Povo a sua ignorância e passaram a perorar como se fossem senhores de todo o saber e de toda a razão. Não tiveram a humildade de reconhecer o pouco que sabiam de Portugal, da sua História, da sociologia do seu povo e, até da sua economia. Como a ignorância é atrevida, atreveram-se a atirar-se em louca correria para alcançarem as cadeiras do Poder. E fizeram asneiras de toda a ordem! Mais do que isso, permitiram que os seus “amigalhaços” de ocasião se atirassem sem dó nem piedade ao orçamento do Estado e dele comessem sem qualquer decoro. E desta acusação não isento político nenhum. A ganância, na ausência de educação democrática – que ninguém tinha –, impôs-se em todas as frentes, e veio de escantilhão desde os altos e aveludados assentos do Poder até aos Zés que pululam por esse país fora que, à sua medida, enriqueceram e desbarataram riqueza mandando fazer a sua vivenda na praia ou no campo, comprando os seus carrões de alta cilindrada, derretendo dinheiro em festas com a família e em luxos inimagináveis quinze ou vinte anos antes, no tempo do fascismo. Foi um mal do qual poucos de nós estamos isentos… só os mais pobres, os mais remediados ou os que não tiveram oportunidade, “engenho” ou “arte” para fazer como os restantes. Toda a gente deitou mão aos fundos que chegavam da CEE às carradas! Toda a gente deu aulas e formações do que sabia e não sabia; toda a gente frequentou cursos pagos para aprender coisa nenhuma.
Foi assim, porque os políticos, todos eles irresponsáveis, impreparados para gerir o grande ou pequeno quinhão do orçamento, não cuidaram de responsabilizar, de fiscalizar, de traçar políticas e metas, de definir caminhos. Eles não sabiam o que era ser político e quem não sabe não pode ensinar nada!
Portugal, há quase quarenta anos, anda a ser governado por gente impreparada, por gente que parte do princípio que fazer política é gerir um orçamento, mandar fazer coisas que lhe valham votos nas próximas eleições, equilibrar desentendimentos entre grupos desavindos por motivos menores ou egoístas e, acima de tudo, prometer, prometer muito e fazer muito pouco do que foi prometido.
Aqui têm, caros e pacientes Leitores, em traços bem largos, a história de um falhanço! Porque, diga-se o que se disser contra a “troika” – e eu até concordo! – Portugal falhou e é um falhanço desde 1926, pelo menos. Um falhanço, porque tem gentalha ignorante, viciosa e oportunista no lugar dos políticos. Políticos que, como autodidactas, são uma caricatura de má qualidade do que houve, noutros tempos – nos tempos da primeira parte da 1.ª República – em Portugal.