Navegar à vista
Os nossos marinheiros do século XV, quando se afoitavam para Sul, para o desconhecido, procuravam, sempre que possível, navegar de forma a irem tendo vista da costa africana, que ficava do lado esquerdo do navio, no lado do bombordo. Faziam-no por segurança e, por isso, passar o cabo Bojador foi uma imensa proeza, na altura, pois, por causa dos baixios que entravam pelo mar dentro, havia que se afastar muito, deixando de ver a costa. Esta forma de seguir rotas marítimas tomou a designação genérica de “navegar à vista” ou seja, de acordo com as circunstâncias, sem ciência e sem risco de maior.
Não pretendo desmerecer da galhardia dos nossos marinheiros do século XV, porque, na volta de regresso a Lagos e ao reino, os ventos dominantes atiravam-nos para o meio do Atlântico, para a zona dos Açores, e daí tinham de vir até ao continente europeu fazendo a navegação possível em alto-mar. Uma ousadia incomparável para a época. O que pretendo é deixar, por analogia, a mensagem de que o actual Governo conduz a política externa do país – incluindo nela os aspectos financeiros dependentes da vontade da troika – usando o método de “navegação à vista”, pois, umas vezes diz que é “assim” para, na semana seguinte, afirmar que é “assado” e, neste vai e vem de critérios, ninguém se entende ou entende a governação.
É um Governo sem a grandeza dos marinheiros de quatrocentos, pois esses arriscavam e venciam as forças desconhecidas e incontroláveis da Natureza, enquanto ele se limita a fazer jogos de cálculo que se mostram errados ao fim de poucos dias, poucas semanas, poucos meses. E nisto, toca de pedir sacrifícios incontáveis à tripulação desta “nau” que, não percebendo o rumo, não compreende a vontade do “piloto”. Não foram raros os casos de revolta das tripulações dos navios mal governados e, muitas vezes, foram borda fora os capitães representantes da autoridade real por terem perdido a legitimidade do comando, tornando-se em meros tiranetes sobre gente que preferia arrostar com castigos pesados a ter de soçobrar às mãos de quem a não sabia conduzir ao porto seguro.
Os nossos governantes não têm o mais importante de quem governa: uma política, um objectivo e um meio de o alcançar. É gente sem qualidades de liderança. Gente trafulha, que mete os pés pelas mãos e se sujeita à vontade dos ventos que açoitam a condução dos negócios nacionais. É gente sem a verticalidade dos grandes chefes e sem a vontade dos grandes condutores de homens. É gente vendida aos interesses alheios, que desconhece os interesses nacionais. É gente que, como vendedores de mercado de terceira classe, faz variar o “preço da mercadoria” segundo a catadura do “comprador”. Por tudo isto, é gente que não nos merece respeito.
Entendam-se as forças de esquerda e encontrem a plataforma mínima para, com credibilidade, se apresentarem perante a nação com um programa de verdade e de honestidade. Tem de ser! Estamos fartos de rábulas.