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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

02.05.08

Patriotismo, RDM e reformados


Luís Alves de Fraga

 
O ministro da Defesa Nacional veio, mais uma vez, afirmar, com as cautelas próprias de um político, que o anteprojecto de Regulamento de Disciplina Militar (RDM) posto a circular e entregue para a apreciação das Associações Militares, saído do seu Gabinete, afinal não tinha em vista cercear as liberdades dos militares na situação de reserva e reforma, porque não havia sido esse o espírito do legislador. Isto disse-o ele e está bem claro no Jornal de Notícias que pode ler-se aqui.
 
Se não fosse um assunto muito sério, até poderia parecer uma manifestação do sentido de humor do ministro! Então não está no espírito do legislador e está com todas as letras na letra do anteprojecto! Como se diria nos meus tempos de jovem: — Está a gozar connosco ou quê?!!!
E a pergunta tem toda a razão de ser, porque o anteprojecto não foi remetido às Associações Militares por uma qualquer repartição burocrática do Ministério da Defesa Nacional! Pelo contrário, foi enviado pelo chefe de gabinete do ministro! Alguém escreveu o anteprojecto; alguém o fez chegar ao chefe de gabinete; alguém o fez expedir. Este alguém será sempre um desconhecido, secreto e inimputável personagem. Nunca surgirá um nome para se poder dizer a frase tão simples: — Aqui está o responsável!
Seria importante saber se o autor material do anteprojecto — o tal responsável — era civil ou militar para se compreender se o «espírito da lei» anteprojectada pertencia a alguém que de tropa nada percebe ou se de um militar que, por erro do sistema de selecção castrense, deveria ser civil.
 
Na verdade, só um civil inexperiente da Vida e das vivências militares poderia ser autor material do famigerado anteprojecto, pelo que ele contém de aberrante quando prevê, entre outras coisas, a limitação de liberdade de opinião aos militares reformados e na reserva.
Para compreendermos o porquê desta minha afirmação teremos de perceber o que lhe está por trás e lhe dá apoio. Vamos, pois, à explicação.
 
Um militar que tenha feito carreira nas fileiras ganhou, por força da educação castrense e por tradição já enraizada, o hábito de aceitar pacificamente as limitações de cidadania que a Constituição Política da República lhe impõe. Por isso ele jura respeitá-la; e respeita-a. Ele sabe que é em nome de um valor maior que lhe estão vedados certos direitos que os outros cidadãos possuem. Sabe que esta restrição não deslustra; pelo contrário, enaltece-lhe o serviço, porque se trata de serviço da Pátria.
Ver limitada a liberdade, por se estar disposto a todos os sacrifícios por ela, é uma dignidade que só pode compreender quem tem da própria Pátria um grande conceito. Por amor da Pátria é-se amputado de direitos comuns. Mas trata-se de uma amputação que honra quem a sofre. É preciso ser-se militar de carreira para, mais do que perceber, sentir o orgulho de ser assim. Isto mesmo não o compreende com facilidade um cidadão que não tenha entranhado em si o gosto, a vocação, castrense. E é natural que assim seja!
Passarem-se vinte ou trinta anos, às vezes mais, sujeito a este preceito de disciplina aumenta no cidadão-soldado o amor da Pátria. Aquilo que aos vinte anos de idade era um sonho, uma aventura, uma vontade jovem transforma-se, aos quarenta, cinquenta ou sessenta, num sentimento maduro e curtido pelo serviço árduo de uma vida votada à comunidade nacional na disposição de por ela dar consciente e decididamente a vida, se tal for exigido.
Ora, é por essas idades que o militar começa a poder voltar a ser um cidadão de corpo inteiro dado ter passado à reserva ou à reforma, mas, pelo simples facto de mudar a sua condição perante a instituição castrense, não muda a sua maneira de pensar nem se alteram os seus sentimentos patrióticos. Assim, qualquer opinião que emita sobre a política nacional ou sobre a condução da política militar, supõe-se, é feita dentro do mais acrisolado amor pela Pátria, porque os valores militares não se perdem quando se muda de situação, quando se passa de activo a reformado; não é por deixar de envergar a farda que se despe o sentimento que nos animou durante uma vida. Só não o pode compreender assim quem nunca foi militar ou quem sendo tem da vida militar uma visão canhestra, confusamente canhestra, por excessivo contacto com os meios civis e, acima de tudo, meios políticos onde, como dizia Mouzinho de Albuquerque, é comum ter-se duas caras.
Porque é vulgar ser como acabei de referir, no estrangeiro, muitas vezes socorrem-se os políticos profissionais dos reformados militares para os assessorarem — não por favor político, mas por reconhecida competência patriótica — no desempenho de certas missões onde prevalecem valores da nobreza castrense.
 
Limitar a liberdade de expressão aos militares reformados, para além de ser entre nós inconstitucional, é uma aberração que só uma mente doente, perversamente doente, pode conceber, pois, como julgo ter demonstrado, é amputar ao tecido social uma boa parte de uma opinião saudável e patriótica; de uma opinião que deve ser escutada atentamente por todos e em particular pelos condutores da política nacional, pois parte sempre de quem está habituado a cumprir, servindo sem olhar para recompensas materiais nem prebendas.
 
Oiça-se a opinião e a crítica dos militares reformados, porque ouvi-la é escutar gritos de alma deixados escapar para o bem de Portugal.

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