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Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

Fio de Prumo

Aqui fala-se de militares, de Pátria, de Serviço Nacional, de abnegação e sacrifício. Fala-se, também, de política, porque o Homem é um ser político por ser social e superior. Fala-se de dignidade, de correcção, de Força, de Beleza e Sabedoria

16.03.07

A carta de Mousinho de Albuquerque


Luís Alves de Fraga
Provavelmente, muitos dos meus leitores não terão acesso fácil à carta que Mousinho de Albuquerque escreveu ao Presidente do Conselho de Ministros, em 1898, ao solicitar a sua exoneração de Comissário Régio em Moçambique, cargo para o qual foi nomeado na sequência da magnífica vitória alcançada contra o poderoso régulo Gungunhana.
 
Joaquim Mousinho — o patrono do meu curso de ingresso na Academia Militar, no ano de 1961 — dá uma extraordinária lição de ética castrense nas palavras ditadas pela surda raiva contra os políticos que então governavam o país e que parecem arrancados do presente para representarem o seu «papel» no final do século XIX. Para não tirar o sabor à altaneira prosa de Joaquim Mousinho de Albuquerque, passo de seguida à transcrição de partes dessa extraordinária epístola digna da verticalidade a que se deve subordinar quem se diz soldado por vocação.
 
«Há, sem a menor dúvida, entre os homens políticos portugueses, inúmeros que se me avantajam pela ilustração e talento; mas, por acanhada que a minha inteligência seja considerada, por pequeno como eu julgo o meu valor, conservo sobre todos esses homens, uma superioridade que não quero perder e é a que aos olhos do povo, e direi aos de El-Rei, me dá um lugar especial. Não tendo nunca sido forçado, pelas exigências da política partidária (de que sempre me conservei afastado) a seguir por sendas tortuosas; não tendo nunca feito ou tratado de eleições, também nunca fiz promessas palavrosas nem falsas lisonjas, nem tão-pouco me envolvi em compromissos deprimentes; nunca tive de falsear a verdade para disfarçar a realidade dos factos, nem que afogar num dilúvio de palavras, tão optimistas quanto faltas de sinceridade, a absoluta carência de argumentos baseados no conhecimento dos factos, para defender qualquer que de utilidade pública apenas tem o nome; coisas estas triviais em política, segundo ouvi, por vezes, da própria boca de V. Exa.
Em resumo, Exmo. Sr., a minha superioridade consiste em ter só uma cara.
E deixaria de a ter se aqui ficasse, simples executor do Ministério do Ultramar, isto é cúmplice da nefanda obra de ruína ou alheação desta Província.
[...].
Sei muito bem que no nosso País, os governos e os políticos predominam na administração pública, mantendo-se em equilíbrio por enxárcias tecidas de convenções fictícias, cheias de nós tão intrincados como o lendário nó górdio, e que, como ele, facilmente serão cortados por qualquer espada de boa têmpera, sem que precise empunhá-la nenhum Alexandre!
Mas, observador, como sempre tenho sido, dos deveres da subordinação, que mais que o capacete e a espada distinguem o militar do civil, nunca desembainharei a espada movido por paixões pessoais ou políticas, mas só em serviço de El-Rei e do País.
Disto pode V. Exa. estar seguro, porque não sei distinguir a lealdade no procedimento político da do homem privado, porque não penso como V. Exa. pensa, e disse já na minha presença, que na vida política não desonra ardis nem enganos que deslustrariam qualquer homem na vida particular.
Achará talvez V. Exa. esta carta desrespeitosa, sendo assinada por um simples major de cavalaria, ao Presidente do Conselho de Ministros, ao grã-cruz da Torre e Espada do Valor, Lealdade e Mérito, que nessa dupla qualidade tem honras de general!
Verdades como punhos contém ela, e por isso nunca V. Exa. ousará pretender taxá-la de insubordinação para me mandar castigar.
Só quem não deve não teme, Exmo. Sr., por isso eu a ninguém temo [...]».
(in General Ferreira Martins, Mouzinho, Lisboa, Edições Excelsior, 1965, p. 174-175, 185-186).
Aqui fica o que de mínimo se pode extrair desta carta, escrita em 23 de Julho de 1898, quando era Mousinho de Albuquerque Comissário Régio na Província de Moçambique.
Assim escrevem todos os soldados que se não deixam enlear nas malhas da política partidária... Todos os soldados a quem não falte a coragem!

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